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Texto do episódio
014


O Evangelho deste domingo (Mt 10, 26-33) quer nos ensinar a respeito da Providência Divina: “Vós valeis mais do que muitos pardais” (v. 31b). O que é importante entendermos a esse respeito?

Deus governa todas as coisas, e nada do que acontece no mundo — até mesmo as coisas más — está fora de seu domínio. Deus faz somente o bem, mas claramente permite a existência do mal. Aqui, nos referimos tanto aos males físicos — as catástrofes naturais, a morte, o câncer e outras doenças — quanto aos males ainda piores, espirituais — as maldades, os pecados, os roubos e assassinatos, a traição, a falta de amor. Todas essas coisas, até mesmo em escala mundial, como os grandes genocídios, guerras e milhões de pessoas mortas por ideologias, são permitidas por Deus.

Deus tem o poder soberano sobre todas as coisas. E a primeira coisa que nós temos de entender a respeito da Providência Divina é que Deus, por ser onipotente, tem plena capacidade de evitar qualquer um desses males. Portanto, todas as ações que acontecem no mundo têm dois tipos de origem: ou são feitas pelo próprio Deus ou são permitidas por Ele. Não há uma terceira opção.

No entanto, precisamos estar atentos à segunda parte de nossa fé a respeito da divina Providência. Não professamos no Credo: “Creio em Deus todo-poderoso”, mas: “Creio em Deus Pai todo-poderoso”. Nós cremos que Deus é sumamente bom; Ele é a própria bondade. Portanto, também temos a convicção de que o mal jamais tem a última palavra. Neste sentido confessamos, com Santo Agostinho, um princípio inabalável: “Deus não permitiria o mal se dele não pudesse tirar um bem maior”.

Explicada a teoria, sejamos um pouco mais práticos, ilustrando esses princípios com alguns exemplos, de forma a guardá-los em nosso coração e aplicá-los em nossa vida. Imagine esta situação que aconteceu em minha família: um de meus sobrinhos teve meningite aos cinco anos de idade. Para fazer o diagnóstico, foi necessário que a médica extraísse, diretamente da coluna de meu sobrinho, com uma agulha enorme, um certo líquido para exame laboratorial.

Experimente, porém, dizer a uma criança de cinco anos de idade: “Calma, vai ser bom para você enfiar essa agulha enorme em sua coluna…” Pois bem, vocês já devem imaginar o que aconteceu: depois de muito estardalhaço no hospital, a médica disse para o menino escolher alguém para ficar com ele na sala de coleta, ao que meu sobrinho prontamente respondeu: “Mamãe!” Vieram então os enfermeiros e imobilizaram a criança, enquanto a mãe acariciava a sua cabeça, dizendo: “Calma, meu filho: Mamãe está aqui!” E assim, a médica conseguiu fazer a coleta, diagnosticou o problema, receitou o antibiótico e — graças a Deus! — meu sobrinho foi salvo, sem sequelas.

Para nós, está claro que a inteligência daquela criança não era capaz de compreender a bondade do ato de ter uma agulha inserida em sua coluna. Para o meu sobrinho, aquilo só podia ser entendido como algo doloroso e mau. Diante dessa limitação de sua compreensão, ele poderia pensar: “Se mamãe me ama, por que ela está deixando a médica fazer essa crueldade comigo?”, e assim guardar uma mágoa eterna de sua mãe. Graças a Deus, não foi o que ele fez. Depois de crescer em inteligência, ele pôde entender que aquilo foi uma coisa boa, e que aquele mal foi necessário para propiciar um bem maior, a sua saúde. Hoje, ele está com quase 30 anos de idade, mas se não fosse aquela agulhada extremamente incômoda e dolorosa há 25 anos, ele estaria morto.

Está claro, portanto, que a mãe permitiu o mal da agulhada porque tem uma inteligência maior do que a da criança. Ironicamente, hoje há pais que alegam não ser mais inteligentes que seus filhos, negligenciando sua educação e deixando de impor limites, permitindo que as crianças façam tudo o que querem, com medo de que elas fiquem com “raiva” deles. Ora, mas isso é fruto de um tremendo egoísmo desses pais! Isso quer dizer que eles estão mais preocupados com sua “imagem” diante dos filhos do que com o próprio bem destes.

Eis o princípio básico da educação: as crianças não sabem o que é realmente bom para elas. Por isso, um adulto — virtuoso, inteligente e estudioso — descobre, ensina e aplica o que é bom para a criança. Muitas vezes, nós, que amamos os nossos filhos, devemos permitir que aconteça alguma coisa doída para o seu bem: seja uma injeção, seja algo que eles não queiram: dormir cedo, não ver celular, evitar certos tipos de leituras ou programas, evitar comer algum alimento.

Devemos nos recordar: porque Deus é Pai, Ele é bom — não é bonzinho. Ele é a própria Bondade, porque é infinitamente sábio; Ele sabe o que é bom para nós. Deus pode tirar de um mal um bem maior. É assim como aquela mãe que sabe que pode tirar de uma agulhada a salvação da saúde do seu filho, porque ela é inteligente e entende que a doutora tem uma ciência médica e sabe o que está fazendo. Por isso, a mãe diz: “Pode aplicar a agulha, doutora! Salve meu filho!”, e não se preocupa se a criança vai dizer, impulsivamente, que está com raiva dela por ter permitido aquele mal. A boa mãe não se importa com o “esperneio”, porque deseja o bem de seu filho. Assim é Deus.

Deus não está preocupado em fazer as nossas vontades e veleidades. Há pessoas que, ao invés de virem à Igreja para professar “Creio em Deus Pai todo-poderoso”, prefeririam dizer: “Creio no ‘vovô bonachão’ que faz tudo o que eu quero”. Quer dizer que não creem no Pai bondoso e infinitamente sábio, mas num vovô bobo que cumpre os seus caprichos. E, ao rezar, quando as coisas não acontecem como elas ou as pessoas próximas esperavam, logo reagem: “Cadê Deus nessa hora?”; “Onde está a sua fé? Rezou tanto! Do que adiantou?!”

Meus irmãos, nós cremos em Deus, não em falsas divindades que se movem ao sabor de nossos caprichos! Se vamos à Igreja, é porque sabemos que Deus é bom; e por confiarmos que Deus sabe o que é bom para nós, queremos aprender com Ele para mudarmos nossa mentalidade e atitudes, a fim de vivermos conforme a sua vontade, colocando-nos debaixo de sua providentíssima e amorosa disposição.

Esclarecido esse conceito básico acerca da Providência, voltemos ao início, quando dissemos que Deus tudo pode, e tudo o que acontece no mundo é devido à sua disposição e permissão. Quando algo é bom, foi Deus quem dispôs! Por exemplo, se temos comida na mesa, por mais simples que seja, foi Ele quem providenciou. Aconteceu, porém, algo de ruim em nossa vida? Deus permitiu que acontecesse. Deus não faz nada de ruim e não quer o pecado, mas permite que aconteça.

Quando Deus veio a este mundo, por meio da Encarnação do Verbo, Nosso Senhor Jesus Cristo, Ele permitiu que lhe fizessem todas aquelas maldades sofridas em sua Paixão. Ora, não está claro que o Senhor tinha o poder de “mandar um raio” para acabar com aqueles assassinos cruéis? No entanto, Ele permitiu que fizessem aquela crueldade da qual foi vítima. Ele permitiu aquele que foi o maior de todos os pecados: o deicídio, o assassinato do próprio Deus que se fez homem.

Assim como a mãe sábia enxergou o bem naquela agulha que seu filho tanto temia, Jesus sofreu as dores da Paixão para nos dar um bem maior: a nossa salvação. Precisamos, portanto, insistir e repetir: “Deus não permitiria o mal se deste mal não pudesse tirar um bem maior”.

Sempre há algo ruim acontecendo em nossa vida. Qual é o mal que aflige você neste momento? O que está lhe angustiando e tirando o sono? O que faz você derramar aquela lágrima escondida que mais ninguém vê? Não importa o que seja, lembre-se da máxima da Providência Divina, confiando que, se Deus permite, é por um bem maior.

Deus, que é a própria Sabedoria, conhece cada detalhe de tudo o que existe. Quando você pegar um copo d’água em sua mão, lembre-se de que Deus conhece a origem não somente de cada molécula daquela água, mas de cada átomo ali presente, desde que o universo foi criado. Mais do que isso, Ele olha para você — que é infinitamente mais complexo do que um copo d’água — e também sabe absolutamente tudo a seu respeito: a sua história, o seu DNA, o que está acontecendo agora em suas células, quais são as suas emoções com todas as nuances possíveis, de onde vieram as suas ideias, o que você foi, o que é e o que será. Deus sabe de tudo isso. E Deus é bom!

Estas são, resumidas, as três coisas básicas que precisamos crer para termos fé na Providência divina: Deus sabe tudo; Deus pode tudo; e Deus é bom. Podemos confiar nele, fazendo um grande ato de fé nessa bondade suprema e perfeita. No entanto, somos muitas vezes tomados pela soberba, deixando-nos levar pelo demônio, que sussurra em nosso ouvido: “Por que isso foi acontecer logo com você? Cadê seu Deus agora? Se Deus é bom, por que deixou isso acontecer com você?”

O demônio vai nos tentar, sim, mas não podemos consentir com suas provocações. Afinal, quem de nós nunca se fez esse tipo de pergunta? A tentação pode acontecer, mas estaremos pecando apenas quando consentirmos com ela, sentando-nos no trono da soberba para julgar Deus. O pecado acontece quando realmente dizemos, em nosso íntimo: “Se eu fosse Deus, eu não permitiria que isso acontecesse. Está errado!”

Quando caímos na soberba, estamos querendo ensinar a sabedoria a Deus, que é infinitamente sábio. Mas por mais que saibamos “alguma coisinha”, jamais saberemos como Ele sabe. Lembre-se de que a mãe, ao contrário da criança, entende por que é necessário que uma agulha seja aplicada em sua coluna. O que a criança deve fazer? Confiar! E confiamos porque Deus, que tudo pode e sabe, é bom!

Mas o que fazer quando não enxergamos o “bem maior”? Ora, não temos que entender, apenas confiar. Não podemos ter a pretensão de que as razões de Deus “caberão” em nossa cabeça. Afinal, Ele é muito mais do que podemos enxergar; consequentemente, sua razão está muito além da nossa capacidade de compreensão, por mais que nos esforcemos a esse respeito. É algo intrínseco à própria definição de Deus. Por isso, devemos ter cuidado: se o “deus” em que acreditamos é algo que cabe perfeitamente em nossa cabeça, estamos na verdade diante de um ídolo criado por nós mesmos.

Algumas seitas protestantes, por exemplo, criaram uma espécie de “deus” matematicamente compreensível. Para eles, a lógica é a seguinte: “Deus é generoso e não se deixa vencer em generosidade. Portanto, basta você ofertar um milhão de reais à igreja para ganhar muito mais: dois, três, dez milhões de reais. É infalível e matemático (pode passar a maquininha de cartão de crédito)”. E o que acontece quando os fiéis que entram nessa enrascada não veem o “retorno”? Ora, o pastor dirá que a culpa é do próprio fiel, que não teve fé suficiente!

Esse tipo de mentalidade acaba criando no Brasil um país de pessoas céticas, religiosamente indiferentes; porque, no fundo, todos acham que se Deus existe, então deveria caber em sua própria lógica pessoal. Mas Deus, quando veio a este mundo, mostrou-nos claramente que não pode ser “dominado” por nossa inteligência limitada. Afinal, por amor Ele se permitiu ser crucificado. O Amor fez-se carne e nós o matamos. E Deus, em sua infinita bondade, permitiu esse mal para tirar dele um bem maior, a nossa salvação. “Deus não permitiria os males, se desses males não pudesse tirar um bem maior”.

Desculpem-me a irreverência, mas precisamos parar de agir como quem acredita que Deus está no Céu à beira da piscina, de pés para cima, tomando água de coco, enquanto a humanidade sofre diariamente. Deus veio viver os nossos tormentos! Ninguém pode dizer que sofre mais do que o próprio Deus encarnado sofreu. “Padre, o senhor não sabe o que eu estou sofrendo!” Provavelmente não sei; mas você já está suando sangue por causa de seu sofrimento? Vejam, portanto, que não temos o direito de olhar para o céu e dizer: “Deus, o Senhor não sabe o que estou passando”.

Deus sabe de todas as coisas! Deus sabe e Deus é bom; e se Ele permite alguns males, é porque Ele vai tirar um bem maior disso. E que tipo de bem maior Ele pode nos dar? Ora, que tal considerar o maior de todos os bens: a felicidade eterna no Céu? Miseravelmente, se formos realmente sinceros conosco, perceberemos que muitas vezes o que mais ansiamos não é a “felicidade eterna no Céu”, mas coisas infinitamente menores: uma vida folgada, dinheiro na conta, prazer e diversão.

Se não tivéssemos provações nesta vida, nós seríamos “demônios”! Na melhor hipótese, seríamos medíocres e egoístas. Aqueles que são pais e mães, respondam: vocês são maus por não fazerem tudo que seus filhos querem? Ora, vocês sabem que as crianças não compreendem o que é melhor para elas. Por isso, é necessário, muitas vezes, contrariar a vontade delas em nome de um bem maior. Dito isso, meditemos um pouco sobre os contratempos de nossa vida. Perceberemos que, diversas vezes, nos comportamos como crianças birrentas, pensando saber melhor do que Deus o que seria melhor para nós em cada contrariedade.

Quem vai nos explicar por que aconteceu uma aparente desgraça mesmo quando rezamos com tanto fervor não sou eu, mas a sabedoria divina, quando chegarmos ao Céu. Aqui, cabe apenas confiarmos em Deus. E aqui está o que precisamos fazer, na prática: um profundo, sólido, arraigado e firme ato de fé na bondade de Deus. Devemos dizer, de coração: “Deus é bom! Ainda que eu não entenda suas razões, eu sei que Ele é bom. Louvado seja Deus!”

Levando isso para o nosso dia a dia, há duas coisas fundamentais que precisamos fazer. A primeira é obedecer aos Mandamentos de Deus. Ele manda que sejamos castos e fiéis no matrimônio? Manda que respeitemos nossos pais? Manda que amemos os nossos irmãos e perdoemos quem nos ofendeu? Manda que nos confessemos e comunguemos? Manda irmos à Missa no domingo? Manda darmos esmola aos pobres? Então, precisamos obedecer! Segunda coisa: depois que fazemos tudo o que Ele mandou, muitas coisas ainda “dão errado” em nossa vida, certo? Pois bem, então devemos confiar em sua divina Providência.

Há seis anos, faleceu a minha irmã, Ana. Seis anos antes de falecer, ela recebeu um diagnóstico de câncer. Ou seja, 12 anos atrás, minha família começou a rezar fervorosamente. Eu comecei a celebrar Missas na intenção da saúde da Ana. Pedíamos a Deus a cura e suplicávamos o auxílio de Nossa Senhora.

É quando estamos passando por esse tipo de situação que vem algum “secretário de Satanás”; por exemplo, aquele vizinho protestante, que vai dizer: “Ah! Se tivesse vindo na minha igreja receber a ‘bença’... Mas preferiu ficar adorando ‘ídolos’, essa Maria que está morta. Deu nisso!” Ora, mas será que essa criatura, que diz que ama Jesus, nunca viu alguém morrer de câncer na igreja dele? Pois sabemos muito bem quem é o pai da mentira e da soberba! Não podemos restringir Deus a uma “fórmula matemática” ou a alguma lógica louca: quando o católico morre, a culpa é da “idolatria”; quando o protestante morre, é porque “não teve fé suficiente”. Eis uma teologia louca, uma mistura de maldade com estupidez.

Pois bem, há 12 anos, quando a minha família começou a rezar pela saúde da minha irmã, é claro que pedíamos a cura, mas também dizíamos: “Senhor, não seja feita a nossa, mas a vossa vontade.” A vontade de Deus é boa! No entanto, às vezes rezamos pedindo alguma coisa má. O que devemos preferir? Viver cheios de saúde mas, no fim da vida, já velhinhos, irmos para o Inferno, ou ter um câncer e morrer cedo, mas ir para a felicidade eterna no Céu? Quando a alternativa for essa, quem tem fé preferirá sempre o Céu!

Quem somos nós para saber os caminhos possíveis de Deus? Quem somos nós para julgá-lo? Sejamos humildes e aceitemos sua santa, perfeita e divina vontade! Eu rezei, rezei, rezei, e não aconteceu o que eu queria? Deus é bom. E porque Ele é bom, não aconteceu. Um dia, no Céu, descobrirei o bem que Deus tirou da morte da Ana. Porque aqui, sabemos muito pouco. No Céu, saberemos mais. Lá, poderemos olhar para toda a nossa vida e entender quão magnificamente bom, sábio e generoso Deus foi conosco; e agradeceremos por todas as preces atendidas, e igualmente por todos os nãos que recebemos Dele, graças à sua infinita bondade.

Sigamos então com uma firme fé na bondade de Deus: “Não tenhais medo! Vós valeis mais do que muitos pardais” (Mt 10, 31). Recordemos que até os cabelos da nossa cabeça estão contados. Portanto, se Deus permite a nossa perseguição, Ele é bom. Confiemos no Senhor! “Humilhai-vos, pois, sob a poderosa mão de Deus, para que, na hora oportuna, Ele vos exalte. Lançai sobre Ele toda a vossa preocupação, pois Ele cuida de vós.” (1Pd 5, 6s). Porque Deus é bom, façamos, pois, o que Ele pede — obedecendo aos Mandamentos e confiando em sua Providência. Esta é a verdade da nossa fé.

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