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O que pensar dos testes com animais?

O Evangelho nos ensina que os pássaros do céu são alimentados pelo próprio Pai celeste. Ora, se Deus tem todo esse cuidado com os animais, não devem também os homens respeitar a dignidade deles? O que ensina, então, a Igreja a respeito dos experimentos científicos feitos com animais?

Texto do episódio
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Os animais ocupam um lugar determinado no projeto da Criação. Isso fica bem claro quando Jesus afirma: “Olhai os pássaros do céu. Eles não semeiam nem colhem, nem guardam em celeiros. No entanto, o vosso Pai celeste os alimenta” (Mt 6, 26). Ora, se Deus tem um cuidado tão delicado, uma providência quase especial para com os animais, não devem também os homens respeitar tal dignidade? O Catecismo da Igreja Católica reconhece essa dignidade e recorda os grandes S. Francisco de Assis e S. Filipe Néri, conhecidos por seu amor às criaturas de Deus: 

Os animais são criaturas de Deus. Deus envolve-os na sua solicitude providencial. Pelo simples fato de existirem, eles O bendizem e lhe dão glória. Por isso, os homens devem estimá-los. É de lembrar com que delicadeza os santos, como São Francisco de Assis ou São Filipe de Néri, tratavam os animais (n. 2416).

No entanto, o Catecismo prossegue, dizendo que os animais estão sujeitos ao governo daquele que foi criado à imagem de Deus, ou seja, ao homem. Isso quer dizer que é lícito utilizar os animais para alimentação, vestimenta, como auxílio no trabalho, no lazer (uma vez domesticados) e também em experimentos científicos, como se vê com clareza no parágrafo seguinte: 

Deus confiou os animais ao governo daquele que foi criado à sua imagem. É, portanto, legítimo nos servirmos dos animais para alimentação e confecção de vestuário. Podemos domesticá-los para que sirvam o homem nos seus trabalhos e lazeres. As experiências médicas e científicas em animais são práticas moralmente admissíveis desde que não ultrapassem os limites do razoável e contribuam para curar ou poupar vidas humanas (n. 2417, grifo nosso).

Portanto, utilizar animais em experiências médicas e científicas não constitui uma forma de maus-tratos, desde que se observem os limites impostos pela razão. Mas quais são esses limites? O mesmo Catecismo os define na sequência:

É contrário à dignidade humana fazer sofrer inutilmente os animais e dispor indiscriminadamente das suas vidas. É igualmente indigno gastar com eles somas que deveria, prioritariamente, aliviar a miséria dos homens. Pode-se amar os animais, mas não deveria desviar-se para eles o afeto só devido às pessoas (n. 2418).

Percebe-se que “fazer sofrer inutilmente os animais e dispor indiscriminadamente das suas vidas” é contrário à dignidade humana. Faz mal para o homem maltratar os animais. Outra coisa, não menos importante, que se deve notar é que esses parágrafos sobre os animais encontram-se, no Catecismo, atrelados à explicação do 7.º Mandamento, “Não roubarás”, o que significa que o animal é propriedade do ser humano. Dessa forma, o justo relacionamento entre o ser humano e os animais é parte do reto domínio do homem sobre a Criação.

O Catecismo explica ainda que é contrário à dignidade humana cobrir de luxos os animais, ou seja, gastar com mascotes de estimação uma soma que poderia ser investida, por exemplo, no cuidado de órfãos, de doentes, idosos abandonados etc. Por isso, não se deve amar os animais mais do que às outras pessoas.

O Papa Bento XVI nos alertou sobre o que chamou de “histeria ecológica”, que se vem intensificando desde o fim do seu pontificado, em 2013. Em vários documentos, com efeito, ele frisa a necessidade de cuidar do meio ambiente, mas sempre da perspectiva de uma ecologia humana, centrada na dignidade da pessoa, criada à imagem e semelhança de Deus. O Papa desenvolveu essa ideia, de modo mais particular, no número 51 da carta encíclica “Caritas in veritate”, de 2009, onde afirma que, se temos desejo de construir uma ecologia verdadeiramente justa, precisamos olhar antes para a verdadeira dignidade do ser humano. 

Voltemos um pouco no tempo. O termo “ecologia”, como se sabe, foi cunhado pelo biólogo alemão Ernst Haeckel, um dos inspiradores remotos da ideologia nazista, baseada em uma suposta superioridade da raça ariana. Não à toa, Haeckel era favorável ao eugenismo e à eutanásia, dois dos muitos crimes de que seriam culpadas as autoridades nazis.

Para Haeckel, o homem não possui nenhuma dignidade especial e deve, por isso, ser tratado como os outros animais. É sobre a base desta radical incompreensão que nasce, historicamente, a chamada ecologia. O pensamento de Haeckel, infelizmente, atravessou as barreiras do tempo, chegando a influenciar outros intelectuais, mais propensos a posições extremas, como é o caso dos integrantes do Clube de Roma, para os quais o planeta Terra teria um “câncer”. Seu nome? Ser humano. Essa histeria verde encontra eco até mesmo em alguns membros (não raro, dissidentes) da Igreja Católica como, por exemplo, Leonardo Boff, um dos principais representantes da chamada “eco-teologia” e defensor de certas concepções paganizantes como, por exemplo, a noção de “Mãe-Terra” ou “Gaia”.

Pois bem, S. Tomás de Aquino (cf. STh I 33, 3) explica em que sentido o homem é filho de Deus. Para o Aquinate, existem quatro acepções da palavra filho, segundo as quais se pode, em cada caso, dizer que uma criatura é “filho” de Deus. A “filiação” comum das criaturas, distinta e infinitamente inferior à de Cristo, Filho por natureza e consubstancialidade, pode ser de quatro ordens:

  1. semelhança de vestígio, comum a todo ente criado, dos átomos ao maior dos anjos: “Quem é o Pai da chuva? Quem, pois, gerou as gotas de orvalho?” (Jó 38, 28);
  2. semelhança de imagem, comum a todos os entes racionais, do homem mais inculto ao serafim mais iluminado: “Deus não é o teu Pai? Ele que te possuiu, que te fez e te gerou?” (Dt 32, 6);
  3. semelhança da graça, própria dos entes racionais que estão, por força da graça habitual, em amizade com Deus enquanto autor da ordem sobrenatural: “O próprio Espírito dá testemunho a nosso espírito de que somos filhos de Deus; e se somos filhos, somos também herdeiros” (Rm 8, 16–17);
  4. semelhança da glória, exclusiva dos entes racionais que, tendo superado o estado de viandantes sob o claro-escuro da fé, alcançaram a plena visão facial de Deus: “Nós nos gloriamos na esperança da glória dos filhos de Deus” (Rm 5, 2). É o grau máximo de filiação, abaixo apenas da geração natural do Filho eterno, que se pode atribuir a uma pessoa.

Os santos já alcançaram a semelhança da glória. Há, por conseguinte, uma hierarquia estrutural de graus ou formas de ser “filho” de Deus, partindo do irracional para o racional, da adoção batismal para, finalmente, alçar-se à semelhança da glória. Trata-se de uma hierarquia estabelecida por Deus mesmo, e é a partir dela, e somente dela, que é possível formular um juízo adequado sobre a relação do homem com o resto da Criação.

É Deus quem ilumina a dignidade humana. É, por isso, assustadora a tendência atual a dar aos animais uma dignidade semelhante à nossa. É assustador, mas não surpreendente, pois se trata de uma consequência quase natural de uma sociedade cuja centro não é mais Deus e em cujo horizonte já não se contemplam as realidades celestes.

Aos homens de boa vontade cumpre continuar no caminho de servir o Criador, tornando-se cada vez mais semelhantes a Ele. Semelhança de vestígio, o homem já a possui por ser criatura de Deus; semelhança de imagem também, mas é preciso aprofundá-la, buscando sempre e cada vez mais a Verdade; semelhança da graça, pela regeneração do batismo; e quem sabe um dia, pelos méritos de Cristo redentor, chegar à semelhança da glória, com os santos e os anjos no Céu.

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