A fé não nos ensina qual seja a duração precisa das penas do Purgatório. Sabemos em geral que elas são medidas pela justiça divina e que, para cada pessoa, elas são proporcionais ao número e à gravidade das faltas ainda não expiadas.

Deus pode, no entanto, sem prejuízo de sua justiça, abreviar esses sofrimentos, aumentando a intensidade deles; e a Igreja militante também pode obter a remissão deles através do santo sacrifício da Missa e de outros sufrágios oferecidos pelos defuntos.

De acordo com a opinião comum dos doutores, as penas expiatórias são de longa duração. São Roberto Belarmino diz, por exemplo, que:

Não há dúvida nenhuma de que os sofrimentos do Purgatório não se limitam a dez ou vinte anos, e que em alguns casos eles duram séculos inteiros.

Mas, concedendo como verdadeiro que sua duração não excedesse dez ou vinte anos, podemos considerar como nada ter de suportar por dez ou vinte anos os sofrimentos mais excruciantes sem o menor alívio? Se se assegurasse a um homem que ele deveria sofrer alguma dor violenta em suas pernas, ou em sua cabeça, ou em seus dentes pelo espaço de vinte anos, e isso sem dormir nem ficar minimamente em repouso, não preferiria ele mil vezes morrer do que viver em um tal estado? E se lhe fosse dado escolher entre uma vida miserável assim e a perda de todos os seus bens temporais, hesitaria ele por acaso em sacrificar sua fortuna para se ver livre de um tal tormento?

Deveríamos achar difícil, então, abraçar o sacrifício e a penitência para nos livrarmos dos sofrimentos do Purgatório? Deveríamos temer praticar os mais dolorosos exercícios: vigílias, jejuns, esmolas, longas orações, e especialmente contrição, acompanhados de gemidos e lágrimas? [1]

Estas palavras condensam toda a doutrina dos santos e teólogos.

Um padre jesuíta, que escreveu um tratado “sobre a caridade para com os defuntos” [2], fala da longa duração do Purgatório com base em um abalizado cálculo de probabilidade. Ele parte do princípio de que, conforme as palavras do Espírito Santo, “o homem justo cai sete vezes ao dia” (Pr 24, 16), isto é, até mesmos aqueles que se aplicam mais perfeitamente ao serviço de Deus, não obstante sua boa vontade, cometem um grande número de faltas aos olhos infinitamente puros de Deus.

A Virgem Maria e o Menino Jesus com as almas do Purgatório, de Luca Giordano.

Basta-nos entrar em nossa própria consciência e aí analisar diante de Deus nossos pensamentos, nossas palavras e nossas obras, para nos convencermos desse triste efeito da miséria humana. Oh! quão fácil nos é faltar com o respeito à oração, preferir nosso conforto ao cumprimento do dever, pecar por vaidade, por impaciência, por sensualidade, por pensamentos e palavras sem caridade, por falta de conformidade com a vontade de Deus! O dia é longo; será que é assim tão difícil, mesmo para uma pessoa virtuosa, cometer, não digo sete, mas vinte ou trinta desse tipo de faltas e imperfeições?

Façamos uma estimativa moderada e suponhamos que você cometa cerca de dez faltas por dia; ao cabo de 365 dias, você terá um total de 3650 faltas. Diminuamos a cifra e, para facilitar o cálculo, estabeleçamos o número de 3000 por ano. Ao término de dez anos, esse número evoluirá para 30.000, e, ao fim de vinte anos, a 60.000. Suponha que, dessas 60.000 faltas, você tenha expiado metade com penitência e boas obras. Assim, ainda faltarão 30.000 por reparar.

Continuemos com nossa hipótese: você morre depois desses vinte anos de vida virtuosa e aparece diante de Deus com um débito de 30.000 faltas, das quais você deve se exonerar no Purgatório. Quanto tempo você precisará para fazer essa reparação? Suponha que, em média, cada falta requeira uma hora de Purgatório. Essa medida é muito moderada, se julgarmos a partir das revelações dos santos; mas, de qualquer maneira, isso dará a você um Purgatório de 30.000 horas. Pois bem, você tem ideia de quantos anos essas 30.000 horas representam? Três anos, três meses e quinze dias. Assim, um bom cristão que vigia a si mesmo, que se aplica na prática da penitência e das boas obras, encontra-se sujeito a três anos, três meses e quinze dias de Purgatório.

O cálculo que fizemos é baseado em uma estimativa extremamente leniente. Agora, se você estende a duração da dor e, ao invés de uma hora, você leve um dia para expiar uma falta; se, ao invés de ter apenas pecados veniais, você traz diante de Deus um débito resultante de pecados mortais, mais ou menos numerosos, que você cometeu previamente; se você atribui, em média, como diz Santa Francisca Romana, sete anos para a expiação de um pecado mortal, remido quanto à culpa, quem não vê que chegamos a uma duração espantosa, e que a expiação pode facilmente se prolongar por muitos anos, e até por séculos?

Anos e séculos de tormentos! Oh! se apenas pensássemos nisso, com que cuidado não evitaríamos o menor dos pecados? Com que fervor não faríamos penitência para satisfazer a nossos pecados neste mundo!

Referências

  1. S. Roberto Belarmino, De gemitu columbae sive de bono lacrymarum, l. 2, c. 9.
  2. Trata-se do Pe. Thomas Mumford. O título desta obra em inglês é: Treatise on Charity towards the Departed.

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