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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 25,1-13)

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos esta parábola: “O Reino dos Céus é como a história das dez jovens que pegaram suas lâmpadas de óleo e saíram ao encontro do noivo. Cinco delas eram imprevidentes, e as outras cinco eram previdentes. As imprevidentes pegaram as suas lâmpadas, mas não levaram óleo consigo. As previdentes, porém, levaram vasilhas com óleo junto com as lâmpadas. O noivo estava demorando e todas elas acabaram cochilando e dormindo. No meio da noite, ouviu-se um grito: ‘O noivo está chegando. Ide a seu encontro!’ Então as dez jovens se levantaram e prepararam as lâmpadas. As imprevidentes disseram às previdentes: ‘Dai-nos um pouco de óleo, porque nossas lâmpadas estão se apagando’. As previdentes responderam: ‘De modo nenhum, porque o óleo pode ser insuficiente para nós e para vós. É melhor irdes comprar aos vendedores’. Enquanto elas foram comprar óleo, o noivo chegou, e as que estavam preparadas entraram com ele para a festa de casamento. E a porta se fechou. Por fim, chegaram também as outras jovens e disseram: ‘Senhor! Senhor! Abre-nos a porta!’ Ele, porém, respondeu: ‘Em verdade eu vos digo: Não vos conheço!’ Portanto, ficai vigiando, pois não sabeis qual será o dia, nem a hora”.

I. Reflexão

Com alegria celebramos hoje a memória de Santa Mônica, mãe de Santo Agostinho. Todo o mundo conhece a história dela, que começou com um grande erro. Na época de Santa Mônica, um cristão batizado que cometesse um pecado mortal, para poder voltar ao estado de graça, ou seja, para receber o perdão no sacramento da Confissão, devia passar por longos anos de penitência. Acontece que essa penitência, por seus rigores e duração, assustava muita gente. Assim surgiu o péssimo costume de adiar o batismo para a hora da morte. Afinal, o Batismo perdoa de uma vez todos os pecados. A confissão, por outro lado, requeria anos de penitência. Levada por esse raciocínio carnal, Mônica, antes de tornar-se santa, decidiu não batizar logo Agostinho, apenas o inscreveu na lista dos catecúmenos. Agostinho, portanto, ficou sem batismo, e nisto começou sua historia calamitatum.

Sem a graça santificante, que além de elevar também cura a natureza, Agostinho se perdeu. Era um menino inteligente, começou a estudar letras, e o que dava dinheiro na época? Ser marqueteiro, uma espécie de advogado chamado retor, ou seja, um orador que defendia causas em tribunais, mas também fazia discursos para promover ideias. Agostinho começou a carreira e foi logo para uma vida de pecado. Mônica viu o erro que tinha cometido. O filho, um pagão, adotou a heresia maniqueia, depois se ligou à filosofia neoplatônica e assim foi ele de calamidade em calamidade, entregando-se a relacionamentos carnais impuros, até ter um filho, Adeodato. Mônica não cessou de rezar e pedir a Deus a conversão do filho. O resumo de toda a história está na famosa frase de Santo Ambrósio, que, vendo a intercessão e o coração amoroso de Santa Mônica, disse: “Um filho de tantas lágrimas não podia se perder”. Eis a vitória da intercessão de uma mãe que se entrega e oferece como vítima para a salvação do próprio filho! Na vida de Santa Mônica vemos, pois, um grande mistério na história da Igreja que poderíamos resumir como o mistério da mulher

O que é o mistério da mulher? É o mistério de Nossa Senhora, corredentora, que aos pés da cruz se ofereceu junto com o seu Filho sacerdote e permaneceu na terra após Cristo subir aos céus. Ora, por que Jesus não levou Nossa Senhora consigo? Ele amava tanto sua Mãe! Se Maria estava destinada a ser assunta em corpo e alma ao céu, por que Jesus não a levou logo no dia da Ascensão? Não. Nossa Senhora permaneceu na terra ainda por longos anos. Por quê? É o mistério da mulher. Maria teve de ficar porque os Apóstolos, que partiriam em missão, precisavam de alguém que merecesse, ou seja, que por meio da oração e do sacrifício lhes impetrasse de Deus as graças necessárias à evangelização dos povos. Esse é o mistério da Igreja. Hoje em dia, infelizmente, muita gente pensa ser uma “injustiça” que as mulheres não possam ordenar-se sacerdotes. Isso só é concebível se se perdeu antes a noção do que é a cruz. Como muitos não entendem mais que a Missa, oferecida pelo padre, é a renovação incruenta do mesmo sacrifício do Calvário, tampouco entendem a necessidade de haver na Igreja mulheres que, mesmo sem nenhum ministério ou poder de Ordem, podem contudo oferecer o sacrifício corredentor de suas orações e penitências, como Maria o fez sempre, aos pés da cruz e até o fim de seu curso terreno.

Eis por que Santa Teresa d’Ávila, no século XVI, ao ver os grandes males que os homens do seu tempo sofriam (metade da Europa tinha-se perdido para a heresia protestante; muitas almas se precipitavam no inferno; o continente americano, descoberto havia pouco, era terra de pagãos etc.), decidiu reformar o Carmelo. Reuniu-se com doze companheiras no Carmelo de São José para se oferecer, e foi assim, com amor e oração, que ela, mulher, realizou ao seu modo um papel quase sacerdotal, a saber: um sacerdócio de intercessão, de oferecimento, de amor e oração, armas com que mereceu graças e mais graças para os missionários e defensores da fé católica. Quem duvida que a evangelização do Brasil por obra de São José de Anchieta se deve, em não menor medida, às preces que Teresa d’Ávila fazia no Carmelo pelos evangelizadores nas Américas? É nesse sentido que Santa Mônica encarna, por assim dizer, o mistério da mulher. Quem duvida que a salvação de milhões de almas depende muitas vezes das orações de mães e de avós, de seus calos nos joelhos, do Rosário em suas mãos, continuamente erguidas para pedir a conversão de maridos, filhos, netos? Esse é o mistério da mulher, o mistério da corredenção, da intercessão, da oração e do sacrifício de si para a salvação das almas, por amor a Deus. Sim, as mulheres são grandes oferendas vivas pela salvação do mundo inteiro, a exemplo da Virgem Maria e também de Santa Mônica, cujas lágrimas deram à Igreja Católica um de seus maiores santos e Doutores.

II. Comentário exegético

As dez virgens. — Às três parábolas anteriores (dos servos vigilantes, cf. 13,33-37; do ladrão inesperado, cf. 24,42ss; e do administrador fiel, cf. 24,45-51) acrescenta Mt. outras duas, bem mais conhecidas: a das virgens imprevidentes (cf. 25,1-13) [1] e a dos talentos (cf. 25,14-30). Em ambas se fala da necessidade de vigiar, i.e. de estar alerta para a vinda de Cristo, embora a primeira sublinhe a prudência dos que se preparam para ela, enquanto a segunda foca na administração fiel dos dons sobrenaturais durante a ausência do Senhor.

a) Imagem. — É tomada do rito nupcial dos orientais, que seguia grosso modo a seguinte forma: adornada de vestes nupciais e cercada de amigas ou parentes, a esposa aguardava em casa a vinda do esposo; este, depois do pôr do sol, também acompanhado por amigos e parentes (i.e. os chamados filhos do tálamo e os amigos do esposo [2]), aproximava-se com rito festivo, a fim de conduzir a mulher à sua casa ou à de seu pai, onde por fim era celebrado o banquete nupcial. 

Dito isto, a explicação literal da imagem não encontra dificuldades. No entanto, 1) podem descobrir-se nela algumas discrepâncias com os costumes antes descritos: a) são as virgens (com a esposa?) que vão ao encontro do noivo; b) no caminho, cinco delas acabam adormecendo enquanto esperam, devido ao atraso do esposo; c) o banquete nupcial parece ser celebrado na casa da esposa ou em outro lugar, e não na do noivo. Alguns autores, de modo um pouco forçado, tentam ajustar a parábola aos costumes conhecidos; o mais provável, porém, é que Jesus, por falar aqui com um público familiarizado com o rito nupcial judaico, tenha feito de propósito um resumo de uma cena já conhecida, passando por alto alguns detalhes que os ouvintes poderiam facilmente subentender ou suprir com a própria imaginação. 

2) Além disso, há nela certos elementos que não parecem corresponder ao modo ordinário dos homens de agir, a saber: a) que, em vez de fachos de resina ou archotes, as virgens tenham usado lâmpadas a óleo [3]; b) que as virgens, amigas da esposa, tenham adormecido numa noite de tanta alegria e expectação; c) que o esposo tenha demorado tanto, a ponto de chegar à hora mais inesperada e inoportuna; d) que as virgens previdentes se tenham portado de maneira tão pouco solícita com as companheiras, mandando-as ao mercado, como se à meia-noite ainda houvesse lojas abertas; e) enfim, que o esposo tenha com tanta dureza proibido as virgens atrasadas de entrar na festa, sendo que ele mesmo fora corresponsável pelo atraso. — As incongruências desaparecem se se leva em conta que, como é frequente no gênero parabólico, não raro se atribuem ao tipo características nem sempre presentes no antítipo real com vistas à doutrina que se pretende transmitir.

b) Doutrina espiritual (v. 13). — 1) Então será semelhante o reino dos céus…, i.e., no tempo da parusia, acontecerá com os cidadãos do reino do céu o que é dito na história das dez virgens. Ora, a narração é parabólica [4], e sua ideia fundamental está expressa no final: Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora (v. 13). A vigilância, porém, que se deseja inculcar é a de quem se prepara com prudência e perseverança, i.e., quaisquer que sejam as circunstâncias, é necessário estar preparado para a vinda do Senhor, por isso não se deve ceder à sonolência por causa da demora nem confiar nos próprios afetos e disposições, já que até as alegrias de um início de festa podem converter-se em tédio, e o que a princípio era fonte de motivação pode levar a perder a hora.

2) Essa ideia fundamental é ilustrada de um duplo ângulo complementar: por um lado, o exemplo das virgens prudentes nos ensina qual será o prêmio do cristão preparado e previdente; por outro, o insucesso das virgens néscias nos alerta para a punição a que serão submetidos os negligentes e despreocupados (serão excluídos das bodas celestes). Daí ser necessário “que a preparação seja atual, quando da chegada do Senhor, e pessoal, pois cada um responderá por si mesmo; e que estejamos sempre preparados, uma vez que o dia e a hora nos são incertos” (Vosté 497). — O imperativo vigiai não é usado aqui em contraposição ao sono das virgens, mas como sinônimo de estai preparados (cf. Mt 24,42.44).

3) Inúmeros autores antigos ensinaram que pelas lâmpadas é simbolizada a fé e pelo óleo, as boas obras, o que de facto é verdade, não porque a parábola as signifique em sentido literal-metafórico, mas porque se trata simplesmente dos dois elementos integrantes da preparação adequada, segundo a doutrina do Evangelho (cf. Mt 7,21ss). — Os detalhes restantes não parecem ter nenhum significado especial, excetuando as figuras do esposo, que faz as vezes de Cristo, e das virgens, pelas quais é representada a totalidade dos fiéis (alguns dos quais estarão despreparados, e outros bem dispostos para a vinda do Senhor).

4) De resto, ainda que diga respeito diretamente ao dia do juízo universal, essa parábola, assim como outras com o mesmo tema, pode também ser aplicada propriamente ao dia da morte de cada homem. “Somos pois advertidos a que não nos contentemos apenas com o óleo da fé, vivendo negligentemente, mas a que busquemos ainda o óleo da caridade e das boas obras antes que chegue o tempo da morte” (Jansênio).

Referências

  1. A. Durand, Évangile selon saint Matthieu. Paris: Beauchesne (ed.), 1948,33 p. 451: “É comum em nossa língua [i.e. em fr; o mesmo vale para o esp., o it. e o pt.] falar de virgens néscias [ou loucas] e de virgens sensatas [por influência da versão da Vulgata]; mas, atendo-se ao texto, seria melhor falar de virgens imprevidentes e previdentes: imprevidentes pelo descuido, previdentes pela sensatez”.
  2. A expressão “filhos do esposo” (em Mc., “filhos das bodas”, lt. filii nuptiarum; gr., nos três sinóticos, οἱ υἱοὶ τοῦ νυμφῶνος, i.e. filhos do tálamo ou do cubículo nupcial; hebr. benê chuppa), embora designe na Mishna (cf. hier. Sukk. 53a) todos os convidados para as bodas, parece significar aqui certos adolescentes em companhia dos quais o esposo ia ao encontro da esposa com pompa festiva e alegre. Cabia-lhes manter a alegria durante os sete dias de núpcias. Mas não devem ser confundidos com os chamados amigos do esposo (hebr. shoshbînîn, gr. παρανυμφίοι) de que se fala em Jo 3,29, que eram apenas dois (ao menos na Judeia) e gozavam de maior familiaridade, mesmo no que dizia respeito apenas ao casal.
  3. Essa discrepância se desfaz se, com Zorell (VD 1930, pp. 176-182), interpretarmos o vocábulo λαμπάς como os fachos nupciais usados na Palestina até não pouco tempo. Trata-se de bastões de madeira bastante comprimidos, revestidos na parte de cima por panos embebidos de óleo; para mantê-los úmidos, era necessário levar consigo um pequeno pote de óleo.
  4. Os antigos e também alguns autores mais recentes consideram a imagem uma alegoria, lida “por muitos de maneiras bastante variadas e, como quase nenhuma outra, tratada pela maioria com excessiva minuciosidade” (Jansênio). Por sua beleza literária costuma-se valorizar a exposição de Santo Agostinho (cf. serm. 99: M 38,573-580). Maldonado, como sempre, compila as interpretações de todos os antigos. Vosté apresenta uma breve história da interpretação dessa parábola.

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