São José certamente não estava vivo quando Jesus começou seu ministério público. Isso sempre foi sustentado pela tradição, e por quatro razões.

Primeiro, depois que o ministério público começa, José nunca mais é mencionado nos Evangelhos em conexão com Jesus ou Maria, ou mesmo com a família mais ampla dos “irmãos” (ou, mais propriamente, primos do Senhor). Há inclusive certa sugestão na maneira como as pessoas se referem a José de que ele não estaria mais vivo: “Não é este o filho do carpinteiro?” (Mt 13, 55).

Segundo, por que Jesus teria confiado os cuidados de Maria a João (cf. Jo 19, 27), se José ainda estivesse vivo?

Terceiro, a profecia de Simeão sobre um sofrimento futuro (Lc 2, 35: “E uma espada transpassará a tua alma”, diz respeito apenas a Maria (“Quanto a ti…”), não a José.

Quarto, era conveniente que José saísse de cena antes de começar o ministério público do Senhor, para que, quando Jesus ensinasse sobre seu Pai, ficasse sempre claro de quem ele estava falando.

“A morte de São José”, por Miguel Cabrera.

Considero essa lista de razões fascinante. Já fui protestante e, como tal, estava convencido de que o Evangelho poderia ter a clareza necessária para confrontar “o mundo” apenas se os cristãos baseassem suas crenças somente nas Escrituras, e não em “meras tradições humanas”.

E no entanto qual é o status desta verdade: que “José não estava vivo quando Jesus começou seu ministério público”? Não se baseia total e exclusivamente nas Escrituras, mas ainda assim tem fundamento nelas. Além disso, não é uma “mera tradição humana”. É, no mínimo e com certeza, uma tradição piedosa, isto é, algo partilhado e transmitido por quem contempla a vida do Senhor com os olhos da fé.

Quando protestante, tampouco tinha uma noção coerente de autoridade na Igreja. Assim, eu não podia fazer nenhuma distinção entre o que os cristãos são obrigados a crer como verdade de fé (de fide), e o que somos livres para crer por estar fundamentado e ser amplamente defendido por cristãos piedosos e criteriosos.

Agora, como católico, posso dizer que essa verdade — a de que José morreu antes do ministério público — não é de fide. Isso me dá liberdade para o afirmar com a seguinte força: posso defendê-la como verdadeira e afirmar que é bom crer nela, embora isso não implique que os outros estejam obrigados a acreditar, se não forem persuadidos por minhas razões.

Dessa lista de motivos, o quarto é para mim o mais fascinante. Teria José entendido isso? Saberia ele que lhe era melhor partir do mundo antes de Jesus começar seu ministério público? Pe. Gasnier, em seu grande livro de meditações José, o Silencioso, pensa assim: “[José] pressentia que sua presença ao lado de Jesus não só não era necessária como podia agora se tornar um estorvo. Não convinha que o mundo pensasse que ele era o verdadeiro pai desse jovem” [1].

Neste caso, a morte de José assume um significado interessante.

Escultura da morte de São José na Catedral de Nossa Senhora de Loreto, em Mendoza, Argentina.

Para entender por quê, consideremos outra pergunta: quantos anos tinha José quando morreu? Se ele era velho quando se casou, já estaria muito velho quando morreu. Algumas tradições antigas, enraizadas em escritos apócrifos, afirmam que José já era velho e fora casado antes por mais de quarenta anos quando desposou Maria. Santo Epifânio lhe atribui 90 anos! Mas essa opinião foi veementemente rejeitada por São Jerônimo, e é seguro dizer que uma reflexão mais completa na Igreja ao longo dos séculos ficou do lado de São Jerônimo.

A melhor opinião, que é a que eu aceito, afirma que ele seria jovem quando se casou com Maria. De fato, era costume que os homens pretendessem casar-se no final da adolescência. Sua devoção à virgindade, à sua e à de Maria, estava enraizada no idealismo dos jovens. Ninguém teria apoiado o casamento de um homem de 90 anos com uma adolescente. E é errado atribuir seu respeito pela virgindade de Maria à senilidade, ao invés da virtude.

Portanto, suponhamos que ele tinha 20 anos quando se casou com Maria: provavelmente tinha 40 quando morreu, quer dizer, São José teve uma “morte prematura”, mesmo para aquela época. Ele não morreu de velhice nem de fraqueza generalizada (excluímos uma morte violenta), mas de alguma debilidade particular que o levou embora.

Unamos agora os dois pensamentos: José percebeu que lhe era melhor sair de cena e morreu relativamente jovem, aceitando a morte, precisamente naquela época, como enviada por Deus.

Creio que chegamos assim a algumas conclusões interessantes. Em primeiro lugar, podemos entender a morte de José como, de maneira misteriosa, uma participação na Paixão do Senhor na forma de um prenúncio, como a morte de João Batista e o martírio dos Santos Inocentes.

Em segundo, ele ofereceu sua vida sem ainda ver consumada a vida de Jesus. Assim, sua morte foi marcada por uma fé tremenda. Ele não ouviu o Sermão da Montanha. Ele não viu Jesus transformar água em vinho, curar leprosos ou ressuscitar Lázaro. Ele não viu a Paixão ou a Ressurreição.

Em terceiro lugar, a nova vida em Cristo da qual ele, por eleição especial, deu testemunho foi precisamente uma vida de trabalho ao lado de Jesus como amigo, e de família com Maria. Não admira que, onde quer que tenha florescido com normalidade a vida familiar cristã, ali se tenha invocado a São José com fervor!

Por último, podemos entender por que os Papas nomearam São José patrono dos moribundos: porque ele é especialmente sensível ao fato de a morte muitas vezes nos assaltar desprevenidos. “De bom grado morrerei, Senhor, no momento, no lugar e do modo que Vós quiserdes” [2].

“Deixai-me morrer como o glorioso São José, acompanhado por Jesus e Maria, pronunciando aqueles nomes mais doces, que espero exaltar por toda a eternidade!”

Referências

  1. Michel Gasnier. José, o Silencioso. Quadrante: São Paulo, 1995, p. 140.
  2. Seleta de Orações. São Paulo: Cultor de Livros, 2011, p. 209.

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