Respondendo se salvar um pecador é a maior obra de Deus, Santo Tomás de Aquino ensina que "o bem da graça de uma só pessoa é maior que o bem da natureza de todo o universo" [1]. A frase do Doutor Angélico pode parecer dura (inaceitável para alguns), mas não é mais escandalosa que o próprio Evangelho. Afinal, é o próprio Cristo quem — com uma clareza que dispensa notas de rodapé — interroga aos de seu tempo: "Que servirá ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua própria alma?" (Mt 16, 26).
De fato, quando olhamos para as coisas deste mundo, mesmo aquelas reconhecidamente boas e saudáveis, à luz da eternidade, tudo não passa de um pequeno e insignificante grão de areia. Como diz o Apóstolo, "a figura deste mundo passa" (1Cor 7, 31), e, na mesma linha, Santo Agostinho, após ensinar que "maior obra é fazer do ímpio um justo, que criar o céu e a terra", acrescenta: "O céu e a terra passarão; a salvação e a justificação dos predestinados, ao contrário, permanecerão" [2]. Ora, ninguém duvida que a obra da criação seja boa. O Gênesis relata que Deus, após ver concluída a obra de suas mãos, "viu tudo quanto havia feito, e era muito bom" (Gn 1, 31). A vida sobrenatural da graça, porém, é um bem muito mais valioso que "todo o universo", que toda vida meramente natural.
Verdades como essas têm as suas consequências práticas. Se o bem espiritual de uma única pessoa sobrepuja "o mundo inteiro", cada um deveria zelar pela sua própria alma com muito mais cuidado do que zela, por exemplo, pelo jardim da própria casa, pelo seu cachorro de estimação ou pela sobrevivência dos mico-leões dourados. O mesmo raciocínio vale para o pecado, que destrói a vida da alma: uma só ofensa a Deus é muito pior do que qualquer atentado ao mundo natural. Não deveria sequer haver comparação entre realidades tão distantes e, se o homem moderno não suporta sequer ler este simples parágrafo, é porque, realmente, perdeu a sua fé.
O então Cardeal Joseph Ratzinger, em seu livro-entrevista O Sal da Terra, de 1997, identifica com exatidão o problema de quem, querendo "lutar pelo meio ambiente", ignora a sacralidade do ser humano:
"Parece-me claro que, de fato, é o Homem que ameaça retirar o sopro vital à natureza. E que a poluição do ambiente exterior que observamos é o espelho e o resultado da poluição do ambiente interior, à qual não prestamos suficiente atenção. Julgo que é também o que falta aos movimentos ecológicos. Combatem com uma paixão compreensível e justificada a poluição do ambiente; a poluição espiritual que o Homem faz a si mesmo continua, pelo contrário, a ser tratada como um dos seus direitos de liberdade. Há aqui uma desigualdade. Queremos afastar a poluição mensurável, mas não tomamos em consideração a poluição espiritual do Homem e a figura da criação que nele se encontra, para que se possa respirar humanamente. Defendemos, pelo contrário, tudo o que a arbitrariedade humana produz, com base num conceito completamente falso de liberdade.
Enquanto mantivermos essa caricatura de liberdade, quer dizer, a liberdade de uma destruição espiritual interior, continuarão imperturbavelmente os seus efeitos exteriores. [...] Não é apenas a natureza que tem as suas regras e as suas formas de vida, que temos de respeitar, se quisermos viver dela e nela, mas também o Homem é interiormente uma criatura e está sujeito à ordem da criação. Não pode fazer de si mesmo tudo o que quer, como lhe apetece. Para que o Homem possa viver a partir do interior, tem de aprender a reconhecer-se como criatura e tem de se dar conta de que nela deve existir, por assim dizer, a pureza interior devida ao fato de ele ser criatura, a ecologia espiritual. Se esse elemento fundamental da ecologia não for compreendido, tudo mais se desenvolverá num sentido negativo." [3]
Como Ratzinger mesmo reconhece, é "compreensível e justificada" a preocupação do homem com o meio ambiente. O Papa Francisco também gosta de recordar que "somos guardas da criação" e que, quando a devastamos, "destruímos o sinal do amor de Deus". Não se pode, porém, esquecer que "também o Homem é interiormente uma criatura e está sujeito à ordem da criação", não podendo "fazer de si mesmo tudo o que quer". Ainda que seja o "ápice" de tudo o que Deus criou [4], ele não é o artífice do universo. Há uma lei inscrita na natureza e no seu coração, à qual ele deve obediência; há um Criador que o rege e o governa acima de sua cabeça e ao qual ele, com sua alma imortal (que o distingue de todos os animais), deve respeito.
"Toda a criação espera ansiosamente a revelação dos filhos de Deus" (Rm 8, 19), diz o Apóstolo. Eis, pois, a chave para equilibrar o relacionamento humano com a Criação: reconciliar-se interiormente com o Criador, assumindo e vivendo a sério a filiação divina. Um fato da vida de São Francisco de Assis talvez ajude a ilustrar as palavras de São Paulo:
"Ao atravessar o lago de Rieti, a fim de alcançar o eremitério de Greccio, certo pescador, por devoção, lhe ofereceu [a Francisco] uma ave aquática. Tomou-a ele nas mãos abertas e convidou-a a voar embora. Mas vendo o santo que ela não queria ir embora, levantando os olhos para o céu, ficou imerso em longa oração. Depois de muito tempo, voltando a si, como se fosse de um outro mundo, voltou a convidar o pássaro a voar embora e louvar o Senhor. E tendo recebido a permissão e a bênção, expressando sua alegria com os movimentos do corpo, partiu." [5]
Francisco, ostentando uma ave nas mãos e "levantando os olhos para o céu, ficou imerso em longa oração". Oxalá o mundo natural seja instrumento para que amemos a Deus, para que dirijamos a nossa alma aos bens imperecíveis da eternidade. Que São Francisco de Assis, constantemente louvado por seu amor às criaturas e por seu cuidado com a natureza, seja igualmente imitado em sua piedade e busca de perfeição.
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