Santa Clara é popularmente conhecida pela sua pobreza evangélica e fidelidade à Ordem fundada por seu amigo e pai espiritual, São Francisco de Assis. Também é costume invocá-la para trazer o Sol em dias muito chuvosos. Há um outro aspecto da religiosidade dessa santa, no entanto, que passa quase despercebido pelas pregações a seu respeito: o seu matrimônio espiritual com Cristo.

Clara tinha um jeito todo particular de se dirigir a Jesus. Em uma carta à sua amiga Santa Inês de Praga, por exemplo, pode-se notar com que amor e confiança a discípula de Francisco vivia sua vocação esponsal. " Amando-o, és casta, tocando-o, serás pura, deixando-te possuir por Ele, és virgem" [1]. São palavras mesmo espetaculares — possivelmente escandalosas para alguns —, que revelam, por um lado, a ternura própria das esposas a seus esposos e, por outro, o amor esponsal de Jesus, o noivo das almas, que, embora "possuindo" o corpo de sua amada, não o agride nem viola sua dignidade. Ao contrário, na união com o Corpo de Jesus alcança-se plenamente o sentido tanto espiritual quanto existencial da pessoa humana, como pôde experimentar Santa Clara e inúmeros outros santos.

É preciso distinguir, é claro, o matrimônio espiritual do matrimônio comum entre um homem e uma mulher. Este, apesar da sacramentalidade, envolve certamente a relação carnal e consiste em algo terreno, que não terá continuidade no Céu. Aquele, por sua vez, diz respeito a uma realidade da vida de oração, em cujo grau máximo de união com Deus ocorre uma espécie de "matrimônio" espiritual pela comunhão total da alma do orante com a Pessoa de Nosso Senhor. É desse último que Santa Clara fala em suas cartas e outros escritos místicos e ao qual foi totalmente fiel até o termo de sua vida neste mundo.

O Papa Bento XVI, em uma de suas catequeses, recorda que, assim "como Clara e as suas companheiras, inúmeras mulheres ao longo da história ficaram fascinadas pelo amor a Cristo que, na beleza da sua Pessoa divina, enche o seu coração". Elas se apaixonaram por um homem que, de maneira especial, olhou-as em sua profundidade, sabendo acolhê-las e protegê-las das ciladas do mundo. O amor esponsal de Jesus tem a virtude de revelar às almas o seu conteúdo mais sagrado. Foi esse amor, aliás, o que redimiu Santa Maria Madalena de suas impurezas para torná-la um vaso puro e cristalino, como insistem alguns autores espirituais. Dela, São Francisco de Sales testemunha: "Não lhe é dado o nome de virgem, mas a verdade é que o merece pela perfeita pureza em que viveu depois da conversão" [2].

Note-se, por isso, que Clara não estava exagerando nem sendo audaciosa ao apresentar a pureza do amor esponsal de Jesus. De fato, Ele não só não agride como também restaura o que foi agredido pela violência do pecado.

A cultura contemporânea, na contramão do que propõe a espiritualidade cristã, dissemina exatamente o oposto do amor restaurador. Trata-se, ao contrário, de impor uma lascividade agressiva tanto às mulheres quanto aos homens, que os reduz a animais dominados pelos instintos e pelas paixões. Isso gera a insegurança afetiva, os desarranjos familiares, a opressão de um sexo sobre o outro, as ideologias de gênero e por aí vai. Na verdade, tanto as mulheres vão perdendo a sua natural feminilidade, para se adaptarem aos estereótipos da moda, quanto os homens se tornam menos viris, desorientados pela propaganda gay e antimasculina. As famílias não têm mais pai nem mãe, e por isso delegam suas responsabilidades ao Estado usurpador e autoritário.

Como seria bom se homens e mulheres, de acordo com a vocação específica de cada um, se espelhassem no amor esponsal entre Jesus e suas almas esposas. Tal esforço tornaria os namoros mais castos e os casamentos menos conflituosos, pois nem esposa nem esposo procurariam apenas um corpo para ser usado e descartado, mas uma pessoa com quem pudessem compartilhar toda a existência sem correr o risco de uma separação. A alegria de um matrimônio depende da maneira e da ordem em que a família ama a Deus e a si mesma.

Peçamos a intercessão de Santa Clara de Assis neste dia para que ela, amparada em seu Amado Esposo, limpe o céu nublado que turva a visão das famílias e as impede de ver a luz restauradora do amor de Cristo.

Referências

  1. Santa Clara, Primeira Carta: FF, 2862.
  2. São Francisco de Sales, X, 86. Sermão no dia de Santa Maria Madalena.

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