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Homilia Dominical
18 Set 2014 - 26:46

A recompensa será igual para todos?

No Evangelho, Nosso Senhor compara o Reino dos céus ao patrão que, após contratar vários trabalhadores em horas diferentes do dia, remunera todos eles igualmente. É assim mesmo? A recompensa eterna será realmente igual para todos? Confira a resposta nesta pregação.
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Homilia Dominical - 18 Set 2014 - 26:46

A recompensa será igual para todos?

No Evangelho, Nosso Senhor compara o Reino dos céus ao patrão que, após contratar vários trabalhadores em horas diferentes do dia, remunera todos eles igualmente. É assim mesmo? A recompensa eterna será realmente igual para todos? Confira a resposta nesta pregação.
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo Mateus
(Mt 20, 1-16a)

No Evangelho deste Domingo, Nosso Senhor conta a seus discípulos a parábola dos trabalhadores na vinha. Após contratar várias pessoas para o trabalho, algumas de madrugada, outras às nove da manhã, outras ao meio-dia e às três, e outras ainda às cinco da tarde, o seu patrão remunera-os igualmente, com uma moeda de prata. Diante disso, os que haviam sido contratados primeiro “começaram a resmungar contra o patrão: ‘Estes últimos trabalharam uma hora só, e tu os igualaste a nós, que suportamos o cansaço e o calor o dia inteiro’”.

Para entender o significado dessa parábola, é preciso explicar o contexto do Evangelho de São Mateus. Ele foi escrito para comunicar a vida de Jesus aos cristãos convertidos da religião judaica, supondo que os seus ouvintes conheciam a história da Antiga Aliança, dos patriarcas e profetas do Velho Testamento, das festas religiosas do povo israelita etc. A partir dessa informação, é possível entender a parábola como uma resposta aos cristãos vindos do judaísmo, que são justamente os trabalhadores que foram contratados “de madrugada”, pois começaram a seguir o Deus verdadeiro ainda no começo da história.

Sabe-se que, no alvorecer das primeiras comunidades cristãs, houve um sério conflito por parte dos cristãos “judaizantes”, que queriam que os convertidos do paganismo se submetessem a algumas prescrições da Torá - como a circuncisão - antes de se batizarem e entrarem na Igreja. A controvérsia foi resolvida no episódio do Concílio de Jerusalém, no qual os apóstolos decidiram “não (...) inquietar os pagãos que se convertem a Deus” [1], mandando-os tão somente “abster-se de carnes sacrificadas aos ídolos, do sangue, das carnes de animais sufocados e das uniões ilícitas” [2].

Ao comparar o Reino dos céus ao patrão que premiou tanto os primeiros trabalhadores quanto os que foram contratados depois com a mesma recompensa, Nosso Senhor já resolvia essa dificuldade do futuro, ilustrando a generosidade de Deus, que se dá todo aos homens, seja aos judeus, seja aos pagãos.

Santo Tomás de Aquino, comentando este Evangelho [3], divide-o em duas partes: a da contratação e a da remuneração.

Com relação à contratação, percebe-se como “Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” [4]: o dia de que fala o Evangelho simboliza tanto a história da humanidade - Deus chamou alguns de madrugada, isto é, de Adão a Noé; outros na hora terça, de Noé a Abraão; outros na hora sexta, de Abraão a Moisés; e outros ainda na hora nona, de Moisés até a vinda de Cristo -, quanto a história de cada homem em particular - alguns o Senhor chama de madrugada, isto é, na infância; outros na hora terça, que é a adolescência; outros na hora sexta, que é a idade adulta; outros na hora nona, que é a velhice; e outros ainda chama na última hora, como chamou o bom ladrão [5].

Quanto à remuneração, a moeda de prata de que fala o Evangelho é a vida eterna, o patrão é Deus Pai e o administrador é Deus Filho. Ao distribuir a recompensa, o patrão dá uma moeda de prata aos trabalhadores, mostrando que a recompensa eterna é igual para todos. Mas, em que sentido se pode dizer isso? Santo Tomás explica:

“A bem-aventurança pode ser considerada quanto ao objeto, e, então, ela é uma só para todos; e quanto à participação do objeto, e, então, ela é diferente, pois nem todos participarão dela do mesmo modo, conforme está escrito em Jo 14, 2: Na casa de meu Pai, existem muitas moradas. É como se muitos fossem à procura de água, e um carregasse um vaso maior do que o outro: o rio está disponível a todos, mas nem todos levarão a mesma quantidade. Assim, quem tem a alma mais dilatada, mais caridade recebe.” [6]

Para entender o que diz o Aquinate, pode servir de apoio a parábola dos talentos [7], na qual o senhor retribui a cada um de seus servos de acordo com o seu trabalho. Embora pareça, essas duas passagens não estão em contradição. Deus, que é como um oceano infinito, é capaz de preencher totalmente tanto uma tampinha de garrafa quanto um copo, uma piscina ou uma Baía de Guanabara. De fato, o objeto da bem-aventurança é um só, Deus mesmo; no entanto, a participação de cada um nessa recompensa será diferente, pois cada um amou a Deus de forma diferente.

A grande lição deste Evangelho é recordar-nos que a recompensa divina não é merecida por nenhum de nós e, por isso, todos devemos viver em ato de contínua gratidão a Deus. Ao responder à murmuração dos primeiros trabalhadores, o patrão lhes pergunta se estão “com inveja”. No original grego, a expressão do Autor Sagrado é: ὀφθαλμός πονηρός [lê-se: ophthalmós poneirós], que quer dizer, literalmente, “olho mau”. Esse termo - que também já foi consagrado pela linguagem popular - descreve uma atitude espiritual: o invejoso, quando vê alguém feliz, se entristece com a sua alegria. Jesus denuncia que esse remordimento interno é causado por uma mentalidade mesquinha, a mesma mentalidade do fariseu que acha que é digno do Reino dos céus [8]. Ele se esquece que todos os que se salvarem o serão por pura misericórdia de Deus e que até os méritos que ele adquire só são possível graças à graça divina. Por isso, é importante dirigir o olhar ao Senhor, em meio ao cansaço e a fadiga do dia a dia, e dizer: Senhor, eu não mereço, mas deixe-me trabalhar pelo vosso Reino, viver o cansaço do dia a dia, por vosso amor.

É importante lembrar também que hoje, 21 de setembro, é justamente o dia da memória de São Mateus. Vivendo como publicano por muito tempo, o evangelista foi um desses agraciados de última hora, que deixou a coletoria de impostos e todo o resto para seguir Nosso Senhor. Depois de deixar a velha vida, Mateus também correspondeu ao amor de Deus, pregando o Evangelho até o martírio. Ele é, portanto, um exemplo das duas realidades: não só é o que se converteu, mas também aquele que trabalhou até o fim, ganhando do Senhor a graça de merecer morrer por Sua causa.

Como São Mateus, independentemente de nossa história de vida, alegremo-nos e correspondamos generosamente à graça superabundante que Deus derrama sobre nós.

Referências

  1. At 15, 19.
  2. At 15, 29.
  3. Cf. Santo Tomás de Aquino, Super Evangelium Matthaei, 20, 1.
  4. 1 Tm 2, 4.
  5. Cf. Lc 23, 39-43.
  6. Santo Tomás de Aquino, Super Evangelium Matthaei, 20, 1. Cf. também Suma Teológica, I-II, q. 5, a. 2.
  7. Cf. Mt 25, 14-30.
  8. Cf. Lc 18, 9-14.
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