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Texto do episódio
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Vamos contar hoje a história de um rapaz, cuja vida esteve profundamente associada à mensagem de Fátima: o Beato Carlo Acutis. Ele foi preparado, desde a infância, para viver o “caminho de santificação” que Nossa Senhora revelou aos três pastorinhos, cem anos atrás: o amor à Eucaristia e a oferta dos sofrimentos pela conversão dos pecadores. Carlo costumava dizer a seus amigos: “Os milagres realizados por Nossa Senhora nas suas aparições na terra podem ajudar muito a aumentar a Fé de muitas pessoas. Como é possível as pessoas ignorarem os apelos que Nossa Senhora nos deixou?” Toda essa devoção lhe rendeu uma vitrine no Santuário de Fátima, onde as pessoas podem ver sua mochila e seu rosário.

Carlo Acutis nasceu a 3 de maio de 1991, em Londres, na Inglaterra, e lá mesmo foi batizado, poucos dias depois, na paróquia de Nossa Senhora das Dores. Em setembro do mesmo ano, ele e sua família, que é de origem italiana, transferiram-se para Milão, onde Carlo viveria até os 15 anos de idade. 

Os Acutis eram uma família economicamente rica, podendo oferecer as melhores condições de vida ao pequeno herdeiro. Mas lhes faltava o principal, que é a vida religiosa. A própria dona Antônia, mãe de Carlo, confessa que, antes da conversão, ela só havia entrado na Igreja para a primeira comunhão, a crisma e o casamento. Também o pai de Carlo, seu Andreas, não tinha muita vida cristã. Então, a providência divina tratou de enviar à casa dos Acutis uma babá polonesa que, com seu exemplo, despertaria no menino a sede de Deus.

Essa babá, chamada Beata, começou a ensinar a Carlo pequenas lições sobre o cristianismo, de modo que, já aos quatro anos de idade, ele demonstrou tal interesse pelas coisas de Deus, como se tivesse sido eleito para uma vocação especial. Mais tarde, essa eleição ficaria mais clara. Em todo caso, Carlo desandou a fazer perguntas teológicas à mãe, deixando-a bastante embaraçada, pois dona Antônia percebeu que pouco sabia sobre a fé cristã.

Para satisfazer a santa curiosidade do filho, dona Antônia foi aconselhar-se com um padre de Bolonha, que a mandou estudar o catecismo e a teologia católica. Isso lhe rendeu o retorno ao seio da Igreja, porque o estudo da fé cristã fê-la enxergar um universo antes desconhecido. Mais tarde, dona Antônia chamaria Carlo de seu “pequeno salvador”.

Carlo então cresceu em “estatura e graça”, por assim dizer, nutrindo uma fé enorme na Eucaristia e em Nossa Senhora. Aliás, esses seriam os dois pilares da sua espiritualidade. Bem cedo, a devoção ao Santo Terço lhe chamou a atenção, indo com a família a Nápoles, a fim de visitar o Santuário de Nossa Senhora do Rosário de Pompeia. 

Além disso, Carlo, por sua própria iniciativa, também insistiu para fazer a primeira comunhão antes do tempo previsto. O bispo de sua diocese, Dom Pasquale Macchi, que havia servido pessoalmente a Paulo VI, reconheceu a reta intenção do menino e lhe permitiu o acesso à Eucaristia, desde que a sua primeira comunhão fosse num local mais recolhido. E, assim, com apenas sete anos de idade, Carlo Acutis recebeu o Corpo Eucarístico de Nosso Senhor Jesus Cristo pela primeira vez, no silencioso Mosteiro de Bernaga, em Perego. Depois disso, o pequeno Carlo daria passos de gigante.

O amor de Carlo pela Eucaristia era tanto que sua família tinha de levá-lo à Missa todos os dias. Às vezes, quando seu Andreas e dona Antônia estavam impossibilitados, eles encomendavam a tarefa a um empregado da casa. Esse empregado, chamado Rajesh, era hindu e brâmane, ou seja, membro da casta sacerdotal do hinduísmo. Rajesh seria o amigo de Carlo em várias das suas brincadeiras e atividades, assim como o “primeiro fruto” do seu apostolado. Rajesh, vendo como Carlo falava tanto “dessa Eucaristia”, decidiu pedir o batismo para que também ele pudesse comungar.

De fato, Carlo exerceu um verdadeiro apostolado sobre a Eucaristia, falando dela a seus primos, tios, amigos etc. Aqui já podemos vislumbrar os primeiros acenos da mensagem de Fátima no caminho espiritual de Carlo Acutis. Antes que a Virgem Santíssima visitasse os três pastorinhos, o Anjo de Portugal veio ensinar-lhes justamente a devoção à Eucaristia. Carlo, por sua vez, tinha uma fé certa e profunda no Santíssimo Sacramento. Conta o seu biógrafo Nicola Gore que, certa vez, ele interrogou Carlo sobre a presença de Cristo na Hóstia consagrada, dizendo-lhe que muitos teólogos não acreditavam na ideia de transubstanciação. Carlo respondeu enfaticamente: “Esses teólogos estão errados!” Mais tarde, Carlo gravaria um vídeo explicando didaticamente o milagre da transubstanciação aos seus amigos. Com a sua beatificação, ele será o primeiro santo youtuber.

Essa fé eucarística, marcada por constantes “atos de fé”, fez Carlo Acutis progredir extraordinariamente no caminho da santidade. Carlo tanto queria estar próximo de Jesus que não entendia “como tanta gente podia fazer filas intermináveis para assistir a eventos como um show de rock e, mesmo sendo católicos, jamais encontravam tempo para permanecer alguns segundos em silêncio diante do sacrário”

A convicção de Carlo chegava a deixar seu Andreas boquiaberto, porque depois de lhe oferecer uma viagem a Jerusalém, Carlo respondeu ao pai: “Não, papai! Aqui em Milão há tantos tabernáculos, que não é necessário ir a Jerusalém ver onde Jesus esteve há dois mil anos, se eu posso estar onde Ele está hoje”. No fim da vida, Carlo revelaria ao seu diretor espiritual que já conseguia rezar diante do sacrário sem nenhuma distração.

Esse recolhimento milagroso, do qual Carlo dispunha para rezar, é uma evidência de que ele conseguiu superar os graus iniciais da perfeição cristã. Carlo tinha uma docilidade extraordinária ao Espírito Santo que o levava a fazer comunhões muito fecundas; ele tinha mesmo o hábito de rezar antes da Missa e ficar alguns instantes em ação de graças após a comunhão. Como um dos segredos para a santidade, Carlo ensinava aos seus amigos o valor da comunhão diária e da confissão frequente. 

Esse amor de Carlo pela Eucaristia ou, como dizia São Francisco Marto, pelo “Jesus escondido”, era, de fato, enraizado no seu amor à Virgem Maria, o que mostra como a devoção mariana é também cristocêntrica. Quando Nossa Senhora fala à Irmã Lúcia da devoção dos cinco primeiro sábados, ela expõe todo um itinerário de oração e reparação que, no fim das contas, encaminha a alma para um encontro íntimo com Jesus. Conduzido por Maria e pelo Espírito Santo, Carlo seguiu esse mesmo itinerário, de modo que, durante a récita do Terço, ele fazia verdadeiras “refeições espirituais”. Graças a essa relação muito próxima com a Mãe de Deus, ele pôde dizer antes da morte que Maria havia sido a única mulher de sua vida.

Nossa Senhora guardou-o na castidade, a fim de que toda a vontade de Carlo fosse orientada ao apostolado eucarístico. Embora não tivesse diário, por considerar isso uma coisa de meninas, muito do que sabemos sobre ele estava disponível no seu computador. Depois de sua morte, vasculharam o histórico de suas atividades na internet e, de verdade, não encontraram o menor traço de algum site menos impuro. Nossa Senhora ajudou-o a utilizar a internet de forma santa. 

Com 11 para 12 anos de idade, Carlo decidiu organizar uma mostra sobre os milagres eucarísticos, que pode ser vista ainda hoje no seu site. O menino fez uma pesquisa tão apurada que há em sua mostra milagres eucarísticos dos quais poucas pessoas ouviram falar. Para Carlo, era óbvio que o maior milagre é a transubstanciação, mas se Deus havia realizado tais prodígios, pensava, nós deveríamos nos dar ao trabalho de divulgá-los. Assim, ele não poupou esforços: fez várias viagens com os pais até os locais mais remotos onde se havia notícia de algum milagre eucarístico. Carlo os fotografava e recolhia o máximo de informação para poder evangelizar seus amigos. O trabalho rendeu uma mostra internacional que atingiu vários países, inclusive a China.

Toda essa devoção de Carlo levou-o, aos poucos, a uma entrega mais radical, que seria mediada pela intercessão de Nossa Senhora. Outro interesse muito particular dele eram as aparições marianas, às quais também dedicou uma pesquisa. No seu coração ardiam muito forte as aparições de Lourdes e Fátima. Assim, numa viagem com seus pais para Lourdes, Carlo começou a ler para eles passagens das Memórias da Irmã Lúcia. Quando ouviu falar em “oferecimento pela conversão dos pecadores” e na récita de muitos terços para se chegar ao Céu, Carlo percebeu o quanto ainda precisava progredir espiritualmente. 

Em razão disso, ele se determinou a levar uma vida ainda mais santa, regada pelas graças sacramentais e pela oração piedosa. E o mais importante: Carlo entendeu que precisava consagrar-se a Nossa Senhora e entregar todos os seus sofrimentos a Deus, em reparação das ofensas contra os corações de Jesus e Maria. Tratava-se de morrer para o mundo e nascer para o Senhor.

Essa consciência a respeito dos sacrifícios tornou-se tão forte no coração de Carlo, ao ponto de ele intuir que logo morreria. Numa gravação com seus amigos, poucos meses antes de sua morte, ele disse: “Estou destinado a morrer”. Dois meses depois, Carlo pegaria uma gripe. A princípio, todos acharam que seria uma simples caxumba, mas o diagnóstico era terrível: leucemia tipo M3. Tratava-se de uma doença fulminante. Mas, para surpresa de todos, Carlo recebeu a notícia com serenidade, dizendo: “Deus acaba de programar o alarme”. Na verdade, ele tinha clareza de que não sairia mais do hospital. Ele fez então o seu oferecimento de amor, entregando a Deus todos os seus sofrimentos pelo Papa, pela Igreja e pela conversão dos pecadores, a fim de que não passasse pelo purgatório e fosse direto ao Céu.

Da entrada ao hospital São Gerardo de Monza até a sua morte, passaram-se quatro dias de grande agonia e heroicidade. Apesar dos sofrimentos graves, Carlo dizia aos enfermeiros: “Há gente que está pior”. Além disso, não permitia que acordassem a sua mãe, a fim de poupá-la daquela via dolorosa. Antes de morrer, às 6h45min do dia 12 de outubro de 2006, Carlo pediu os últimos sacramentos e confessou alegremente: “Eu estou feliz de morrer porque vivi a minha vida sem perder nenhum minuto em coisas que não agradam a Deus”

Como devoto de São Francisco, Carlo pediu que seu corpo fosse enterrado na cidade de Assis. Era um gesto coerente, pois Carlo tinha imitado várias das virtudes do Poverello, renunciando muitas vezes à própria riqueza. À noite, saía com seu amigo Rajesh para levar comida aos andarilhos, chegando uma vez a voltar descalço para casa, pois, diante da necessidade de um mendigo, deu-lhe o único par de sapatos de que dispunha, embora a mãe sempre lhe quisesse comprar um novo.   

Esse “caminho” de Carlo fê-lo pensar que deveria ser sacerdote. Chegou mesmo a perguntar à mãe se deveria entrar no seminário, ao que ela sabiamente respondeu: “É Deus quem vai deixar as coisas claras para você”. Hoje Carlo é sacerdote no céu, porque sacerdote é aquele que se oferece como vítima pela salvação das almas. 

Carlo ofereceu-se com Jesus pelas mãos de Nossa Senhora. E os frutos dessa entrega já se manifestaram desde a sua morte. De fato, no momento de seu funeral, era nítido como Carlo havia exercido um enorme apostolado, atraindo pessoas de todos os tipos ao seu encontro: estavam presentes ali católicos, muçulmanos, hindus, budistas etc., pessoas que ele havia visitado, durante seus passeios de bicicleta.

Finalmente, o testemunho de Carlo Acutis chegou às terras brasileiras e, para a nossa felicidade, o milagre que deve abrir caminho à sua beatificação aconteceu em Campo Grande (MS), na Paróquia São Sebastião, onde padre Marcelo Tenório é pároco.

Sem dúvida, Carlo Acutis é um legítimo filho de Nossa Senhora de Fátima, tendo vivido com amor e sacrifício a fé católica, sobretudo nas suas colunas principais: a Eucaristia e o Santo Rosário. Carlo é, portanto, um exemplo claríssimo da doutrina que a Igreja sempre ensinou acerca da “vocação universal à santidade”: ele não se santificou pelos seus próprios esforços, mas pelo renovado abandono nas graças do Senhor, no recurso aos sacramentos e à intercessão de Maria, que transformaram o seu coração num autêntico manancial de caridade.

Carlo se santificou na defesa da fé da Igreja, na ajuda aos seus amigos, na sua doação generosa a todos os que necessitavam, e muitos se lembram dele como uma presença luminosa. Tratou-se de um verdadeiro “anjo de Deus”, que se recusou a ser uma fotocópia das coisas do mundo, para viver a originalidade da sua filiação divina. Daí a sua famosa frase: “Todos nascem originais, mas muitos morrem como fotocópias”. Ele havia aprendido a grande lição do cristianismo, a qual repetia insistentemente: “A tristeza é um olhar voltado para si mesmo; a felicidade é o olhar voltado para o céu”. Que o seu testemunho luminoso ajude-nos a ter esse mesmo olhar para o Céu.

Recomendações

  • Francesco Occhetta. Carlo Acutis: a vida além dos limites. São Paulo: Paulinas, 2018.
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