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Homilia Dominical
5 Set 2014 - 27:57

Ganhaste o teu irmão!

“Consideremos como filhos aqueles sobre quem tenhamos de exercer alguma autoridade. Ponhamo-nos quase ao seu serviço, como Jesus, que veio para obedecer e não para mandar, evitando o mínimo assomo de prepotência", ensina Dom Bosco.
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Homilia Dominical - 5 Set 2014 - 27:57

Ganhaste o teu irmão!

“Consideremos como filhos aqueles sobre quem tenhamos de exercer alguma autoridade. Ponhamo-nos quase ao seu serviço, como Jesus, que veio para obedecer e não para mandar, evitando o mínimo assomo de prepotência", ensina Dom Bosco.
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, segundo
Mateus (Mt 18, 15-20)

O Evangelho de hoje está no coração do “sermão eclesiástico”, no qual Nosso Senhor dá orientações especiais aos seus discípulos. Neste trecho, particularmente, é abordado o tema da “correção fraterna”, que, de acordo com a pedagogia do Salvador, se divide em três partes: primeiro, parte-se à correção “em particular”: “Se o teu irmão pecar contra ti [1], vai corrigi-lo, mas em particular, a sós contigo!”; depois, à correção reservada, na presença de testemunhas: “Se ele não te ouvir, toma contigo mais uma ou duas pessoas, para que toda a questão seja decidida sob a palavra de duas ou três testemunhas”; por fim, esgotadas essas alternativas, “se ele não vos der ouvido, dize-o à Igreja”.

Ao final de todo esse processo, se a pessoa se converte, diz Nosso Senhor, “tu ganhaste o teu irmão”. Se, ao contrário, ela não se corrigir, “seja tratado como um pagão ou um pecador público”: é o fundamento da prática da excomunhão, pela qual a Igreja, buscando o arrependimento e a mudança da pessoa, retira-a do convívio eclesial.

Importa compreender, em primeiro lugar, que a mensagem de Cristo não é a quem erra, senão a quem corrige. Semelhante é o procedimento descrito em uma famosa Circular Sobre os Castigos, atribuída a São João Bosco [2], fundador dos salesianos. Aí, o padre italiano ensina como castigar com fruto aqueles de quem se quer ganhar as almas.

Escreve Dom Bosco: “É mais cômodo para a nossa impaciência e para nossa soberba castigar os que nos resistem do que corrigi-los: suportando-os com benigna firmeza”. E ainda: “Segundo este sistema, são reprovadas as medidas coercitivas, às quais sempre e exclusivamente se devem preferir os meios da persuasão e da caridade”. Não se trata, todavia, de uma visão ingênua de educação. Dom Bosco está bem ciente de que “a natureza humana, demasiado propensa ao mal, tem por vezes de ser tratada com severidade”. No entanto, é preciso considerar que a propensão ao mal não está apenas nos alunos, mas também nos educadores. Por isso a importância de “evitar o uso irracional e injusto de repreensão ou do castigo” [3]. Diz ainda o santo, seguindo o roteiro de correção exposto por Nosso Senhor:

“A caridade que vos recomendo é a que usava São Paulo para com os fiéis recém-convertidos à Religião de Jesus Cristo, que muitas vezes o faziam chorar e lastimar-se quando via que não eram dóceis e não correspondiam ao seu zelo. Por isso, lembro a todos os diretores que se deve começar pela correção paternal, feita em particular, ou, como se costuma dizer, in camera charitatis.
Em público, nunca repreender ninguém a não ser para impedir ou reparar um escândalo.
Se depois da primeira admoestação não se notar melhoria alguma, é conveniente recorrer à mediação de outro superior que tenha sobre o culpado algum ascendente. E nunca nos esqueçamos de pedir as bênçãos, de Deus.
Quereria que o salesiano fosse como Moisés, na sua solicitude de aplacar o Senhor, justamente indignado contra Israel, seu povo escolhido.
Tenho verificado que raramente aproveita um castigo repentino e infligido antes de se empregarem outros meios. Não há nada, diz São Gregório, que melhor consiga render um coração, o qual se assemelha a uma cidadela inexpugnável, do que o afeto e a doçura; sede firmes, na prossecução do bem e em impedir o mal. Mas ao mesmo tempo sede mansos e prudentes. Sede perserverantes e bondosos, e Deus vos tornará senhores até dos corações menos dóceis.
Bem sei que esta perfeição não é fácil encontrá-la nos mestres e assistentes, sobretudo novatos. Estes não se resignam a adotar os processos mais consentâneos à índole dos alunos, preferindo a aplicação de castigos físicos, que nada resolvem, ou uma atitude de indiferença perante a disciplina.
Eis o motivo por que vemos muitas vezes alastrar o mal, e insinuar-se o descontentamento, mesmo entre os melhores, tornando-se nulo o resultado da correção.
(...)
E tive de me convencer que os professores mais intransigentes com os alunos são os menos severos para consigo mesmos.
Por conseguinte, se queremos saber mandar, temos primeiro de saber obedecer, procurando impor-nos mais com o amor do que com o temor.
Quando, porém, se tornarem necessárias medidas repressivas, e consequentemente a mudança de sistema, uma vez que certas índoles só com o rigor se podem dominar, cumpre fazê-lo de tal maneira que não apareça o mínimo sinal de paixão.” [4]

A esse propósito, Dom Bosco cita a conhecida anedota de Sócrates, que, dirigindo-se a um escravo com o qual não estava satisfeito, disse: “Se não estivesse irado, bater-te-ia” [5]. E continua:

“Consideremos como filhos aqueles sobre quem tenhamos de exercer alguma autoridade. Ponhamo-nos quase ao seu serviço, como Jesus, que veio para obedecer e não para mandar, evitando o mínimo assomo de prepotência.
Quanto mais inclinados nos sentirmos a dominá-los, tanto mais solícitos devemos ser em servi-los. Assim fazia Jesus com os seus Apóstolos, suportando-lhes a ignorância, a rudeza e a pouca fidelidade. Assim fazia com os pecadores, a quem tratava com tanta intimidade e carinho, que uns ficavam estupefatos, outros quase escandalizados, enquanto em muitos outros nascia a esperança de obterem o perdão de Deus. Por isso nos disse que aprendêssemos dEle a ser mansos e humildes de coração. Uma vez que são nossos filhos, evitemos toda a ira, quando tenhamos de castigar as suas faltas ou ao menos moderemo-la, de maneira que pareça inteiramente dominada.
(...)
Acho desnecessário deter-me a referir-vos aquele caso em que Deus quis dar uma lição mestra ao seu profeta Elias, que tinha um não sei quê de comum com algum de nós, no ardor pela causa de Deus, e no zelo inconsiderado em reprimir o alastrar dos escândalos na casa de Israel. Deixo aos vossos superiores a oportunidade de vo-lo referirem com todos os pormenores, como vem no Livro dos Reis. Eu contento-me com sublinhar nele a última frase, que tão bem enquadra ao nosso ver: Non in commotione Dominus (3 Rs 19, 11), e que Santa Teresa traduzia assim: ‘Nada te perturbe’.
O nosso querido e amável São Francisco de Sales, como sabeis, tinha-se imposto a regra severa de sua língua não proferir uma só palavra enquanto tivesse o coração agitado. Costumava dizer, de fato: Receio perder, num quarto de hora, a pouca doçura que, durante vinte anos, procurei entesourar, gota a gota, como orvalho, no vaso do meu coração. ‘Uma abelha emprega vários meses em fabricar um pouco de mel, que um homem engole, dum trago’.” [6]

Referências

  1. A expressão “contra ti”, neste versículo 15, não se encontra em muitos dos manuscritos originais (tanto que algumas edições críticas a trazem entre colchetes). É mais coerente, a propósito, que o texto se refira simplesmente ao pecado, não necessariamente “contra” alguém, já que todo pecado é repreensível, ainda que não atinja diretamente o próximo.
  2. Não se pretende, neste programa, discutir se a autoria dessa carta circular é realmente de São João Bosco, mas tão somente analisar o seu conteúdo.
  3. Circular Sobre os Castigos. In: A pedagogia de Dom Bosco em seus escritos, Editora Salesiana, p. 23-24
  4. Ibidem, p. 24-25
  5. Ibidem, p. 26
  6. Ibidem, p. 27-28

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