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Celebramos com grande alegria uma memória devocional que não está no atual calendário litúrgico, mas que esteve até 1965: a Festa dos Esponsais da Bem-Aventurada Virgem Maria com São José. É o casamento que gerou a Sagrada Família.

Naquela época, o casamento entre os judeus era celebrado em duas fases. Na primeira, em que já se celebrava o verdadeiro matrimônio, os esposos ainda não iam coabitar juntos. É importante destacar que já se tornavam realmente casados, não se tratava de um noivado como entendemos hoje em dia. Deste modo, a tradução litúrgica, que diz que o anjo foi enviado por Deus “a uma virgem, prometida em casamento a um homem chamado José” (cf. Lc 1,27) é imprecisa no termo “prometida em casamento”. Ora, Maria não era só prometida em casamento, ela era casada. Mas se optou por traduzir assim para evitar que as pessoas tomassem conclusões erradas, uma vez que para nós, hoje, quando se diz que a pessoa é casada, já está coabitando com seu cônjuge.

Naquela época, porém, havia estas duas fases: primeiro, os citados esponsais, quando os noivos casavam-se mas ainda não coabitavam; num segundo momento, havia a principal festa de casamento, quando o noivo era acompanhado em procissão por seus amigos até a casa da noiva, e lá ele então pegava a noiva e a trazia até a casa onde iriam morar. É assim que compreendemos melhor a Parábola das Dez Virgens  (Mt 25, 1-13), que fala sobre o esposo que demora e a diferença entre as virgens prudentes e as imprudentes, que não têm as lâmpadas acesas. Esta parábola refere-se a essa procissão matrimonial do esposo que finalmente vem buscar a esposa.

É importante destacarmos essas informações por um motivo crucial: para que saibamos que Jesus nasceu dentro de um casamento. Sabemos que Ele não nasceu da união de Maria e José. Afinal, Maria é sempre virgem — antes, durante e depois do parto — e José é seu castíssimo esposo — e não há coração mais casto, depois de Jesus e Maria, do que o da patriarca da Sagrada Família. No entanto, São José era de fato casado com Nossa Senhora.

Santo Tomás de Aquino nos recorda que os dois se casaram movidos pelo Espírito Santo. Isso quer dizer que não foi um casamento meramente humano, no sentido de ser apenas a união de duas pessoas “que se gostam”. Naturalmente, foi também um casamento humano no sentido pleno da palavra — ambos queriam se casar —, mas muito além de qualquer afinidade, Maria e José foram movidos por uma obediência sobrenatural a uma moção do Espírito Santo.

O mesmo Espírito Santo que impulsionou Maria e José ao legítimo casamento, também os motivou a fazerem um voto de virgindade antes de coabitarem. Então, o casamento aconteceu validamente, mas os dois não pretendiam consumá-lo. Isso estava claro em seus corações e transparece no diálogo de Nossa Senhora com o Anjo, que anuncia: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus.” (Lc 1,31). Ora, nenhuma mulher casada colocaria uma objeção ao anunciarem que ela conceberá e dará à luz um filho. Afinal, é o que naturalmente se espera. No entanto, não é esta a reação da Virgem Maria, que não ouve aquela notícia com naturalidade, e então pergunta: “Como acontecerá isso, se eu não conheço homem algum?” (Lc 1,34).

Podemos explicar o motivo do espanto de Maria Santíssima: a palavra “conhecer” é uma forma casta e pudica de falar sobre a relação sexual; é linguagem bíblica. No Antigo Testamento, vemos em Gênesis que “Adão conheceu Eva” e então nasceram Caim e Abel. Além disso, quando a Virgem Maria disse: “Eu não conheço homem”, ela não quis dizer “não conheço até agora”. Ora, assim seria fácil de solucionar: como era casada, não haveria objeção nenhuma para que conhecesse seu esposo. Este empecilho, portanto, só tem sentido se os dois tivessem um voto de castidade.

A Sagrada Tradição sempre reiterou com tranquilidade, ao longo dos séculos, estes dois pontos: a validade do casamento de Maria e José e seu mútuo voto de castidade. Algumas pessoas, querendo argumentar a favor da virgindade de Maria Santíssima, quiseram dizer que não era um casamento propriamente dito, mas uma espécie de noivado. Mas isso não faz sentido: Jesus foi concebido dentro de um casamento legítimo, uma vez que São José, ainda que não seja seu pai natural, é creditado como seu pai legítimo. Diante do povo, José é o pai davídico de Jesus. Havia uma antiga promessa de que o Messias seria descendente de Davi, e as genealogias de Jesus mostram isso: Davi gerou Salomão, que gerou outros descendentes e assim por diante, até chegar em Jacó, que gerou José, esposo de Maria, da qual nasceu o Messias. Esta genealogia sempre é registrada nas Sagradas Escrituras pelo ramo de São José.

É interessante notarmos e compreendermos essa realidade do matrimônio de Maria e José: casaram-se de verdade, mas não houve nenhum contato. Vale também destacar que, nas imagens tradicionais da Sagrada Família, São José não toca a Virgem Maria. Em algumas imagens modernas, alguns querem retratar São José abraçando Nossa Senhora. Ainda que a intenção seja devota, esta não é a tradição iconográfica. E há um motivo: na tradição do próprio povo judeu, o esposo não toca a esposa publicamente; e a mulher casada não toca homem algum, a não ser seu marido, privadamente. Estamos acostumados, em nossa cultura, a cumprimentarmos qualquer pessoa com um aperto de mão. Uma esposa judia tradicional, no entanto, não cumprimentaria um homem assim.

Nesse sentido, há uma outra tradição contígua, que provavelmente é verdadeira, que diz respeito ao fato de São José nunca ter tocado fisicamente Nossa Senhora — uma vez que uma mulher só tocava um homem depois que ia coabitar com seu marido. É por esse motivo que havia a cerimônia matrimonial na qual os noivos davam-se as mãos: este era o momento do primeiro toque entre os esposos.

Infelizmente, estamos acostumados hoje a ver namoros escandalosos; parece que namoro é sinônimo de “contato epitelial”: se você não estiver tocando a pessoa, não está namorando. Isso é uma estupidez. O namoro existe para que o casal conheça a alma um do outro.

Vamos então nos colocar diante dessa realidade do legítimo casamento de São José e de Nossa Senhora. Por que estamos enfatizando esta Festa? Por que esses Esponsais têm consequências espirituais tanto para São José quanto para nós. A maior união que existe entre dois seres humanos, neste mundo, chama-se matrimônio. Ora, São José casou-se verdadeiramente com Nossa Senhora, e nós sabemos que o matrimônio é um acontecimento espiritual, no qual os bens de um tornam-se os bens do outro.

Os bens espirituais de Nossa Senhora foram comunicados a São José e, por esta realidade, ele foi grandemente santificado. O matrimônio com a Virgem Maria foi para São José uma fonte de graças espirituais inenarráveis, porque sua alma estava intimamente ligada à da Virgem Maria. Deste modo, o fato de os dois estarem casados não é somente uma questão de legitimidade jurídica, mas também de comunicação espiritual.

Ainda que São José nunca tenha tocado Maria fisicamente, a verdade é que aquelas duas almas, unidas em matrimônio, comunicavam-se, vivendo o mesmo amor e a mesma graça, na mesma realidade sobrenatural. É por isso que os místicos, quando falam da nossa união com Deus, falam do matrimônio entre a nossa alma e Deus. Por causa dessa comunhão espiritual: uma união através da qual os bens do Divino Esposo se comunicam à esposa, que é a nossa alma.

Meus queridos, vejam que maravilha nós celebramos nos Esponsais da Virgem Maria e de São José. É uma festa mariana, mas sobretudo josefina, porque dali para frente este será o grande título de São José: Esposo da Bem-Aventurada Virgem Maria — como ele é mencionado em todas as festas e orações litúrgicas. E como foi aqui na terra, também lá no Céu Nossa Senhora segue tratando esse homem castíssimo, puríssimo, como seu legítimo esposo. 

Essa realidade espiritual da união de José e Maria deve ser para nós também um modelo, principalmente para os consagrados à Virgem Santíssima. Busquemos uma entrega como escravos de amor da Bem-Aventurada Virgem Maria, para progredirmos cada vez mais para um amor filial, até chegarmos àquele amor santíssimo, de união de almas, com o qual São José estava unido à Nossa Senhora. Por essa comunhão de almas, São José é o modelo dos devotos da Virgem Maria. Foi ele o primeiro que deu seu coração completamente a ela; e Maria também entregou a ele seu próprio coração. Que esse coração santíssimo e imaculado da Virgem, que ama a Deus sobre todas as coisas, venha também realizar em nós os frutos espirituais que desejamos receber.

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