Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 3,31-36)

Aquele que vem do alto está acima de todos. O que é da terra, pertence à terra e fala das coisas da terra. Aquele que vem do céu está acima de todos. Dá testemunho daquilo que viu e ouviu, mas ninguém aceita o seu testemunho. Quem aceita o seu testemunho atesta que Deus é verdadeiro. De fato, aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus, porque Deus lhe dá o espírito sem medida. O Pai ama o Filho e entregou tudo em sua mão. Aquele que acredita no Filho possui a vida eterna. Aquele, porém, que rejeita o Filho não verá a vida, pois a ira de Deus permanece sobre ele.

O Evangelho de hoje nos coloca diante de um grande mistério: aquele que não aceita Jesus, “a ira de Deus permanece sobre ele”. Mas se Deus é amor, como explicar essa passagem das Sagradas Escrituras? É importante recordar que Deus é amor, e, exatamente porque é amor, uma das formas de Ele manifestar que nos ama é pela ira.

É importante compreender que o amor não é somente beneplácito. Sim, quando uma pessoa aceita Jesus, está configurando sua vida à de Cristo. O Pai olha para tal pessoa e vê no coração dela, de cristão convertido, o seu Filho bem-amado, no qual colocou toda a sua complacência. Então, é claro que, quando Deus nos ama, no fundo Ele está amando ao seu Unigênito, Jesus Cristo. Somos amados por Deus exatamente porque acolhemos aquele que é o Amado de Deus e, assim, vamos nos configurando a Ele e nos tornando membros do seu Corpo.

Mas o que acontece quando cometemos um pecado? O pecado nos coloca em estado de inimizade. Você não nota isso, mas é uma das grandes verdades da alma humana. Quando Adão pecou no jardim — foi o pecado original —, Deus desceu na brisa da tarde para passear, mas Adão se escondeu porque começou a ver Deus como um inimigo. Todo ser humano em pecado mortal trata Deus como se Ele fosse um inimigo. 

Deus tenta nos atrair por vínculos humanos, tenta nos conduzir até si; mas nem todos os seus filhos ouvem seus apelos benevolentes, por isso existe uma última alternativa, a última tentativa de Deus: “Se não vai pelo amor, então vai pela dor”. Ou seja, Deus nos faz ver a consequência do pecado quando, ainda nesta vida, Ele começa a rasgar a cortina, o véu que encobre nossa miséria, Ele começa a mostrar nossa nudez, Ele começa a mostrar o que o nosso pecado fez conosco. Isso é a ira de Deus, um supremo e último ato de amor pelo qual Deus tenta reconduzir seus filhos de volta.

É como na parábola do filho pródigo. Deus foi um Pai amoroso e carinhoso com o filho a vida inteira; mas um dia o filho se rebela e começa a tratá-lo como um inimigo: ele sai de casa, gasta todos os bens com prostitutas e termina trabalhando como escravo para um patrão cruel. Finalmente, ele enxerga que está invejando a comida dos porcos — eis o momento da ira de Deus, momento em que finalmente se rasga o véu e a fantasia, poderíamos dizer, da nossa ilusão, e enxergamos nossa miséria.

Foi exatamente porque se encontrou num momento da verdade doída do pecado que o filho pródigo caiu em si e disse: “Vou voltar para a casa do meu pai”. Sim, Deus tentou mantê-lo em casa com seus afagos e carinhos, mas a rebeldia do filho o fez virar as costas ao Pai. Mas foi no momento mais baixo e mais deprimente da falta de conversão deste filho que a ira de Deus o fez voltar.

 Portanto, se você está sofrendo as consequências do seu pecado, saiba que o Deus de amor está convidando você a voltar à casa do Pai.