Este Domingo coincide com o dia 2 de agosto, no qual a Igreja, em sua misericórdia, concede a seus filhos a graça de uma indulgência especial. Trata-se do conhecido “perdão de Assis”, acontecido na região da Porciúncula, em 1216, pelo qual todos os fiéis que peregrinassem à igreja de Nossa Senhora dos Anjos receberiam a indulgência plenária.
Atualmente, como prevê o n. 65 do Manual das Indulgências, essa concessão permanece estendida a todas as igrejas paroquiais do mundo inteiro:
“Concede-se indulgência plenária ao fiel que com devoção visitar a igreja paroquial: (a) na festa do titular; (b) a 2 de agosto, em que ocorre a indulgência da ‘Porciúncula’.
Uma e outra indulgência poderão alcançar-se no dia acima marcado ou noutro dia determinado pelo ordinário para utilidade dos fiéis.
Gozam das mesmas indulgências a igreja catedral e, se houver, a concatedral, ainda que não sejam paroquiais, e também as igrejas quase-paroquiais (cf. cân. 516, 1).
Tais indulgências já estão incluídas na const. apost. Indulgentiarum Doctrina, norma 15; aqui se satisfaz aos desejos que neste intervalo se apresentaram à Sagrada Penitenciaria.
Na piedosa visita, conforme a norma 16 da mesma const. apost., ‘recitam-se a oração dominical e o símbolo dos apóstolos’ (Pai-nosso e Creio).” [1]
Vale lembrar que, para lucrar qualquer indulgência plenária, “além da repulsa de todo o afeto a qualquer pecado até venial, requerem-se a execução da obra enriquecida da indulgência e o cumprimento das três condições seguintes: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice” [2].
*
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 6, 24-35)
O diálogo entre Nosso Senhor e o povo, no Evangelho deste Domingo, parece-se muito com aquele travado por Cristo com Satanás, no deserto. De fato, assim como o tentador provoca Jesus, dizendo: “Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães” (Mt 4, 3), ou ainda, “joga-te daqui abaixo!” (Mt 4, 6), a multidão põe à prova o Divino Mestre: “Que sinal realizas – eles perguntam –, para que possamos ver e crer em ti? Que obra fazes?” (v. 30).
A isso o Senhor responde desmascarando as suas reais intenções: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos” (v. 26). Ou seja, a turba que seguia o Senhor não estava propriamente atrás d’Ele, mas do que Ele poderia oferecer a ela. Isso indica como as pessoas podem, em seu egoísmo, procurar Jesus de forma errada, preterindo “o Reino de Deus e a sua justiça” (Mt 6, 33) e se servindo da religião para cuidar de si e dos próprios negócios. Na expressão de Santo Agostinho, “os bons usam do mundo para gozarem de Deus; os maus, ao contrário, querem usar de Deus para gozarem do mundo” [3]. Pode ser que, de fato, muitas pessoas vão à igreja, rezem e comunguem, mas façam todas essas coisas pelos motivos errados, não procurando Jesus para servi-Lo, mas para se servirem d’Ele.
Como mudar essa disposição interior e preparar-se adequadamente para ir ao encontro do Senhor no Santíssimo Sacramento da Eucaristia?
Cabe considerar, antes de qualquer coisa, que quem Se oferece a todos os fiéis na mesa eucarística é o mesmo Jesus, em toda a Sua plenitude. Se algumas pessoas aproveitam mais a Comunhão que outras, a razão disso não deve ser procurada em Deus, senão na diferente disposição interior com que as pessoas O recebem. Na analogia do Doctor Mysticus:
“Se o raio de sol vier refletir-se sobre um vidro manchado ou embaciado, não poderá fazê-lo brilhar, nem o transformará em sua luz de modo total, como faria se o vidro estivesse limpo e isento de qualquer mancha; este só resplandecerá na proporção de sua pureza e limpidez. O defeito não é do raio, mas do vidro; porque, se o vidro estivesse perfeitamente límpido e puro, seria de tal modo iluminado e transformado pelo raio que pareceria o mesmo raio, e daria a mesma luz.” [4]
Ao limpar os vidros de nossas almas, a primeira coisa a ser feita é livrar-se das faltas mortais, as quais impedem a própria Comunhão sacramental (cf. 1 Cor 11, 27-29). Para atingir a perfeição, contudo, isso não é o suficiente. É compreensível que uma pessoa no início de sua caminhada eclesial se preocupe em combater os males maiores, não dando tanta atenção às pequenas coisas, mas de quem já está há mais tempo perto do Senhor é esperado um maior cuidado, por exemplo, em (i) evitar e desapegar-se dos pecados veniais – como a maledicência, o uso de palavras sujas e maliciosas, as pequenas vaidades e sensualidades etc. Quem não tiver esse cuidado – diz São João da Cruz – “inutilmente pretenderá chegar à perfeita união com Deus” [5].
Nesse processo de purificação, também é importante (ii) lutar contra as próprias imperfeições. Quem quer ser santo não se deve limitar a fazer o obrigatório, oferecendo ao Senhor apenas o seu “salário mínimo”. Para progredir na caridade, é preciso ir além, cumprindo as funções do próprio estado de vida com esmero e perfeição. Uma pessoa que assiste à Missa dominical inteira, por exemplo, está “em dia” com os mandamentos de Deus e da Igreja; se, além disso, ela se preocupa em chegar algum tempo antes à igreja, fazer oração e meditar com ardor e devoção o mistério que vai receber, a sua Comunhão certamente será diferente e produzirá mais frutos.
Mas, por que é necessária a meditação? Porque, como escreve Santo Tomás de Aquino, comentando a afirmação de Cristo: “Eu sou o pão da vida” (v. 35), “a palavra da sabedoria é o alimento especial da mente, pois esta é por ela sustentada” [6]. A devoção nada mais é que uma determinação da vontade de amar a servir a Deus. Ora, para que a vontade se determine, é preciso que a auxilie a inteligência – cujo objeto próprio é a verdade divina. Alimentado pela Palavra, então, o entendimento age sobre a vontade, que se propõe à caridade.
Um bom guia de meditação para receber a Sagrada Eucaristia é o opúsculo Mensis Eucharisticus (“Mês Eucarístico”), o qual propõe três etapas para uma oração frutuosa, i.e., considerar:
- Quis venit? (Quem vem?)
- Ad quem venit? (A quem vem?)
- Ad quid venit? (Para quê vem?)
Primeiro, é preciso meditar a respeito de Quem está na Santíssima Eucaristia. A cada dia, o livreto de meditação propõe um aspecto da pessoa de Jesus: um dia, a Sua realeza; em outro, o Seu magistério; noutro, a Sua amizade etc., pois é só considerando a grandeza e a majestade d’Aquele que vem que se pode comungar com fruto. Como canta o Doutor Angélico em seu Adoro te devote, “in cruce latébat sola Déitas, / at hic latet simul et humánitas – na Cruz estava oculta só a divindade, / mas aqui se esconde também a humanidade”. Por isso, esse Divino Sacramento exige a virtude da fé.
Segundo, importa que quem vai comungar considere a si mesmo e a sua miséria, pondo em prática a virtude da humildade, como Maria Santíssima, que, diante de Deus, não se reconhecia senão como escrava: “Ecce ancilla Domini, fiat mihi secundum verbum tuum – Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38).
Terceiro, vale meditar a obra de justificação que Deus quer realizar em quem O recebe, exercitando a virtude da confiança. Deus vem aos homens para perdoar as suas dívidas, curar a sua cegueira e surdez, firmar uma relação de amizade com eles etc.
Em resumo, para comungar bem, é preciso ter fome e sede do Santíssimo Sacramento, pois, como conclui o Evangelho, “quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede” (v. 35). O jejum eucarístico pedido pela Igreja para comungar procura despertar nas pessoas justamente essa fome física, a qual, por sua vez, aponta para a sede espiritual que todos devem ter para receber com ardor a Santa Comunhão.
Comentários
Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.