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Texto do episódio
01

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 24,37-44)

Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: “A vinda do Filho do Homem será como no tempo de Noé. Pois nos dias, antes do dilúvio, todos comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. E eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e arrastou a todos. Assim acontecerá também na vinda do Filho do Homem. Dois homens estarão trabalhando no campo: um será levado e o outro será deixado. Duas mulheres estarão moendo no moinho: uma será levada e a outra será deixada. Portanto, ficai atentos, porque não sabeis em que dia virá o Senhor. Compreendei bem isto: se o dono da casa soubesse a que horas viria o ladrão, certamente vigiaria e não deixaria que a sua casa fosse arrombada. Por isso, também vós ficai preparados! Porque, na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá”.

 * * *

Iniciamos um novo ano litúrgico. Isso pode parecer estranho porque não começa um novo ano no calendário civil; mas no ano litúrgico, sim. É o 1.º Domingo do Advento, início do ano litúrgico, quando começamos a preparação para a vinda do Senhor no Natal. Por isso, o tema da liturgia nestes tempos é exatamente a vinda do Senhor. O Tempo do Advento é um tempo de fazer penitência, de preparar-se, de limpar a casa, de aplainar os caminhos do Senhor, para que o coração esteja pronto para receber Jesus.

Como, porém, Jesus vem a nossas vidas? A primeira parte do Tempo do Advento fala sobretudo da vinda de Jesus no Fim dos Tempos, ou seja, no fim deste mundo que passa. Trata-se do Juízo Universal, e é exatamente sobre isso que iremos refletir. Esse é um ponto do Catecismo do qual pouco se fala, antes de tudo, porque está na moda pensar em Deus como “irmão”, “companheiro”, amigo misericordioso… Sim, tudo isso é verdade, Ele o é de fato: fez-se amigo, fez-se companheiro, fez-se irmão, Jesus porém virá como Juiz. O tempo que estamos vivendo agora é de misericórdia, e irá encerrar-se quando Ele vier julgar os vivos e os mortos, inaugurando assim o tempo da justiça.

Há quem veja nisso uma grande contradição com a Boa-Nova, com o Evangelho cristão. Como pode ser possível um “Deus justiceiro”? Afinal, Deus não tem de ser só misericórdia? Há nisso uma falácia, ou seja, um raciocínio falso, que não funciona, pois o contrário da justiça não é a misericórdia, mas a injustiça. Dizer que Deus não fará justiça é dizer que Deus fará injustiça. Ora, é revoltante pensar que Deus fará injustiça eternamente. Não, Deus não fará injustiça, Deus fará justiça.

Por outro lado, o contrário da misericórdia não é a justiça, mas o ódio, isto é, a falta de amor. Mas Deus não é um Deus de ódio, de falta de amor: Ele é misericordioso e manifesta o seu amor eterno de várias formas. No tempo deste mundo, manifesta-o tendo paciência conosco, para que possamos ir aos poucos mudando de vida até que finalmente nos determinemos: Chega de viver uma vida cristã insuficiente. Mudemos agora. É Advento, tempo de conversão, e, portanto, o tempo da graça. O tempo que temos é o de nossa vida; e o Advento reflete exatamente isso. Essas quatro semanas do Advento simbolizam o tempo que Deus nos dá e que nós temos à nossa disposição para nos decidirmos: “Deus virá, então vou mudar de vida, vou dar um jeito na minha sem-vergonhice, vou me converter”. Sim, Deus virá para julgar os vivos e os mortos, e o seu reino não terá fim. Será um reino de justiça e de amor, e a justiça e o amor irão dar as mãos. Não haverá oposição entre elas, porque são duas perfeições que vivem juntas em Deus e assim viverão em nós também.

Agora vivemos o tempo da paciência. É o Tempo do Advento, ou seja, o tempo desta nossa vida, não interessa quanto dela ainda nos reste. Pode ser que hoje seja o nosso último dia de vida, pode ser que vivamos ainda mais cinquenta anos… Pouco importa. O tempo de sua vida é o Tempo do Advento e o dia da sua morte, o dia do juízo. Pronto: passou o tempo da paciência divina, agora é hora de prestar contas ao justo Juiz. Ora, assim como, para a vida de cada qual, há um tempo de paciência e um tempo de juízo, assim também para a humanidade. Lembrar-se disso é sumamente importante, sumamente necessário.

Olhemos para a história da humanidade. Quantas vezes os maus já foram glorificados nesse mundo! Tomemos, por exemplo, filósofos que sustentaram uma doutrina errônea, completamente torta, que levaram pessoas à perdição, e no entanto são tidos e havidos como “grandes” filósofos, “gênios” da humanidade. Que desastre na vida dos outros não fez um pensador como Freud, que “aboliu” a moral sexual! Quantas pessoas já não se desviaram do caminho do amor e da fidelidade por um pensador como este! Ou mesmo como Immanuel Kant, tido como pai das luzes, homem ilustrado, sábio, etc., mas que condenou os filósofos dos últimos séculos a pensar que é impossível conhecer a verdade. De Kant para cá vimos de abismo em abismo, sem que ninguém mais busque a verdade: de Kant passamos a Hegel, de Hegel passamos a Marx, de Marx à bandalheira que se instalou hoje. E todos são tidos como gênios da humanidade!… 

Jesus virá para fazer justiça, e grande será a vergonha dos que foram glorificados injustamente durante a história da humanidade. Esses homens, de forma injusta, foram tidos como grandes gênios e benfeitores da humanidade, quando, em verdade, levaram milhões de almas para o inferno por suas ideias, erros e falácias. Ora, não é justo, então, que eles sejam publicamente envergonhados? Não é justo que o sejam ao menos suas doutrinas?

Pode ser que algum deles, pelo milagre de uma contrição perfeita na hora da morte, se tenha salvo e ido para o Céu. Quem somos nós para sabê-lo? Não se trata aqui de tomar o lugar de Deus e julgar pessoas, mas podemos, sim, julgar doutrinas erradas, e se estas foram glorificadas pelo mundo, levando almas à perdição, é justo que, no Juízo Final, sejam expostas à vergonha pública.

Enquanto isso, doutores como Santo Tomás de Aquino, Santo Afonso M.ª de Ligório, São João da Cruz, Santa Teresa d’Ávila, Santa Teresinha, santos e sábios que, diante de Deus, levaram milhões de almas para o Céu, são hoje desprezados pelo mundo moderno, e não somente por ele: também pelo mundo mundano, isto é, pelo mundo de todos, pelos tempos que não aceitam a verdade de Deus nem a doutrina divina. Aqui está a tragédia.

Mas os santos e sábios serão exaltados no Juízo Final; tudo o que foi obra divina, desprezada pelos homens, escondida e não glorificada, será glorificada no último dia. Então, veremos santos escondidos, que fizeram um bem imenso, contribuíram para o triunfo da Igreja, mas de forma oculta, sem que os notassem. Esses serão glorificados e exaltados, os santos anônimos, pessoas que morreram escondidas em mosteiros, pessoas de que nunca tivemos notícia, nem sequer de que existissem! É justo que essas pessoas, que viveram uma vida gloriosa e bendita, sejam exaltadas no Juízo Final. Por quê? Porque se elas foram injustiçadas e publicamente esquecidas, é justo que Deus as exalte publicamente.

O Juízo Final é algo sobre o qual todos deviam meditar e os pregadores ensinar. Por quê? Porque, como diz o Catecismo Romano, promulgado pelo Concílio de Trento e escrito para os párocos, a Igreja aconselha os que têm cuidados de almas a pregar sobre o Juízo Final, porque todos os justos, a certa altura da vida, se sentem “em crise”, por verem a maldade e a vileza exaltadas, enquanto a justiça e a bondade são vistas com desprezo. Isso gera revolta no coração, isso desanima: a maldade é exaltada, a maldade é que ganha, “leva a melhor”, triunfando... Se isso não é desanimador, que nome lhe daremos?

É necessário, pois, pregar a verdade: Deus virá para julgar os vivos e os mortos, e o seu reino não terá fim. Ou seja, todo aquele que, fielmente, ainda que de forma escondida, houver derramado lágrimas de fidelidade por amor a Deus será publicamente exaltado diante de toda a humanidade redimida. Então se cantará a glória do Cordeiro, a glória de Jesus Cristo. Uma multidão, como diz o Apocalipse, incontável, inumerável, irá cantar o grande Aleluia, a grande vitória e o triunfo final — triunfo do bem, o triunfo da bondade, o triunfo da verdade, o triunfo da misericórdia!

Sim, o triunfo da misericórdia precisa ser glorificado; sim, a misericórdia precisa ser glorificada. Se cremos na misericórdia, também ela deve ser exaltada. Quantos misericordiosos não alcançaram misericórdia neste mundo, mas hão de alcançá-la no Juízo Final e serão glorificados! “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça porque serão saciados” (Mt 5, 6). Mas, quando serão saciados? Quando será saciada essa fome e sede de justiça? No Juízo Final, quando veremos a vitória, o triunfo de Deus. Essa é a realidade sobre a qual estamos refletindo e queremos meditar neste Tempo do Advento.

O Tempo do Advento tem início falando da segunda vinda de Cristo, da parousía; ora, falar da segunda vinda é falar do Juízo Final. Cristo virá, e como vai acontecer o Fim dos Tempos? Haverá uma grande tribulação da Igreja, que será perseguida tremendamente; haverá um abalo cósmico neste mundo passageiro, e então Ele virá. As duas coisas vão acontecer, ou seja, haverá a grande tribulação e, logo em seguida, o abalo cósmico: “Os homens vão desmaiar de medo só em pensar no que vai acontecer ao mundo” (Lc 21, 26). Ora, quem é que vai desmaiar de medo? Quem pôs suas esperanças no mundo. É evidente: se colocamos nossas esperanças no mundo e vemos que o mundo inteiro está a desabar, iremos desmaiar de medo.

Mas se colocamos nossas esperanças em Jesus Cristo, o que vai acontecer? “Ele virá sobre as nuvens e, quando essas coisas começarem a acontecer, levantai e erguei a cabeça porque a vossa libertação está próxima” (Lc 21, 28). Não poderia ser maior o contraste nem maior o antagonismo entre o medo dos que põem suas esperanças no mundo e a grande consolação dos que as puseram em Jesus. As cabeças se erguerão, e verão a libertação os que colocaram suas esperanças em Jesus!

Então se dará a realidade maravilhosa e tremenda que é a vinda de Jesus, que se sentará para julgar. Haverá, pois, um juízo, e todos os seres humanos, de toda a história, serão colocados diante do juízo de Deus. Pois bem, como os homens julgam a história? Julgam-na de forma linear: “Aconteceu isso, depois aquilo, depois aconteceu aquilo outro. Tal período foi assim, o outro período foi assado…”. Mas o julgamento da história, o julgamento final, será diferente; não será um julgamento horizontal, linear, mas vertical. Cada pequeno ponto da história será julgado na sua relação vertical com a eternidade e com o céu. Tudo será levado em conta e lido à luz dessa realidade superior e eterna. Cristo virá julgar os vivos e os mortos, quer dizer, a história inteira, não somente quem estiver vivo quando de sua volta.

Não sabemos quando isso vai acontecer, não temos data, e faz dois mil anos que a Igreja espera esse dia. Ele virá, sim; mas quando? Daqui dois mil anos ou daqui dois mil segundos? Ninguém sabe. Seja como for, acontecerá o julgamento. Cada momento exato de nossas vidas será julgado diante da eternidade. Trata-se, porém, de uma coisa muito concreta.

Aqui já podemos começar a amarrar as coisas e levá-las para o dia a dia, para levar ao nosso Advento. Como, afinal, devemos vivê-lo? Todos os momentos da vida devem ser julgados sob a luz da eternidade, sub specie aeternitatis. É preciso, então, parar e perguntar-se: “Que estou fazendo agora? Eu estou cansado, mas estou amando a Deus apesar do cansaço?” Isso deve ser julgado em função da eternidade. “Eu estou desanimado e não quero amar a Deus”. Também deve ser julgado em função da eternidade. Seja saúde ou doença, seja pobreza ou riqueza, tudo deve ser julgado debaixo da luz da eternidade.

Assim, tudo adquire um novo sabor, uma nova realidade. Isso é o que importa, é o critério para viver esse Tempo do Advento. O Advento é um ensaio para o juízo, seja para o particular, com a morte de cada um, seja para o Juízo universal, com a vinda de Cristo. Para o primeiro, o que podemos fazer? Na prática, todos os dias antes de dormir, façamos um exame de consciência, como se fosse nosso último dia de vida, como se não fôssemos acordar amanhã. Por quê? Porque não sabemos se será ou não o último dia! Façamos já o nosso “juízo final” todos os dias. Há mais, porém. Quando andarmos pelas ruas, quando ouvirmos o noticiário, quando virmos o que está acontecendo no mundo, quando estudarmos as páginas da história, olhemos para o Juízo universal de Jesus, olhemos tudo sob a luz da eternidade, debaixo do olhar do Senhor: os que hoje saem vitoriosos serão derrotados e perdedores, e os que hoje são derrotados serão vitoriosos e gloriosos. Isso nos deve encher de alegria! Os que hoje riem e rejubilam poderão estar chorando, envergonhados em sua confusão, enquanto os que agora permanecem firmes no amor ao Senhor irão colher os frutos da recompensa, da santa recompensa que Deus tem para cada um deles.

É preciso estar atentos, ter vigilância, ter um olhar a que chamamos aqui “julgamento”, isto é, pôr tudo debaixo da eternidade, sejam atos pessoais por causa do seu juízo particular, seja os acontecimentos da história por causa do Juízo universal. Estejamos atentos, olhando para as coisas com um olhar diferente, com olhar vigilante, com um olhar de Deus.

Rezemos e peçamos a Deus a graça de não perder o foco. Orai a todo momento! Por quê? Porque pretendemos estar de pé diante do Filho do Homem. Ora, o que significa “estar de pé” diante dele? Durante o juízo, o réu ouve a sentença de pé diante do juiz: este fica sentado para julgar, mas o réu fica de pé. Cristo virá julgar-nos, e nós estaremos de pé diante dele. Com que olhar de misericórdia Ele olhará para nós! Com que amor irá dizer-nos “Vinde, benditos de meu Pai, vinde para o Reino preparado para vós, que fostes desprezados, que fostes deixados de lado, que fostes injustiçados! Vinde, vinde, benditos, vinde todos vós para o Reino preparado!”

Então, será grande a nossa alegria, enquanto tudo o que foi somente vitória aparente deste mundo que passa, miséria de um mundo falso e sem consistência, tudo isso será jogado no fogo eterno, e grande será a sua confusão. Que vivamos esse santo Advento debaixo do olhar da eternidade, vigiando e orando sem cessar.

 

COMENTÁRIO

Tempo da parusia (vv. 36-41). — Pode-se determinar o tempo do excídio judaico, mas o não o da parusia (gr. παρουσία); este, além do mais, virá de repente, como que de assalto (cf. v. 37ss).

V. 36 (cf. Mc 13,32). — O tempo da parusia é de todo desconhecido: Quanto àquele dia e àquela hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu… Em Mc se lê: nem os anjos . . . nem o Filho. A lição mais provável de Mt também traz οὐδὲ ὁ υἱός. Este v., que já deu azo a muitas discussões, é consoante a At 1,7 e a Mt 20,23. Jesus indica que ele, ‘não só como homem, mas também como Deus, ignora de certo modo o dia do juízo, não porque o ignore de fato, mas porque sabê-lo não é ofício seu; assim como não disse: para quem está reservado por mim, mas: por meu Pai, não porque não esteja reservado também por ele, mas porque reservar o reino, i.e., predestinar, não é ofício dele, mas do Pai’ (Maldonado [Mogúncia, 1624], I 496a). — É a interpretação corrente [1], calcada no princípio de apropriação, segundo o qual um mesmo atributo ou operação comum às três hipóstase divinas predica-se de uma delas não exclusiva mas principalmente ou ϰατ’ εξοχήν, como forma de manifestar a distinção real entre elas (cf. Tomás de Aquino, STh I 39, 7c.).

Nota I: Jesus Cristo conhece, por seu intelecto divino, absolutamente todas as coisas, com a mesma ciência omnicompreensiva que é comum às três pessoas da Santíssima Trindade, e, por seu intelecto humano, todas as coisas que podem ser conhecidas pela potência intelectiva humana, o que exclui nele toda classe de ignorância. É, pois, inegável que Ele sabia o dia e a hora em que se daria o fim dos tempos. A razão por que afirma não sabê-lo em Mt 24,36 é que a revelação deste dado não era parte de sua missão como enviado do Pai aos homens: “Nem, com efeito, sabe o Pai algo que não saiba o Filho, pois a ciência do Pai é sua própria Sabedoria; ora, sua Sabedoria é seu Filho, seu Verbo. E porque não convinha sabermos <tudo> o que Ele, que viera nos ensinar, realmente sabia, . . . foi mestre não só em nos ensinar algumas coisas, mas em não nos ensinar outras. Sendo mestre, sabia tanto ensinar o que convinha como não ensinar o que não convinha” (Agostinho, Serm. 1 in Ps. 36, n. 1: ML 36,355). Daí dizerem alguns teólogos que o Senhor não o sabia com ciência comunicável; de fato, um mensageiro, mesmo que saiba tudo o que sabe quem o enviou, só está autorizado a comunicar a mensagem que lhe foi confiada, e não todos os segredos do emitente.

V. 37ss (cf. Lc 17,26s). — Não só não se sabe quando será a consumação do mundo, senão que ela tomará a muitos de surpresa, como atestam as Escrituras acerca do dilúvio universal. Com efeito, assim como os homens de então viviam ocupados em assuntos ordinários até o dia em que Noé entrou na arca, i.e., sem reconhecer o perigo iminente, e então chegou o dilúvio e fez morrer todos eles; assim também o advento do Filho de homem encontrará a todos despreparados.

Lc acrescenta: Lembrai-vos da mulher de Ló (17,32s), que pereceu porque olhou para trás, i.e., lembrai-vos deste caso, para que não vos aconteça o que aconteceu com ela, que, voltando o rosto para Sodoma em chamas, contra o que lhe tinha mandado o anjo, converteu-se em estátua de sal. Que vós, portanto, não contrarieis minha doutrina e estes meus preceitos, voltando aos costumes mundanos deste século, para que não pereçais junto com ele no dia da conflagração. “Que significa a mulher de Ló? Os que, na tribulação, olham para trás e se afastam da esperança na promessa divina. Por isso tornou-se ela estátua de sal, como que advertindo os homens a não agirem igual e temperando-lhes coração para não serem insossos” (Agostinho, Quæst. Evang. 43: ML 35,1357).

V. 40 (cf. Lc 17,34s). — Além disso, no tempo da parusia, não se há de separar aos eleitos dos réprobos senão no instante mesmo do juízo, nem estará na proximidade de lugar ou de tempo a igualdade de destinos, senão que, mesmo entre os mais próximos (dois no campo, na cama, a moer juntos [2]), será diversa a sorte de uns e de outros. É evidente que esta diversidade de fins deve-se à disposição interna de cada um.

Nota II: Nesta noite… Disto inferem alguns que o juízo universal terá lugar à noite, para maior terror dos homens. No entanto, o mesmo que o v. 31 chama dia é aqui chamado noite: 1) primeiro, porque o dia do juízo será para muitos, i.e., para todos os réprobos, fatal e calamitoso, e a noite e a escuridão são símbolos quase naturais de confusão, desconcerto etc.; 2) segundo, porque assim a noite dá fim ao dia e ao tempo de trabalho, assim também o último dia dará fim ao tempo de agir bem e merecer, segundo aquilo: Vem a noite, quando ninguém pode trabalhar (Jo 9,4). É adequado, portanto, chamar noite ao dia do juízo.

Notas

  1. À luz de At 1,7, também se pode interpretar assim a passagem: ‘Determinar a hora em que o mundo há de ser consumado e os homens, chamados a juízo não compete aos anjos, nem mesmo ao Filho, mas ao Pai. O Pai, com efeito, pôs isso em seu poder, i.e., reservou-o para si; ao Pai é próprio sujeitar tudo a Cristo e pôr todos os seus inimigos sob os pés dele, para que o próprio Filho se sujeite àquele que lhe sujeitou todas as coisas, a fim de ser Deus tudo em todos’ (cf. 1Cor 15,25-28).
  2. Duas mulheres estarão moendo juntas. No Oriente, moinhos grandes eram pouco frequentes. O trabalho de moer grãos costumava confiar-se às mulheres, que os trituravam manualmente em moinhos compostos de duas pedras, uma plana e outra redonda.
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