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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas (Lc 3,1-6)

No décimo quinto ano do império de Tibério César, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes administrava a Galileia, seu irmão Filipe, as regiões da Itureia e Traconítide, e Lisânias a Abilene; quando Anás e Caifás eram sumos sacerdotes, foi então que a palavra de Deus foi dirigida a João, o filho de Zacarias, no deserto.

E ele percorreu toda a região do Jordão, pregando um batismo de conversão para o perdão dos pecados, como está escrito no Livro das palavras do profeta Isaías: “Esta é a voz daquele que grita no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas. Todo vale será aterrado, toda montanha e colina serão rebaixadas; as passagens tortuosas ficarão retas e os caminhos acidentados serão aplainados. E todas as pessoas verão a salvação de Deus’”. 

Comentário exegético

O múnus do Precursor (cf. Mt 3,3s; Mc 1,2s). — Todos os três evangelistas (e depois Jo, cf. 1,23) aplicam ao Precursor a passagem de Isaías (40,3): Uma voz do que grita no deserto: Preparai o caminho do Senhor, aplanai as suas veredas; Lc, do mesmo profeta, acrescenta (40,4): Todo vale será alteado etc., enquanto Mc o faz preceder de uma citação de Malaquias (3,1): Eis que mando o meu anjo diante de tua face etc., embora o atribua a Isaías (por denominação a potiore). Com isto apresentam João Batista como enviado (ἄγγελος) e precursor (diante de tua face) de Cristo (no texto profético, de Javé) para lhe preparar os caminhos (cf. Lc 1,76).

a) Sentido literal-histórico. — Isaías, na passagem citada, anuncia em nome de Deus (cf. 40,1) a libertação do cativeiro babilônico e o retorno dos judeus à Terra Santa para restaurar o reino teocrático. É Javé mesmo quem conduz o cortejo dos libertos, indo à frente deles para lhes abrir caminho (cf. Mq 2,13). Numa belíssima imagem, introduz o profeta a figura de um emissário real, que com voz forte manda os israelitas preparar no deserto, por onde se supõe que passará Javé, caminhos fáceis e dignos de tão ilustre comandante. O próprio vate esclarece o que se há de fazer (cf. 40,4): altear vales, rebaixar montes e colinas, endireitar e aplainar veredas, costumes típicos no Oriente, onde, antes de os reis voltarem ao reino ou chegarem a alguma cidade, se enviava um funcionário público encarregado de ordenar aos súditos ou moradores a restauração de vias e estradas, deixadas muita vez em condições precárias. — A principal recompensa de tantos trabalhos será a presença mesma do rei (cf. Is 40,10).

b) Sentido espiritual-profético. — Os sinóticos aplicam tudo isso à nova libertação, i.e. à salvação messiânica, em virtude da qual todos os homens, não só os judeus, se verão livres do mais grave cativeiro, o do pecado e da morte eterna. Esta libertação já começou. João Batista, com efeito, desempenha em sentido (espiritual) superior a função que teve outrora aquela voz na recondução dos cativos: é ele o emissário e o precônio do Deus (do Messias?) que se aproxima. Do deserto, clama ao povo de Israel para que preparem as veredas, aplainando-as devidamente: Todo vale será alteado (fut. pelo imp., ao modo hebr.), toda montanha e toda colina serão (= sejam) rebaixadas. Trata-se de locuções hiperbólicas, assim como as seguintes: E serão (= sejam) os caminhos errados (i.e. desviados, tortos, oblíquos etc.) endireitados, e os ásperos, i.e. os lugares escabrosos e aclives aplainados. Toda esta metáfora deve entender-se em sentido espiritual. Na mente do evangelista, significa fundamentalmente isso: deve-se aplainar a vereda dos corações para o Messias que vem, i.e. devem-se libertar as mentes e os corações de qualquer impedimento (e.g. pecados, vícios, maus afetos etc.), para que nada impeça ou torne menos fácil (frutuosa) a ação do Messias ao neles entrar; numa palavra, para que Cristo encontre uma plebe preparada (Lc 1,17), i.e. um povo espiritualmente bem disposto. — E verá toda carne (= todo homem, por sinédoque: a parte pelo todo) o salutar de Deus (1), i.e. todos contemplarão como Deus há de operar a salvação de seu povo; ou, subjetivamente: todos hão de experimentá-la, i.e. tornar-se partícipes dela, se o quiserem (‘ver e provar’, como em 2,26; cf. At 2,27.31 etc.), onde se sublinha a universalidade da salvação messiânica.

NB — Buscar minuciosamente o sentido espiritual de cada loução (a montanha será rebaixada, o vale será alteado, os caminhos errados e ásperos etc.), embora se possa admitir num sermão, seria já excessivo em exegese.

Referências

  1. Cf. M. Hagen (ed.), Lexicon Biblicum. Paris: P. Lethielleux, 1905, vol. 1, col. 775: ‘O vocábulo carne é usado em diferentes acepções na Sagrada Escritura. Toda carne . . . diz-se ora de todos os viventes, ora do gênero humano (cf. e.g. Gn 6,12-19; 7,21; 8,17; Rm 3,20; Gl 2,16). Além disso, usa-se especialmente para significar o homem enquanto afetado pelas várias paixões que sente em seu corpo. Assim, diz-se que a carne exulta, refloresce, enche-se de temor, não tem nenhum descanso etc. (cf. e.g. Sl 27,7; 83,3; 118,120; 2Cor 7,5). Ou é empregado para designar a natureza humana (cf. Rm 1,3; 9,5) . . . A este uso assemelha-se outro, em que o termo é aplicado ao homem do ponto de vista de sua fraqueza, debilidade . . . (cf. Sl 55,5; Eclo 28,5; Jr 17,5)’.
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