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Cruz de Cristo: o encontro da misericórdia e da justiça

Ao olharmos para a Cruz de Cristo, o que vemos é um grande fracasso. No entanto, a Igreja, movida pela fé da Virgem Maria, exclama em alta voz: “Vitória, tu reinarás! Ó Cruz, tu nos salvarás!” Por trás da aparente derrota de Nosso Senhor, está a sua vitória sobre Satanás e o pecado.

Texto do episódio
750

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
(Mc 15, 1-39)

Narrador 1: Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo segundo Marcos:
Logo pela manhã, os sumos sacerdotes, com os anciãos, os mestres da Lei e todo o Sinédrio, reuniram-se e tomaram uma decisão. Levaram Jesus amarrado e o entregaram a Pilatos. 2E Pilatos o interrogou:
Leitor 1: “Tu és o rei dos judeus?”
Narrador 1: Jesus respondeu:
— “Tu o dizes”.
Narrador 1: E os sumos sacerdotes faziam muitas acusações contra Jesus. Pilatos o interrogou novamente:
Leitor 1: “Nada tens a responder? Vê de quanta coisa te acusam!”
Narrador 1: Mas Jesus não respondeu mais nada, de modo que Pilatos ficou admirado. Por ocasião da Páscoa, Pilatos soltava o prisioneiro que eles pedissem. Havia então um preso, chamado Barrabás, entre os bandidos, que, numa revolta, tinha cometido um assassinato. A multidão subiu a Pilatos e começou a pedir que ele fizesse como era costume. Pilatos perguntou:
Leitor 1: “Vós quereis que eu solte o rei dos judeus?”
Narrador 2: Ele bem sabia que os sumos sacerdotes haviam entregado Jesus por inveja. Porém, os sumos sacerdotes instigaram a multidão para que Pilatos lhes soltasse Barrabás. Pilatos perguntou de novo:
Leitor 1: “Que quereis então que eu faça com o rei dos judeus?”
Narrador 2: Mas eles tornaram a gritar:
— Crucifica-o!
Narrador 2: Pilatos perguntou:
Leitor 1: “Mas, que mal ele fez?”
Narrador 2: Eles, porém, gritaram com mais força:
— Crucifica-o!
Narrador 2: Pilatos, querendo satisfazer a multidão, soltou Barrabás, mandou flagelar Jesus e o entregou para ser crucificado. Então os soldados o levaram para dentro do palácio, isto é, o pretório, e convocaram toda a tropa. Vestiram Jesus com um manto vermelho, teceram uma coroa de espinhos e a puseram em sua cabeça. E começaram a saudá-lo:
— “Salve, rei dos judeus!”
Narrador 1: Batiam-lhe na cabeça com uma vara. Cuspiam nele e, dobrando os joelhos, prostravam-se diante dele. Depois de zombarem de Jesus, tiraram-lhe o manto vermelho, vestiram-no de novo com suas próprias roupas e o levaram para fora, a fim de crucificá-lo.
Narrador 2: Os soldados obrigaram um certo Simão de Cirene, pai de Alexandre e Rufo, que voltava do campo, a carregar a cruz. Levaram Jesus para o lugar chamado Gólgota, que quer dizer “Calvário”. Deram-lhe vinho misturado com mirra, mas ele não o tomou. Então o crucificaram e repartiram as suas roupas, tirando a sorte, para ver que parte caberia a cada um.
Narrador 1: Eram nove horas da manhã quando o crucificaram. E ali estava uma inscrição com o motivo de sua condenação: “O Rei dos Judeus”. Com Jesus foram crucificados dois ladrões, um à direita e outro à esquerda. Os que por ali passavam o insultavam, balançando a cabeça e dizendo:
— “Ah! Tu, que destróis o Templo e o reconstróis em três dias, salva-te a ti mesmo, descendo da cruz!”
Narrador 1: Do mesmo modo, os sumos sacerdotes, com os mestres da Lei, zombavam entre si, dizendo:
— “A outros salvou, a si mesmo não pode salvar!” O Messias, o rei de Israel... que desça agora da cruz, para que vejamos e acreditemos!”
Narrador 2: Os que foram crucificados com ele também o insultavam. Quando chegou o meio-dia, houve escuridão sobre toda a terra, até as três horas da tarde. Pelas três da tarde, Jesus gritou com voz forte:
— “Eloi, Eloi, lamá sabactâni?”
Narrador 2: Que quer dizer:
— “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”
Narrador 2: Alguns dos que estavam ali perto, ouvindo-o, disseram:
— “Vejam, ele está chamando Elias!”
Narrador 2: Alguém correu e embebeu uma esponja em vinagre, colocou-a na ponta de uma vara e lhe deu de beber, dizendo:
— “Deixai! Vamos ver se Elias vem tirá-lo da cruz”.
Narrador 1: Então Jesus deu um forte grito e expirou. (Todos se ajoelham um instante) Nesse momento, a cortina do santuário rasgou-se de alto a baixo, em duas partes. Quando o oficial do exército, que estava bem em frente dele, viu como Jesus havia expirado, disse:
— “Na verdade, este homem era o Filho de Deus!”

No Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, celebramos a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, e o Evangelho de São Lucas recorda que, ao se aproximar da Cidade Santa, o Senhor chorou sobre ela. Jerusalém não reconhecia o tempo da visitação (καιρός τῆς ἐπισκοπῆς [kairós tēs episcopḗs]), isto é, o tempo maduro e oportuno (καιρός [kairós]) em que era visitado por Deus encarnado. Embora as pessoas estivessem cantando hosana e loas ao Filho de Davi, Cristo tinha o Coração carregado de lágrimas. Ele sabia que Jerusalém não reconheceria a sua visita. 

Os judeus esperam como Messias um general, um libertador político, alguém que os libertasse do jugo romano, de uma política opressora. Mas eis que se aproxima alguém muito maior do que o Messias prometido. De certa forma, Jesus não é o Messias esperado; é o Messias surpreendente. É, sim, o Cristo (Χριστός [Christós], מָשִׁיחַ [māschîach]), o Ungido; mas é, ao mesmo tempo, o Servo sofredor previsto por Isaías na Primeira Leitura. Cristo se manifesta de forma inesperada: Ele é o Ungido profetizado nas Escrituras, mas é também vítima imolada, para a salvação do mundo.

Foi justamente para isso que os evangelistas escreveram os seus evangelhos, ou seja, para nos levar à fé, uma fé superior à de Jerusalém, para nos fazer compreender quem é este que morreu crucificado por nós. No final do relato da Paixão lido solenemente neste Domingo de Ramos, São Marcos diz que “Jesus deu um forte grito e expirou, e nesse momento a cortina do santuário rasgou-se de alto abaixo em duas partes. Quando o oficial do exército viu como Jesus havia expirado, disse: ‘Na verdade, este homem era filho de Deus’” (v. 37 a 39).

No final da Quaresma, a Igreja cobriu todas as imagens com um véu roxo. Também as cruzes se encontram veladas neste Domingo da Paixão. A partir dessa realidade visível de cruzes encobertas, compreendemos a necessidade de penetrarmos este véu para poder professar a fé do centurião e enxergar o mistério oculto no Calvário.

Com efeito, quando olhamos para a Cruz nua e cruamente, não conseguimos ver nada mais do que um crime. Provavelmente, muitos dos que viram a Cruz histórica, há dois mil anos em Jerusalém, talvez não tenham visto senão o horror de um crime. Mas atrás dele há algo que não seremos capazes de enxergar sem fé. Por isso, é necessário que o véu se rasgue de cima abaixo, de modo que nós, como o oficial romano, possamos dizer de Jesus crucificado: “Na verdade, este homem é o Filho de Deus”. Ali há algo escondido: o amor. 

Jesus não morre assassinado cruel e injustamente. Houve, sim, uma execução cruel e injusta; contudo, foi Ele mesmo quem entregou a vida: “Ninguém tira a minha vida, eu a dou livremente”. Esse doar-se livremente na Cruz, nós o vemos plenamente já na noite da Quinta-feira Santa, quando Jesus, durante a Última Ceia, disse: “Isto é o meu corpo, que é dado. Isto é o meu sangue, que é derramado”. Com essas palavras, repetidas em toda Missa no momento da consagração, Jesus revela seu supremo ato de amor: Ele morre por cada um de nós. 

É assim que a Igreja quer nos ajudar neste Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor a penetrar o véu espesso que oculta, atrás da dor e da violência de uma morte injusta, o ato supremo de amor, de misericórdia e de caridade. Na Cruz, Jesus ama, de forma infinita, a Deus e a cada um de nós. Para enxergarmos isso, precisamos de fé. Precisamos entender em que consistiu esse ato supremo de amor. Estamos acostumados a pensar na Cruz somente como manifestação de misericórdia. De fato, a morte na Cruz manifesta a misericórdia de Deus, mas está intimamente ligada ao supremo ato de justiça. Em que sentido?

Na Cruz, Cristo realizou o supremo ato de justiça, porque finalmente um homem amou a Deus como Deus merece ser amado. Nós, por mais que nos dediquemos, por mais que nos entreguemos, nunca iremos dar a Deus um amor como o de seu Filho. Sempre estaremos aquém, incapazes de amar como somos amados. Deus nos ama de forma infinita. Para amarmos a Deus de volta, precisaríamos de um amor igualmente infinito. Ora, não somos capazes deste amor. Então Deus Filho se fez homem e morreu na Cruz para que, nela, oferecesse a Deus por nós todo o amor que Deus merece. 

Em outras palavras, Jesus crucificado realiza o supremo e mais perfeito ato de justiça. Ele adora a Deus como Deus merece ser adorado; Ele dá a Deus a devida ação de graças; Ele intercede por nós como nós precisamos que alguém interceda; Ele expia os nossos pecados, oferecendo-se por nossas culpas.

A Cruz é misericórdia suprema e infinita, realizada num ato de suprema e infinita justiça. Jesus faz justiça, porque justo é dar a cada um o que lhe é devido, e Ele dá a Deus o que é de Deus: suprema adoração e ação de graças e, ao mesmo tempo, a satisfação de nossas dívidas, que jamais poderíamos pagar. Para nos salvar, Ele assume nossas misérias e pecados e toma sobre si as nossas dores. Por isso, em cada santa Missa, recordamos este supremo ato de misericórdia e de amor com o qual Jesus ama a Deus como Deus merece ser amado, e ama-nos como não merecemos ser amados. Justiça e misericórdia se encontram na Cruz.

Na Missa deste Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, aproximamo-nos dessa verdade a fim de contemplá-la de forma mais clara e inequívoca, para que em todas as outras Missas possamos rasgar o véu e adentrar esse mistério da fé. Por isso, peçamos a Deus a graça de vivermos em cada santa Missa, principalmente na deste domingo, esse mistério de fé. 

Como vivê-lo? O Evangelho de São Marcos fala de um centurião, um oficial do exército romano, que estava no Calvário e acreditou. Mas ele não estava sozinho. Havia outra pessoa aos pés da Cruz: a Virgem Santíssima. Enquanto os outros que ali estavam vacilavam todos na fé em Jesus — Judas tendo-o traído, Pedro negado e os demais desertado —, lá estava a Virgem Maria, de pé ao lado da Cruz, crendo até o fim. Até mesmo São João, o único dos Apóstolos que permaneceu junto da Cruz, sucumbiu na fé. Prova disso é que, na manhã do domingo de Páscoa, ele foi às pressas procurar Jesus no túmulo, ainda entre os mortos. Ao notar os panos dobrados, “ele viu e acreditou”; logo, até então não acreditava, porque vacilara na fé. 

Nesses dias em que celebramos a Paixão do Senhor, precisamos de uma fé inabalável, que creia no amor de Deus, mesmo que tudo pareça dizer o contrário, e que seja capaz de ouvir aquela voz que diz: “Eis o meu Filho muito amado, no qual coloquei toda a minha complacência”, apesar dos gritos de Cristo, que morre dizendo: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” 

Essa é a fé de Maria, que viu seu Filho agonizar, porque “era necessário que Cristo padecesse” os maiores tormentos espirituais e psíquicos. Ele tomou sobre si as nossas dores, não somente físicas, mas também espirituais. Como diz São Paulo, “Ele se fez pecado” (2Cor 5, 21) para expiar todo pecado. Embora nunca se tenha desesperado, Ele quis sofrer a dor dos desesperados; embora visse sempre a glória de Deus, quis padecer a dor dos que se sentem abandonados por Deus. 

Maria viu tudo isso em seu Filho, dilacerado e transpassado de dor, mas manteve-se de pé, oferecendo até o fim o sacrifício da fé. Por isso, a fé de Nossa Senhora deve ser nossa companheira ao longo desses dias em que adentramos o mistério da Paixão, em que a dor penetra nossa alma, mas sem dilacerar nossa fé. Cremos na vitória que Ele prometeu, embora tudo fale de derrota. Na Cruz parece haver um grande “fracasso”; mas a Igreja, cheia da fé de Maria, tem razão em cantar: “Vitória, tu reinarás. Ó Cruz, tu nos salvarás”. A Cruz de Cristo é verdadeira vitória, vitória sobre Satanás e sobre o pecado. 

Muitos pensam que a vitória de Cristo se deu no domingo da Ressurreição. Sim, é verdade; no domingo da Ressurreição houve uma vitória, a de Cristo sobre a morte; mas a vitória mais importante, sobre Satanás e sobre o pecado, ou seja, sobre a morte mais mortífera — não a física, mas a eterna —, aconteceu na Cruz, na qual Jesus amou até o fim. Satanás tinha a tola esperança de o fazer pecar e blasfemar, desesperado de Deus e do amor. Mas era tola esperança. No momento em que o diabo pensava estar alcançando sua maior vitória, deflagrou-se sua maior derrota. Na Cruz de Cristo, a antiga serpente teve a cabeça finalmente esmagada. 

Diante dos primeiros pais, havia uma árvore e seu fruto, do qual uma mulher quis se apossar. A Cruz é a antítese da árvore primitiva. Antes, a árvore da vida; agora, o madeiro da Cruz. Antes, um fruto natural; agora, o bendito fruto de Maria, concebido pelo poder do Espírito Santo. Eva quis tomar para si o fruto; Maria entregou-o definitivamente a Deus, em sacrifício supremo de fé.

Nesta Semana Santa que se inicia, armados com a fé da Virgem Santíssima, vivamos intensamente esses dias de vitória sobre Satanás e sobre a morte, para que essa vitória seja abundante em nossas vidas.

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