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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 6, 35-40)

Naquele tempo, disse Jesus à multidão: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede. Eu, porém, vos disse que vós me vistes, mas não acreditais. Todos os que o Pai me confia virão a mim, e quando vierem, não os afastarei.

Pois eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. E esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum daqueles que ele me deu, mas os ressuscite no último dia. Pois esta é a vontade do meu Pai: que toda pessoa que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna. E eu o ressuscitarei no último dia”.

Hoje a Igreja recorda um santo Doutor, S. Anselmo de Cantuária. Quem foi ele? Anselmo nasceu não na Inglaterra, onde fica Cantuária, lugar em que ele mais tarde seria bispo, mas no território da atual Itália, na região do Piemonte, em Aosta. Ainda jovem, Anselmo queria ser monge. O pai se opôs, o que o levou a contrair uma doença — talvez psicossomática, não sabemos —, que se manifestava numa grande tristeza por não poder consagrar-se a Deus. O fato é que, passado algum tempo, ele finalmente entrou num mosteiro, não em sua terra natal, mas no noroeste da França, na região da Normandia. Ali, Anselmo tornou-se monge, chegando depois a ser abade do mosteiro de Bec. Foi por isso, aliás, que ele começou a relacionar-se com a Inglaterra. A Normandia fica no Canal da Mancha, ponto em que a Europa está mais perto da Inglaterra. O mosteiro de Bec, além disso, tinha propriedades em território inglês, o que obrigava Anselmo a viajar muitas vezes para a Inglaterra a fim de resolver problemas. Entrementes, ficou vaga a diocese de Cantuária, sede primaz da mais antiga diocese inglesa. Os tempos eram de conflito. Na época, os reis ingleses queriam nomear bispos que eles mesmos pudessem controlar, e S. Anselmo, que a essa altura já era quase um idoso, não aceitou de forma alguma ser bispo de Cantuária. Sucede, porém, que os outros bispos viram nele um santo e uma chance única de se verem livres das pressões do monarca. Por isso se dirigiram ao rei da Inglaterra para o convencer a nomear Anselmo. O rei estava moribundo e, por medo do inferno, resolveu aceder ao pedido. Eis a primeira lição que se pode tirar da vida do santo. Um político que passou a vida inteira tripudiando o clero, mandando nas autoridades eclesiásticas, fazendo da Igreja escrava de seus poderes autoritários, teve medo do inferno, estando já com o “pé na cova”! Sim, o temor do inferno tem salvado muita gente. Com medo de morrer e ser condenado, o rei decidiu seguir melhor conselho e nomear bispo um santo que ele sabia não ser mais uma “marionete” a serviço da coroa. Anselmo, porém, ficou contrariado. Os demais bispos insistiam na nomeação, e o próprio rei estava empenhado em fazê-lo primaz de Cantuária. “Já estou velho”, dizia Anselmo, “não sustento nem a mim mesmo. Como vou suportar o peso da Igreja?” Os bispos conduziram Anselmo ao leito do rei Guilherme, o Ruivo, para que este o convencesse a aceitar o cargo. Como Anselmo se recusasse, os bispos o agarraram, puseram uma cruz nas mãos do rei e fizeram, não sem grande violência, Anselmo tomá-la nas suas, em prova de que “aceitava” a nomeação. Terminada a cena algo pitoresca, Anselmo viu-se nomeado arcebispo primaz da Inglaterra, cargo que ele mesmo terminou aceitando, por ver nisso um sinal da vontade de Deus. Mas não o fez sem grande custo. O rei, no fim das contas, sobreviveu, arrependeu-se da decisão e começou a perseguir o santo. Anselmo foi exilado. Morto o rei, voltou do exílio. Quando ascendeu ao trono Henrique I, novo conflito: Anselmo foi exilado novamente… E de que nos serve saber estes fatos? Para vermos como Anselmo viveu aquele ensinamento de Jesus: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Sim, a Igreja precisa ser livre das autoridades civis. O próprio Anselmo costumava dizer que Jesus não quer como Esposa uma escrava, por isso a Igreja não é nem pode ser submissa ao poder estatal. Ela é, por sua própria natureza, independente dele. Uma das coisas que mais agradam a Cristo é ver a liberdade de sua Esposa, a Igreja Católica, para salvar as almas. Não é de hoje que a Igreja, em momentos de conflito, precisa resistir aos césares que pretendem ter poder sobre ela, e ter mais poder do que ela sobre as almas e os corações. “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. S. Pedro o repete a seus perseguidores: “Convém antes obedecer a Deus do que aos homens”. Obedeçamos pois a Deus, sobretudo nesses tempos de conflitos que atravessamos, em que várias autoridades civis, seja do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário, querem mandar na Igreja, ditando “quando” e “como” ela há de administrar os sacramentos, “quando” e “como” os templos devem abrir as portas… A vida de S. Anselmo é ainda hoje, e especialmente hoje, exemplo para nós. Sim, é importante que haja harmonia e convívio pacífico entre a Igreja e as autoridades civis, estas porém têm de entender que há limites. A Igreja tem uma longa fileira de santos e bispos que, como Anselmo, suportaram o exílio, e às vezes o martírio, para não se dobrar ao arbítrio e às injustiças das autoridades civis. Que S. Anselmo inspire sempre a Igreja com o seu exemplo, para que todos nós, fiéis a Cristo, demos a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Que as almas possam ser salvas, receber os sacramentos, receber a Palavra de Deus, mesmo que isso custe — custe o exílio ou, quem sabe, até a palma do martírio!

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