Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 9, 22-25)
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia”.
Depois Jesus disse a todos: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará.
Com efeito, de que adianta a um homem ganhar o mundo inteiro, se se perde e se destrói a si mesmo?”
Nesta Quinta-feira depois das Cinzas, duas cruzes se unem em uma só: a de Cristo e a nossa; a dele, porque o Filho do Homem, rejeitado pelos seus, havia de sofrer muito e ser crucificado; a nossa, porque os que seguem a Ele, rejeitando-se a si mesmos, hão de tomar cada dia a cruz dos próprios sofrimentos. Pois não é digno de ser chamado cristão quem quer um Cristo sem cruz; mas tampouco seria sensato querer uma cruz sem Cristo, porque é na união com as dores do Senhor que ganham sentido as sem razões da vida e doçura, as amarguras dos discípulos. Os cristãos, com efeito, não somos amantes do sofrimento pelo sofrimento, como pensam alguns, senão amantes do sofrimento por causa de quem o sofreu e o santificou por nós, e por isso há esta diferença entre o sofrimento do mundo e o sofrimento nosso: o mundo, porque não crê, sofre sem entender por que sofre; nós, porque temos fé, sofremos, mas amando e sabendo por que sofremos. E tão grande é o amor que um cristão encontra no sofrimento que já não é ele quem sofre, mas Cristo quem sofre por ele. Sirva de exemplo disto o caso da santa e mártir Felicidade, encarcerada pelas autoridades romanas quando já levava oito meses de gravidez. Como não permitissem as leis do Império que se entregasse às feras uma mulher prestes a parir, o guarda da prisão quis acrescentar às dores de Felicidade, enquanto ela dava a luz, mais este escárnio, pois se ela tanto padecia em dar à luz na prisão, com que ânimo iria dali a pouco enfrentar os tormentos da arena? Ao que ela respondeu, dizendo que, na prisão, era ela quem sofria as dores do parto, mas, uma vez subida ao circo, era Cristo quem nela sofreria até dá-la à luz. Eis o grande mistério que nos acompanha ao longo da Quaresma, cujas penitências e mortificações, como vimos ontem, se carregam em família, junto com a força dos braços e a riqueza dos méritos de toda a Igreja, e que são, como vemos hoje, também alegrias e amores, porque não somos nós, mas Cristo quem as padece e suporta, a fim de nos fazer nascer para a eternidade.
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