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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 11, 20-24)

Naquele tempo, Jesus começou a censurar as cidades onde fora realizada a maior parte de seus milagres, porque não se tinham convertido.

“Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se os milagres que se realizaram no meio de vós, tivessem sido feitos em Tiro e Sidônia, há muito tempo elas teriam feito penitência, vestindo-se de cilício e cobrindo-se de cinza.

Pois bem! Eu vos digo: no dia do julgamento, Tiro e Sidônia serão tratadas com menos dureza do que vós. E tu, Cafarnaum! Acaso serás erguida até o céu? Não! Serás jogada no inferno! Porque, se os milagres que foram realizados no meio de ti tivessem sido feitos em Sodoma, ela existiria até hoje! Eu, porém, vos digo: no dia do juízo, Sodoma será tratada com menos dureza do que vós!”

Hoje, memória de Santo Henrique, recordamos também uma aparição de Nossa Senhora na Itália, em Montichiari: a aparição de Maria Rosa Mística. Trata-se de uma revelação privada, na qual, portanto, não somos obrigados a crer. Recentemente, porém, o Santuário de Montechiari foi consagrado pelo bispo diocesano, o que supõe, de alguma forma, uma aceitação das aparições. Nossa Senhora apareceu logo depois da II Guerra Mundial, em 1947, a uma enfermeira chamada Pierina Gilli, a quem se mostrou inicialmente com três espadas cravadas no Coração. O que significam elas? Nossa Senhora estava anunciando profeticamente uma crise que abalaria a Igreja vinte anos depois. Em 1947, os seminários estavam lotados, as ordenações sacerdotais eram numerosíssimas, não havia nem um sinal de crise vocacional. No entanto, Nossa Senhora aparece com uma espada no Coração, dizendo: “A primeira espada é a escassez das vocações”. Todo o mundo diria: “Loucura! Os seminários estão lotados. Nunca ordenamos tantos assim”, e no entanto Nossa Senhora profetizava. A segunda espada significava o sofrimento de Maria por causa dos sacerdotes e religiosos que viviam em pecado mortal. Jesus já havia aparecido a Santa Margarida Maria Alacoque com o seu Sagrado Coração, dizendo que o que mais o feria eram os pecados cometidos pelas almas consagradas. A terceira espada significava os sacerdotes que cometiam a mesma traição que Judas. Certamente, estamos falando aqui de alguma grande apostasia, de alguma grande traição, isto é, de sacerdotes que estavam traindo Jesus como Judas o traiu. Um pecado muito mais grave. Afinal, pode haver sacerdotes e religiosos que vivem em pecado mortal por fraqueza, mas o pecado de Judas não foi de fraqueza, foi de malícia.

Logo depois, Nossa Senhora apareceu, não mais com três espadas no Coração, mas com três rosas, uma branca, uma vermelha e outra dourada. Qual é o significado delas? Nossa Senhora estava apresentando nas três rosas a solução para os três problemas, isto é, para as três espadas. A primeira rosa, a branca, era a rosa da oração. Nossa Senhora propõe o espírito de oração para resolver o problema da escassez de vocações. Se temos poucos sacerdotes, se temos poucas almas consagradas, poucas vocações generosas, a solução está na oração. Nossa Senhora não diz nada diferente do que Jesus já ensinara no Evangelho: A messe é grande, mas os operários são poucos. Pedi, pois, ao senhor da messe… (É interessante que um dos sinais mais claros de que tais aparições são verdadeiras é que elas nada acrescentam à revelação. Só confirmam o que já sabemos pela divina revelação.) A segunda rosa, a vermelha, trazia a solução para o problema dos padres e religiosos que vivem em pecado mortal: é a rosa da expiação, do sacrifício expiatório que é necessário fazer. As ofensas feitas a Deus pelos sacerdotes que vivem em pecado mortal são muito graves e precisam ser reparadas e expiadas. Nossa Senhora nos coloca aqui diante da missão: fazer sacrifícios para reparar esses males enormes. O organismo da Igreja inteira padece com os pecados dos sacerdotes. Se há pecados que clamam vingança ao céu, os mais graves, que atraem maldição sobre o mundo, são com certeza os dos sacerdotes, quando celebram Missa em pecado mortal, e os dos religiosos, quando comungam indignamente. É, pois, necessário expiá-los. A terceira rosa, a dourada, é a rosa da penitência para trazer os pecadores de volta. A terceira espada simbolizava a traição de Judas, isto é, alguma apostasia por malícia. Nossa Senhora, que apareceu antes em Fátima, disse que era necessário fazer penitência e sacrifícios pela salvação das almas dos pecadores em geral, e agora ela nos está propondo a penitência pela salvação das almas de grandes pecadores, pecadores da magnitude de um Judas. É necessário sacrificar-se pela conversão deles. É parte da caridade. O céu, com efeito, é uma realidade que se ganha quando se deseja para outros, mas que se perde, quando dela se quer excluir uma única pessoa.

Nossa Senhora conclui suas aparições em Montichiari, dizendo: “Eles voltarão”, ou seja, os homens que não realizaram sua vocação sacerdotal, os padres que vivem pecado mortal e os que praticam a mesma traição que Judas voltarão. Se isso irá acontecer porque nós, fazendo penitência, sacrificando-nos em expiação e rezando, iremos alcançar essa realidade, não o sabemos ao certo. Pode ser também que esse retorno aconteça por um ato de misericórdia divina depois de um grande castigo. Confiemos, pois, em Nossa Senhora. É ela quem nos dá a graça de viver a oração, o sacrifício e a penitência pelos pecadores. Isso é o importante, a mensagem principal da Rosa Mística: viver o espírito da oração, de expiação e de penitência. Viver essas três rosas significa ainda ter grande confiança no santo Rosário. Nossa Senhora é a Rosa Mística, por isso ela pôs rosas em nossas mãos, o Rosário, por meio do qual se dará o triunfo do Imaculado Coração. Que Nossa Senhora, Rosa Mística, nos abençoe do céu nesta batalha espiritual, e que nós, tirando as espadas cravadas no Imaculado Coração, possamos agradar a Deus com oração, expiação e penitência. 

* * *

Cristo repreende as cidades galilaicas (cf. Lc 10, 13-15). — V. 20. Como já vimos no v. 18, também aqui constatamos que os evangelistas passam em silêncio muitos detalhes da história evangélica. Afinal, em nenhum lugar se faz menção aos muitos milagres realizados por Cristo em Corazim e Betsaida, ao passo que em grego se lê αἱ πλεῖσται δυνάμεις αὐτοῦ = a maioria das virtudes, isto é, dos milagres dele. Mateus, que escreve para compatriotas, podia supor com razão que estes acontecimentos eram conhecidos de muitos; um escritor mais jovem, por outro lado, não poderia nem mesmo ter a ideia de introduzir tal sermão. — O evangelista vincula essa passagem às anteriores por meio da partílua τότε (lt. tunc, pt. então), frequentíssima no primeiro evangelho (aparece cerca de 90 vezes). Que ela não indique necessariamente uma sequência temporal, já Santo Agostinho o advertira (cf. De cons. evang. II 32); também os escritores profanos a utilizam muitas vezes em sentido genérico e indeterminado. Por isso, daqui não se pode concluir com certeza que a censura às cidades da Galileia tenha acontecido logo após os fatos narrados nos vv. anteriores. De fato, quando se diz que Jesus começou a censurar as cidades (gr. ἤρξατο ὀνειδίζειν, lt. tunc cœpit exprobrare), indica-se provavelmente que o Senhor as repreendeu muitas vezes, como se o evangelista o quisesse destacar com um peso peculiar; com efeito, a própria locução tem algo de grave e solene. — Jesus exprobra às cidades em que tinham sido operados muitos dos seus milagres (o uso do artigo definido em grego, αἱ πλεῖσται δυνάμεις, dá à frase mais força e precisão, porque se trata de sinais certíssimos do poder divino, apropriados à inteligência de todos) o não terem feito penitência (cf. Mt 4, 17). Que sua doutrina e exortações procedem verdadeiramente de Deus e que é em nome e com a autoridade dele que impõe a penitência, prova-o com inúmeros milagres, ou seja, com aquele gênero de testemunho ou prova suficiente para convencer facilmente qualquer homem, desde que o queira admitir, de que algo vem de Deus.

V. 21. No entanto, tudo isso foi em vão para elas, daí que, em termos bastante duros, Jesus passe a falar às cidades (dirigir a palavra a coisas inanimadas é sinal de uma alma profundamente agitada pelos afetos): Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida!, duas cidades às margens do lago de Genesaré, não muito longe de Cafarnaum. (Betsaida era a pátria de Pedro, de André e de Filipe; cf. Jo 1, 44.) — Aquele Ai, na boca de Cristo, que viera buscar e salvar o que tinha perecido, é gravíssimo e cheio de terror [1]. Contudo, mostra ser justo desferi-lo contra aqueles homens mediante uma comparação com os fenícios, cujos costumes ninguém ignora terem sido depravadíssimos: Porque, se em Tiro e em Sidônia, isto é, nas duas principais cidades, abundantes em riquezas e prazeres, tivessem sido feitos os milagres que se realizaram em vós, há muito tempo (gr. πάλαι) que teriam feito penitência. Que vergonha para o povo eleito! Gentios da pior espécie, se vissem os milagres de Jesus, não tardariam em afastar-se de seus maus desejos e mostrar dor e detestação por seus pecados em cilício, veste áspera e lúgubre, e em cinzas, sentados na terra, a cobrir a cabeça com cinzas (cf. Jr 6, 26; Jo 3, 6). Não lemos em nenhum lugar que alguma cidade judaica tenha feito tal penitência ao receber os milagres e a pregação de Cristo. Logo, estas palavras são motivo de grande confusão para os judeus, que desprezavam os outros povos como pecadores, cegos e ignorantes, enquanto se gloriavam de ser os mais sábios, a raça eleita para conduzir as nações (cf. Rm 2, 18ss). — Observa com acerto São Roberto Belarmino (cf. De pœnit. I 7), contra os que querem reduzir a penitência (μετάνοια, do verbo μετανοεῖν) ao arrependimento interno, que também neste v. aprendemos qual é o sentido autêntico de μετανοεῖν nas Escrituras: “Ora, o que é fazer penitência sentando-se em cilício e em cinza? Certamente, o arrependimento, tomado em sentido próprio, precede os sacos e as cinzas; afinal, ninguém se veste de saco e senta em cinzas, a não ser que se tenha arrependido antes. O Senhor, porém, significa a ação penal que é assumida e exercida enquanto alguém, triste e contrito, se cobre de sacos e cinzas. Por isso, μετενόησαν, nesta passagem, não pode significar outra coisa além da aversão tanto de coração como de corpo aos pecados passados e o ato de vingar-se deles em si mesmo”. O mesmo sustenta Jansênio, ao dizer que o verbo μετενόησαν não significa o simples arrependimento, mas também a aflição e o castigo da própria carne.

Dubium: Se Cristo sabia que os habitantes de Tiro haveriam de arrepender-se, por que não foi pregar e fazer milagres entre eles? Responde São Jerônimo: “A isso, a resposta fácil e óbvia é que nós ignoramos os juízos de Deus e desconhecemos os mistérios da cada um de seus desígnios; o Senhor se propusera não sair dos limites da Judeia, para não dar aos fariseus e sacerdotes ocasião justa de perseguição; por isso mandou aos Apóstolos, antes da Paixão, que não fossem pelos caminhos dos gentios”. Mas contra isso se pode objetar o que diz Jansênio: “Poder-se-á perguntar novamente: então por que Deus dispôs dessa forma, embora soubesse que os de Tiro haviam de crer, se entre eles fossem feitos milagres?” Alguns recorrem à divina predestinação e aos inescrutáveis juízo de Deus (cf. Santo Agostinho, De dono. persev. 10.14; Enchirid. n. 95); outros, com mais razão, observam que se trata aqui das graças absolutamente extraordinárias, ou seja, dos milagres, de maneira que Deus não negou àquelas gentes os auxílios necessários e suficientes com os quais, se quisessem, poderiam cooperar e evitar assim a condenação. Ora, Deus não está de modo algum obrigado a conceder aos homens benefícios estupendos e maravilhosos: se Ele os concede a uns, isso depende unicamente de sua liberalidade; se os nega a outros, não age injustamente com ninguém. Sobre isso escreve Alonso Tostado: “As coisas que são absolutamente necessárias [simpliciter ex necessitate] à nossa salvação têm causa manifesta por que são feitas, já que, se Deus no-las tirasse ou no-las não concedesse, nos condenaria injustamente; as coisas porém que são de superrogação, sem as quais ainda pode haver salvação, são concedidas tão somente pela liberalidade de Deus” (Q. 53 in Matt. 11). Assim como o homem tem direito a dar aos que quer benefícios maiores e mais numerosos, também Deus é libérrimo na distribuição da abundância de suas graças: Toma o que é teu, e vai-te… Porventura vês com maus olhos que eu sou bom? (Mt 20, 14s).

V. 22. É justo, por conseguinte, que se trate com maior dureza no juízo aos que receberam benefícios especiais: Por isso vos digo que haverá menor rigor para Tiro e Sidônia no dia do juízo, que para vós, quer dizer, será mais tolerável a condição deles. Pois onde há maior conhecimento, maior é a contumácia, mais grave o desprezo de Deus, o que leva a incorrer em juízo mais severo. Do mesmo modo se diz que Israel pecou menos que Judá (cf. Jr 3, 11), ou que Samaria não cometeu metade dos pecados de Judá (cf. Ez 16, 48.51). Sodoma não pecou como Judá porque em Judá havia mais remédios para o pecado e maiores estímulos à penitência. Também os gentios pecavam contra a lei natural, inscrita no coração de todo homem; mas os judeus tinham, além dela, a Lei escrita como mestra, tinham profetas e doutores, ouviam Jesus, viam-lhe os milagres… Daí ser mais severa a censura a Cafarnaum, porquanto se afirma que, nas mesmas condições, os próprios sodomitas, os maiores pecadores aos olhos de Deus e cujo pecado clama aos céus por vingança (cf. Gn 13, 13; 18, 20; Ex 16, 49), teriam feito penitência; logo, a cidade de Cafarnaum, assim como superava em riquezas e grandeza as cidades de Corazim e Betsaida, assim também as superava na perversidade e obstinação. — V. 23. E tu, Cafarnaum, elevar-te-ás porventura até ao céu? Jesus se refere aos soberbos habitantes daquela rica cidade: “Acaso pensas que o esplendor e a glória da cidade crescerá sempre mais” — pergunta de quem a um tempo lhe admira e confuta a arrogância —, “como se fosses tocar o céu? Não”, para em seguida opor à vanglória dela a terrível sentença: Hás de ser abatida até ao inferno, isto é, das alturas a que se erguera a cidade será precipitada ao mais profundo dos abismos; não só não terá maior glória como será sepultada sob a ignomínia e o esquecimento. E essa, de fato, foi a sorte da cidade, pois ninguém sabe ao certo em que lugar Cafarnaum fora construída nem onde estão suas ruínas. — Naquele abatimento ao inferno se indica ainda outro gênero de pena sobre os pecadores, que, quanto mais soberbos forem neste mundo, com maior vergonha e piores penas serão castigados no outro.

Declara-se por último a gravidade da obstinação e malícia da cidade porque, se em Sodoma tivessem sido feitos os milagres que se fizeram em ti, ainda hoje existiria. Observa São João Crisóstomo que a menção a Sodoma serve para agravar a acusação: “É, com efeito, grande prova de perversidade parecer mais malvado não só do que os criminosos de hoje, mas também do que os passados; assim os condena noutro lugar, comparando-os com os ninivitas e com a rainha do Sul” (cf. Mt 12, 41s). Eis por que no dia do juízo serão tratados com mais rigor do que os pecadores sodomitas: V. 24 Por isso vos digo que no dia do juízo haverá menos rigor para a terra de Sodoma que para ti; fala-se do juízo em que os crimes de cada homem, com todas as suas circunstâncias, serão publicamente conhecidos e a todos, perante todos, será atribuída a sentença que o direito divino determinar.

Referências

  1. Cf. H. Simón, Prælectiones Biblicæ. Novum Testamentum. 4.ª ed., iterum recognita a J. Prado. Marietti, 1930, vol. 1, p. 404, n. 310: “O humaníssimo Coração de Cristo não podia apartar-se sem violência e tristeza daquela região, na qual tantos trabalhos padecera. Oh, dor! Após tantas viagens e exortações, após tantos e tão manifestos milagres, era ainda demasiado exíguo o número daqueles que haviam convertido sua mente para o desejo do Reino de Deus. Por isso aquela ingente ruína, que paira sobre todo o Israel, cairá também, como duríssima punição, sobre as cidades galaicas, palco da pregação de Cristo: Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida!… E tu, Cafarnaum…”.

Notas

  • A segunda parte do texto (a partir dos três asteriscos) é uma tradução levemente adaptada, com alguns acréscimos e omissões de nossa equipe, de J. Knabenbauer, Commentarius in Evangelium secundum Matthæum. 3.ª ed., Paris: P. Lethielleux (ed.), 1922, 507–510.

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