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Texto do episódio
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Celebramos nesta data a memória de Santo Afonso Maria de Ligório, sacerdote e Doutor da Igreja. Nascido há 300 anos, no então reino de Nápoles, Itália, Afonso teve uma educação católica desde o berço. Dois de seus irmãos foram sacerdotes e outras irmãs foram religiosas.

Antes de ser padre, porém, Afonso entrou para a carreira de advogado e formou-se em Direito Civil e Canônico. Muito habilidoso e competente, aos dezoito anos recebeu uma licença especialíssima para começar a advogar. Ele logo se tornou conhecido por não perder nenhuma causa, embora jamais usasse de artifícios desonestos. Para Afonso, uma causa só poderia ser defendida se fosse algo realmente justo. Todos o viam como um advogado “de sucesso”.

Por seu prestígio, Afonso foi contratado para uma causa na qual estava em jogo cerca de um milhão de dólares. O jovem advogado fez uma defesa brilhante no tribunal, de modo que todos os presentes tinham certeza da sua vitória. Seu adversário, porém, apresentou-lhe um documento sobre o qual Afonso não tinha ponderado suficientemente. O documento dava razão à outra parte. Afonso, por sua vez, reconheceu a própria derrota, saindo envergonhado da audiência.

Depois de um período recolhido e em oração, Afonso entendeu que aquela humilhação era desejada por Deus para tirá-lo do mundo, cheio de vaidades e vanglória, e torná-lo seu ministro. Então, após um tempo vivendo como celibatário e fazendo obras de caridade, ele aceitou ser ordenado sacerdote, em 1726. E assim Afonso iniciou uma grande tarefa missionária por Nápoles e toda região, até finalmente fundar a congregação dos Redentoristas.

No confessionário, Santo Afonso contribuiu de maneira decisiva para a teologia moral da Igreja. Inicialmente, ele tendeu bastante ao rigorismo. A sua época sofria uma grande influência do jansenismo, que apresentava uma visão muito negativa dos atos humanos. Tudo podia ser pecado. Por outro lado, a tendência laxista também era um risco iminente. Consequentemente, Afonso viu que nenhuma das alternativas podia ser realmente frutuosa para as almas. Ele então começou a estudar o tema do juízo moral com extremo cuidado, especialmente o caminho adotado pelos jesuítas, que parecia ser o mais correto. 

Para Santo Afonso, era importante compreender por que uma coisa é pecado e em que circunstâncias alguém é responsável ou não pelas suas ações. Nesse sentido, ele foi desenvolvendo critérios para o discernimento das consciências, a fim de ajudar as pessoas a sair do estado de pecado. De fato, a maturidade que Afonso adquiriu na matéria, ao longo de anos de confessionário, e toda a sua capacidade jurídica ajudaram-no a escapar tanto do rigorismo como do laxismo. Foi assim que Santo Afonso montou um sistema de moral e publicou a famosa obra “Teologia Moral”.

Hoje, a Igreja tem o seguinte juízo sobre a moral afonsiana: “Um confessor que segue as conclusões de Santo Afonso deve ser deixado em paz”. E isso porque nem todo confessor é um gênio, nem todo confessor é um “Doutor da Igreja”, nem todo confessor é capaz de raciocinar e pensar com clareza em cada coisa, de meditar etc. Existem padres que atendem confissão, mas apresentam certo limite de ignorância. Porém, se um sacerdote usar o manual de Santo Afonso e seguir as conclusões dele, a Igreja diz: “Deixem esse confessor em paz; ele está fazendo certo”. Tal é o prestígio de Santo Afonso.

A contribuição de Santo Afonso para a teologia moral é ainda mais importante se levarmos em consideração que a comunhão com Deus depende, sobretudo, do “estado de graça”. Ninguém pode chegar ao estado de perfeição, para o qual somos chamados, se não estiver com seu organismo espiritual íntegro. Mesmo que uma pessoa em pecado saiba todas as regras da oração, ela jamais poderá crescer e dar frutos sem antes receber a graça da absolvição no sacramento da Penitência. Essa pessoa seria como um agrônomo que corrige o pH do solo, aduba a terra, mas não possui a semente para o plantio. O seu trabalho é inútil.

Chama-se de “mortal” justamente o pecado que destrói a caridade e a comunhão com Deus. Para recuperar essa comunhão, ou seja, a semente da graça recebida no Batismo, a pessoa precisa arrepender-se de todos os seus pecados mortais e confessá-los ao sacerdote, que os absolve segundo a fórmula: “… eu te absolvo dos teus pecados, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”. Desse modo, Deus restabelece a semente da graça e a pessoa recupera a caridade no seu coração. Apenas assim ela pode crescer em santidade, porque o crescimento na vida espiritual consiste em crescer no amor a Deus e aos outros.

Se acontecesse, porém, de alguém confessar apenas alguns pecados graves, ocultando outros por vergonha ou qualquer outro motivo, essa confissão seria inválida. Também seria inválida uma confissão em que o confessor não usasse devidamente a fórmula da absolvição. E mesmo se o penitente confessasse todos os seus pecados, essa confissão só seria válida se ele estivesse realmente arrependido e com o firme propósito de nunca mais voltar a cometê-los. De outro modo, a alma permanece em pecado mortal.

A confissão não é mágica, portanto. Para que haja o perdão dos pecados, é necessário que haja a matéria própria do sacramento. A matéria da confissão não é o pecado confessado. As pessoas acham que basta pronunciar uma lista de pecados no confessionário, e está feito. Não. Você tem de estar arrependido. E arrependimento não é um sentimento. Não é questão de sentir. É questão de você, com a sua vontade, dizer: “Isso aqui é pecado. Eu ainda gosto da coisa e, se dependesse de mim, continuaria fazendo; mas como Deus está me dizendo que é pecado, então eu detesto isso”; e, num ato de vontade, “eu não vou nunca mais fazer isso. Prefiro derramar meu sangue a repetir isso aqui”. Pronto. Isso é arrependimento.

Todos os pecados mortais precisam ser confessados para uma confissão valer. De todos os pecados mortais deve haver arrependimento, de uma vez e para sempre. Não dá para se arrepender de 99% deles; se sobrou um pecado mortal sem arrependimento, a confissão não vale.

Mas, uma vez feita sua confissão geral e confessados todos os pecados mortais, as pessoas ainda convivem no dia a dia com o pecado venial. “Comete-se um pecado venial”, explica o Catecismo, “quando, em matéria leve, não se observa a medida prescrita pela lei moral ou quando, em matéria grave, se desobedece à lei moral, mas sem pleno conhecimento ou sem total consentimento” (1862). É triste, mas é a realidade. Os pecados veniais vão acontecendo, vão acontecendo, vão acontecendo… então, o que fazer com eles? 

Dos pecados mortais temos de nos arrepender, de todos de uma vez e para sempre; para os pecados veniais, porém, não funciona bem assim. Se você quiser se arrepender de todos de uma vez e para sempre, eles continuam, por mais que você tenha boa vontade. O método encontrado pelos santos doutores, com efeito, é o seguinte: escolha um ou dois pecados veniais e combata-os, faça-lhes guerra. Combatendo-se um pecado venial, os outros vão diminuindo e perdendo força também.

Para isso, você precisa saber distinguir entre pecado mortal e pecado venial. É preciso ter o mínimo de estudo para saber o que é um pecado mortal. Devemos preparar as pessoas na catequese para saber o que é pecado mortal e o que é pecado venial. Em nosso site, por exemplo, você encontra em pdf um Manual de Confissão, com exame de consciência inspirado na moral de Santo Afonso, a fim de se preparar para a confissão. A maior parte das coisas que estão nele é de pecados mortais líquidos e certos. Há outros que podem ser mortais ou veniais. É um manual com um exame de consciência diferente daqueles que há por aí, porque ajuda o penitente a discernir entre uma coisa e outra.

A nossa orientação é que a pessoa examine a sua consciência com esse manual, procure um sacerdote em horário oportuno, e faça uma confissão geral [1]. Depois, passe a lutar contra os pecados veniais um a um, até vencê-los. Talvez alguém diga que estamos sendo rigoristas, mas é bom lembrar que, em seu tempo, Santo Afonso chegou a ser considerado laxista. As épocas mudam. O fato é que não pode haver verdadeiro fruto da graça sem um organismo espiritual íntegro e a virtude teologal da caridade. É, pois, preferível seguir os conselhos do Doutor da Igreja, Santa Afonso de Ligório,  a seguir as próprias opiniões. Que este dia da sua memória sirva como tempo para nossa conversão.

Notas

  1. Essa orientação é para quem nunca fez uma confissão geral ou já fez mas deseja recomeçar sua caminhada espiritual com mais determinação. Para almas escrupulosas, no entanto, a confissão geral não é aconselhável.
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