Os 300 anos do encontro milagroso da imagem de Nossa Senhora Aparecida, nas águas do rio Paraíba, em Guaratinguetá, representam o amor de predileção com que Nosso Senhor elegeu o Brasil para uma altíssima vocação. Assim como a mensagem de Fátima, cujo centenário também comemoramos neste ano, a mensagem de Aparecida nos convida a meditar sobre a necessidade de conversão e reparação às ofensas contra o Coração de Jesus. A pequenina e humilde imagem de Nossa Senhora da Conceição, encontrada em 1717 por três simples pescadores, apela para a nobreza do povo brasileiro, a fim de recordar-lhe a sua identidade católica como Terra de Santa Cruz, identidade que se encontra ameaçada por tantos pecados que ora se praticam deliberadamente neste país.
A mensagem de Aparecida está intimamente ligada à imagem da Virgem Maria tal como foi encontrada há três séculos. Ainda sem a coroa que honra sua glória e o manto da devoção de seus filhos, a imagem da Conceição que hoje tanto veneramos era, naquela época, apenas uma estátua de barro sem grande valor artístico, que se somava às outras tantas imagens da Conceição que estavam espalhadas por todas as províncias portuguesas. Como herança do reino de Portugal, o Brasil aprendeu cedo a venerar a pureza original da grande Mãe de Deus, antes mesmo que Pio IX a proclamasse como dogma da Santa Igreja, o que demonstra a importância da devoção mariana para esta nação.
Desde a sua formação, em 1139, o Reino de Portugal esteve sob o manto e a vigilância de Nossa Senhora. Foi Dom Afonso Henriques, o primeiro monarca português, quem propagou o culto à Virgem Maria por aquelas terras, dedicando-lhe a Catedral de Braga. Já na segunda dinastia, com o Mestre de Avis, a devoção à Imaculada Conceição começou a tornar-se popular, sobretudo por conta da criação do Santuário da Conceição de Vila Viçosa, por São Nuno de Santa Maria.
Anos mais tarde, Dom João IV decidiu consagrar Portugal à Imaculada Conceição para comemorar a independência do reino que, até aquele momento, estava sob domínio da Espanha. O rei convocou as cortes e depôs sua coroa aos pés de uma imagem da Virgem Maria. A partir daquele instante, Nossa Senhora tornou-se a verdadeira rainha de Portugal e nunca mais os reis usaram a coroa, como reza a tradição.
A imagem de Nossa Senhora Aparecida surgiu nesse contexto. Praticamente todas as famílias daquela época possuíam algum ícone mariano que lembrasse a sua concepção imaculada. Conforme pesquisas geológicas, a imagem que hoje cultuamos foi feita com barro de São Paulo, como uma obra caseira, que se destinava a um culto familiar. Como veio a se quebrar, a família acabou se desfazendo da peça e provavelmente a jogou no rio onde foi encontrada com o corpo separado da cabeça. As réplicas atuais de Nossa Senhora Aparecida geralmente trazem uma “rachadura” no pescoço para indicar a forma como ela apareceu aos três pescadores.
A pesca de Nossa Senhora Aparecida foi indiscutivelmente milagrosa. De acordo com os relatos históricos, os três pescadores — Domingos Garcia, João Alves e Felipe Pedroso — tentavam em vão pescar algum peixe nas águas do rio Paraíba quando, lançando as redes, puxaram o corpo escurecido de uma imagem da Virgem Maria. Sem dar muita atenção àquele objeto, os três homens remaram vários metros à frente, onde retomaram a pescaria. E, para espanto deles, o que veio em meio às redes não foram peixes, mas a cabeça da mesma imagem. Somente depois disso é que conseguiram pescar de verdade, e em quantidade absurda, ao ponto de temerem naufragar. Domingos, João e Felipe levaram a imagem para casa, colaram sua cabeça ao corpo e deram início ao culto daquela que um dia seria a padroeira do Brasil. Vários milagres ocorrerem desde esse dia.
A imagem da Imaculada Conceição é uma representação da Virgem Maria inspirada na “Mulher do Apocalipse” (cf. Ap 12, 1-18). Como se pode notar, ela não carrega o menino Jesus nos braços, diferentemente da maioria das outras imagens marianas, mas está com as mãos em prece. Abaixo de seus pés encontram-se a Lua e um anjo. E ela está grávida. A imagem original possui um recuo nas costas para indicar exatamente a gravidez de Maria. É mesmo a “Mulher revestida de Sol” que esmaga a cabeça da serpente primitiva. O próprio nicho da Basílica onde repousa Nossa Senhora Aparecida foi projetado por Cláudio Pastro como um Sol. Curiosamente, o dia seguinte à Solenidade de Nossa Senhora Aparecida é 13 de outubro, data da última aparição em Fátima, quando Nossa Senhora realizou o famoso “Milagre do Sol”.
De fato, há uma mensagem de Deus para o Brasil por meio da imagem de Nossa Senhora Aparecida, que é a Mulher da batalha contra o dragão. Maria Santíssima venceu o inimigo já no ventre de Sant’Ana. Deus também deseja nosso triunfo contra as hostes infernais e, para isso, presenteou-nos com uma simples imagem de barro da Mãe Aparecida, a fim de indicar que, na luta pela santidade, a maior de todas as armas é a virtude da humildade.
À semelhança de Nossa Senhora Aparecida, nós também somos apenas uma imagem de barro, como narra o livro do Gênesis (cf. Gn 2, 7), quebrada ao meio e lançada ao fundo do rio, qual um verdadeiro lixo. O pecado nos leva a chafurdar no lodo. Mas o que poderia ser para nós motivo de desespero transforma-se, por meio da simples imagem de Nossa Senhora Aparecida, em motivo de júbilo, porque a providência divina também quer nos resgatar, quer nos pescar do fundo desse mesmo rio. Reconhecendo nossa pequenez e fragilidade, nos passos da “pequena via” de Santa Teresinha, p. ex., alcançamos graça diante de Deus e derrotamos o dragão. Nossa Senhora Aparecida é o testemunho da “humildade de sua serva” (cf. Lc 1, 46-55).
Portanto, o que devemos fazer concretamente com essa mensagem de Aparecida?
O primeiro passo é o de reconhecer nossa profunda miséria e dependência da graça divina, sem a qual nada podemos fazer. De fato, estamos como que quebrados em mil pedacinhos, do mesmo modo que a imagem de Nossa Senhora Aparecida, depois do terrível atentado que sofreu em 1978. Assim, precisamos nos colocar como barro na mão do oleiro para que Ele nos remodele e torne grandes santos. Nossa vocação é altíssima. E não é vanglória alguma pretender realizá-la com o auxílio de Deus. Trata-se de magnanimidade!
É preciso recordar também que toda obra de arte possui um molde. O molde de Deus, como nos ensina São Luís de Montfort, é a Virgem Maria. Neste sentido, recomendamos vivamente a nossos alunos a Consagração Total à Virgem Santíssima, cuja preparação pode ser feita aqui no site por meio de nosso curso. Essa consagração foi responsável pela santidade de muitos homens e mulheres, incluindo a de nosso Papa São João Paulo II, cujo lema era exatamente o do Tratado de São Luís para a consagração: Totus Tuus, Mariae (Sou todo teu, Maria).
Devemos esperar que, ao término deste grande Ano Mariano, a Virgem Santíssima providencie uma graça muito grande para nós, assim como ocorreu nos outros anos marianos vividos pela Igreja. E que essa graça seja finalmente nossa conversão e desejo firme de santidade!
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