Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo
Mateus (Mt 22, 15-21)
Neste Evangelho, Jesus é colocado diante de uma armadilha pelos fariseus e pelos partidários de Herodes. Os primeiros achavam que os romanos eram invasores e, portanto, qualquer colaboração com eles seria uma traição à religião judaica; os segundos, por outro lado, defendiam que se pagasse tributos ao Império Romano. Ao questionarem a Cristo: “É lícito ou não pagar imposto a César?”, eles pretendiam “apanhar Jesus em alguma palavra”: se Ele respondesse que era lícito, desagradava aos fariseus; se dissesse que era ilícito, os herodianos podiam acusá-lo de estar contra César. Embora, neste episódio, Jesus consiga escapar da cilada armada contra Si, no fim das contas, os judeus condenaram-No à morte apresentando a Pilatos justamente esta acusação: “Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo, proibindo pagar os tributos a César...” [1].
A resposta de Nosso Senhor aos dois grupos, no entanto, é certeira. Percebendo “a maldade deles”, Ele pede que lhe tragam a moeda do imposto, cujas figura e inscrição são de César, e remata: “Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”.
Com isso, Nosso Senhor sublinha, em primeiro lugar, que César não é Deus, isto é, o poder político não é o poder divino. Com efeito, essa verdade aparentemente tão simples para nós não era tão óbvia aos homens daquela época. As ruínas da Cidade Eterna revelam que os cidadãos romanos prestavam culto “ao divino César”. A partir da religião cristã, no entanto, começou a surgir o testemunho dos mártires, que colocavam a sua consciência ao serviço de Deus, observando as palavras de São Pedro: “É preciso obedecer a Deus antes que aos homens” [2]. De fato, a expressão “liberdade de consciência” – comumente mal compreendida – significa que, se por um lado, a consciência do homem é livre das amarras e poderes humanos, por outro, está submissa à vontade de Deus, a única que pode determinar o bem e o mal, o certo e o errado. Tentar tomar para si o poder de determinar o bem e o mal – como o “super-homem”, de Nietzsche – é repetir a atitude de Adão e Eva, seduzidos pela serpente: “Sereis como Deus” [3]. Não há dúvidas de que o poder político é importante – “dai a César o que é de César” –, mas ele não obriga a consciência humana, sobre a qual impera o primado de Deus – “e a Deus o que é de Deus”.
Por isso, esta página do Evangelho, aparentemente tão simples, moldou, na verdade, toda a história do Ocidente. No início, os mártires cristãos mostraram, com o derramamento do próprio sangue, a força da liberdade diante do Estado totalitário. Com o passar do tempo, o Cristianismo tornou-se religião universal e firmou entre as pessoas a convicção de que o Estado não é divino e as pessoas são livres em sua consciência diante do poder político. Nesse ponto, contrastam a fé cristã e o islamismo. Enquanto os muçulmanos dão a sua vida para instaurar uma ordem política islâmica – vale lembrar que o ano zero do Islã é o ano 622 d.C., quando Maomé se tornou um chefe militar –, os cristãos creem que o Estado deve ser “dessacralizado”. Novamente, César não é Deus.
O que acontece hoje, porém, principalmente no Brasil, é que as pessoas, tendo se esquecido que é Deus quem deve reger as consciências, entregam-se cada dia mais a um Estado também cada vez mais totalitário. Foi o que denunciou o Cardeal Joseph Ratzinger – depois, Papa Bento XVI –, durante a Missa pro Eligendo Romano Pontifice, em 2005: “O relativismo (...) aparece como a única atitude à altura dos tempos hodiernos. Vai-se constituindo uma ditadura do relativismo que nada reconhece como definitivo e que deixa como última medida apenas o próprio eu e as suas vontades” [4]. Essa ditadura quer dizer que não existe nada sólido, nada fixo. Para subsistir, ela precisa eliminar Deus – afinal, se Ele criou tudo e rege tudo com as Suas próprias leis, a estrutura do mundo fica “engessada” – e a Sua Igreja – que é a única instituição que defende a existência da lei natural, pela qual o homem não pode transformar o mundo em uma “massinha de modelar”.
Veja-se, por exemplo, toda a confusão criada recentemente em torno da família. Quando Nosso Senhor ensina aos discípulos: “Moisés permitiu despedir a mulher, por causa da dureza do vosso coração. Mas não foi assim desde o princípio” [5], Ele está lembrando que, desde o começo, existe um plano de Deus para o casamento, plano que não pode ser alterado arbitrariamente pelo homem. Não importa quanto alarde se faça, a família está inscrita na estrutura da Criação: “Homem e mulher ele os criou” [6]. Se a Igreja deve ser compassiva e acolhedora com os homossexuais, não pode, no entanto, acolher o pecado e a desordem.
Por isso, quando alguns bispos da Igreja defendem uma malfadada abertura da Igreja em relação aos homossexuais, os poderosos do mundo aplaudem de pé. Afinal, se a Igreja renuncia ao “Evangelho da família” e à verdade de que ela foi criada por Deus, cai por terra a única instituição que se opõe ao poder total e totalizante dos “ditadores do relativismo”, a única instituição que lhes aponta o dedo e lembra que a verdade existe e eles, portanto, não são deuses.
O mundo moderno pede que a Igreja tenha mais “compaixão” com os homossexuais. Acontece que as bocas que fazem esse discurso untuoso e melado de falsa misericórdia são as mesmas que defendem os regimes socialistas de Fidel Castro, Stálin e Mao Tsé-Tung, que mataram mais homossexuais do que qualquer outro governo ou movimento da história do planeta. Na verdade, o que essas pessoas querem não é defender os homossexuais, mas apenas destruir a lei natural, a fim de tomar para si o poder total e usurpar, soberbamente, o lugar de Deus. A elas – e a nós, tentados a aderir ao relativismo e a uma falsa noção de misericórdia –, Nosso Senhor repete a Sua lição: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”.
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