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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 5,17-19)

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Não penseis que vim abolir a Lei e os Profetas. Não vim para abolir, mas para dar-lhes pleno cumprimento. Em verdade, eu vos digo: antes que o céu e a terra deixem de existir, nem uma só letra ou vírgula serão tiradas da Lei, sem que tudo se cumpra. Portanto, quem desobedecer a um só destes mandamentos, por menor que seja, e ensinar os outros a fazerem o mesmo, será considerado o menor no Reino dos Céus. Porém, quem os praticar e ensinar será considerado grande no Reino dos Céus”.

No Evangelho de hoje, Jesus nos diz que não veio abolir a Lei e os Profetas. O que isso quer dizer na prática? Em primeiro lugar, entendamos o que são a Lei e os Profetas. A Lei era, no Antigo Testamento, algo que impedia as pessoas de fazerem o mal; enquanto os Profetas, na verdade, eram algo que impulsionava as pessoas a fazerem o bem, através do anúncio de promessas futuras.

Então, Jesus veio não abolir isso, mas levá-lo à perfeição, ao cumprimento. Analisemos detalhadamente essas duas realidades.

Primeiro a Lei. Em primeiro lugar, nós vemos que as leis do Antigo Testamento podem basicamente dividir-se em três pedaços. Havia aquelas leis que estão na própria natureza das coisas. É a chamada lei natural, que não foi abolida. Por quê? Porque os Dez Mandamentos valem ainda hoje. Ora, a essas leis naturais, para serem realizadas no Antigo Testamento, Deus acrescentou dois outros capítulos.

Além da lei natural, havia, para o povo de Israel, as chamadas leis cerimoniais e as leis jurídico-processuais. Primeiro as leis cerimoniais. Elas foram abolidas, não porque Jesus as tenha apagado, dizendo: “Não valem mais”, mas porque seus objetivos já foram realizados. Ou seja: as cerimônias do Antigo Testamento eram uma prefiguração e um anúncio daquilo que viria, daquilo que Jesus iria realizar; portanto, uma vez que Jesus as realizou, não há por que ficar anunciando algo que já se concretizou.

Além das leis das cerimônias do Templo de Jerusalém, havia também outro capítulo, a parte judicial, aqueles preceitos. O povo de Israel, para conter sua maldade, precisava de punições bem claras: sentenças de morte, de apedrejamento, etc. Enfim, era a justiça humana que precisava ser realizada, mas Jesus vem levar isso à perfeição.

E como Ele fez isso? Com a misericórdia, assim como Ele fez, por exemplo, com a pecadora que foi trazida, amarrada e arrastada, até os pés dele na na esplanada do Templo. Jesus, com a misericórdia, vem trazer mais doçura, por isso vem realizar de forma mais plena o que antes, no Antigo Testamento, fora revelado imperfeitamente.

Essa é a parte da Lei. E a profecia? Quais são as partes da profecia que Jesus veio realizar? Em primeiro lugar, não sabíamos o significado de tantas coisas profetizadas no Antigo Testamento, como disse Jesus aos discípulos de Emaús: “Era necessário que Cristo padecesse tudo isso para entrar na sua glória”. As pessoas ficaram boquiabertas, porque liam o Antigo Testamento, mas não conseguiam entender isso. Por isso Jesus “abriu-lhes os olhos para que entendessem as Escrituras”.

Jesus estava cumprindo as profecias e mostrando que a promessa feita, por exemplo, a Abraão de ter uma grande descendência se estendia agora a todos os povos através da fé. Aconteceu a realização da profecia em que Deus previu: “Tirarei de vós o coração de pedra e colocarei um coração de carne”.

Então, veio um coração maravilhoso, o Coração de Cristo, para amar. Eis a realização plena da Lei e dos Profetas no preceito da caridade, do amor de Cristo: “Amai-vos como eu vos amei”. Então, o cumprimento derradeiro de tudo isso, quando Ele nos manda o Espírito Santo, é a nova Lei.

O Espírito Santo é derramado em nossos corações no dia de Pentecostes, festa judaica que celebrava o dia em que Moisés recebera a Lei no Sinai. Agora, em nossos corações, o Espírito Santo é a nova Lei, tornando efetiva a caridade de Cristo em nós. Assim, a Lei e os Profetas se realizaram.

COMENTÁRIO EXEGÉTICO

V. 17. Não penseis, como falsamente dizem alguns a meu respeito, que vim abolir (ϰαταλῦσαι), i.e., ab-rogar e tornar írritos ‘a Lei e os Profetas’, ou seja, a vontade divina expressa nas Sagradas Escrituras. Não vim para abolir, mas para dar-lhes pleno cumprimento (πληρῶσαι), i.e., para os aperfeiçoar. Com efeito, diz o Ps.-Crisóstomo, ‘não é o mandamento de Cristo contrário à Lei, senão mais amplo do que ela. O mandamento de Cristo inclui em si toda a Lei, mas não ao revés. Quem cumpre, pois, os mandamentos de Cristo, tacitamente cumpre neles também os da Lei’ (Op. imp.).

Dubium: De que modo deu Cristo pleno cumprimento à lei? De quatro formas: 1. completou-lhe a parte dogmática esclarecendo alguns pontos da Revelação e aumentando-a em muitos outros (e.g., revelação plena da Trindade de pessoas em Deus); — 2. completou-lhe a parte ética, pois a elevou a maior perfeição, sobretudo quanto aos atos internos (e.g., equiparação entre o adultério consumado e o de simples desejo), interpretou-a de forma perfeitíssima, libertando-a das minúcias farisaicas e, acima de tudo, deu aos homens graça abundante para obedecerem ao espírito de suas prescrições; — 4. completou-lhe a parte cerimonial substituindo o que nela eram apenas figuras e símbolos pela realidade que prefiguravam (e.g., instituição da Eucaristia); — 3. enfim, completou os profetas além de toda expectativa, já que era Ele mesmo, não só quem Moisés havia anunciado, mas o próprio Filho de Deus encarnado.

V. 18. Em verdade, eu vos digo, antes que o céu e a terra deixem de existir, i.e., antes que este mundo deixe o seu estado atual e decaído e seja elevado a um estado novo e glorioso, após a ressurreição dos mortos (cf. 2Pd 3,13) no Fim dos Tempos, nem uma só letra (um iota [י = yodh], menor letra do alfabeto hebraico) ou vírgula (ϰεραία) serão tiradas da lei, i.e., perderão vigor, sem que tudo se cumpra, quer dizer, antes que se tenham cumprido de fato todas as profecias e disposições da economia salvífica. O texto de Lc, neste ponto, parece um pouco mais claro: Mais facilmente, porém, passará o céu e a terra do que se perderá uma só letra da lei (16,17). — V. 19. Portanto, quem desobedecer a um só destes mandamentos, por menor que seja, i.e., quem negligenciar ou transgredir (para alguns, ‘quem pretender ab-rogar’) algum dos mandamentos da nova Lei, por menor que seja ou por menos importante que pareça a matéria de que trata (alusão ao iota e à vírgula do v. anterior), e ensinar os outros a fazerem o mesmo, será considerado o menor no reino dos céus etc. — ‘O menor’ (ὁ μιϰρότερος, ὁ ἐλάχιστος), ‘grande’ (ὁ μέγας), ‘o maior’ (ὁ μείζων), termos frequentes na literatura rabínica para significar a diferente sorte dos eleitos no futuro reino messiânico.

Conclusão: A nova Lei da perfeição evangélica supõe e eleva, como a graça à natureza, os preceitos de lei natural, quer dizer, os mandamentos prescritos no Decálogo. Logo, o projeto de vida que o Senhor propõe já no início do sermão na montanha é o de uma vida de justiça não somente legal, limitada ao suficiente para ser salvo, mas também espiritual, perfeita, generosa.

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