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Em que sentido Maria é sempre Virgem?

O que a Igreja pretende nos ensinar quando diz que Maria é “sempre Virgem”? Que relevância tem o dogma da virgindade perpétua de Nossa Senhora no conjunto da doutrina católica? E quais são, além da integridade física, os outros dois tipos de virgindade que os Padres, Doutores e teólogos reconhecem em Maria Santíssima?

Texto do episódio
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“Na fulgidíssima coroa da maternidade divina”, escreve um insígne mariólogo, “posta por Deus sobre a cabeça de Maria, refulgem muitas e delicadas pedras preciosas; mas a principal delas, que resplandece mais do que todas as outras, é a pérola da virgindade” [1]. Mas o que, afinal de contas, nos quer ensinar a Igreja Católica quando se refere a Maria SS. com o título de “a sempre Virgem”?

1. Virgindade corporal. — A primeira coisa que nos diz este dogma, no qual se contém um dos mais belos privilégios marianos, é a virginidade material, também chamada virginitas corporis, de Nossa Senhora. Trata-se de um mistério realizado por Deus no corpo de Maria, em virtude do qual ela foi e se manteve sempre e perfeitamente virgem, antes, durante e depois do parto, sem que jamais se lhe tenha rompido a membrana do hímen. Esta perfeitíssima integridade física que Deus quis preservar milagrosamente no corpo de sua Mãe foi e ainda é um sinal do mistério ainda maior que nela se realizou: a Encarnação do Verbo divino.

a) Antes do parto. — Assim sendo, que Maria tenha permanecido virgem antes do parto significa que Cristo foi nela concebido sem intervenção alguma de varão (ou seja, por meio de uma relação sexual normal), mas por obra exclusiva do Espírito Santo, isto é, pelo poder de Deus, para quem nenhuma coisa é impossível (cf. Lc 1, 37). Com efeito, a concepção virginal é um meio claríssimo de pôr em evidencia a divindade daquele que é concebido. Pois se Maria, enquanto Mãe, é prova de que Cristo é homem igual a nós, enquanto é Mãe e Virgem ao mesmo tempo, é prova de que Ele é Deus acima de nós.

b) Durante o parto. — Além disso, ensina a Igreja Católica que Maria permaneceu virgem durante o parto, ao longo de todo o processo em que deu Cristo à luz em Belém. Assim o declara o Magistério da Igreja, assim o testemunham os Santos Padres e a Liturgia, assim o corrobora a razão iluminada pela fé. De fato, que poderia haver de mais estranho e indigno da bondade divina se Aquele que veio livrar a humanidade da corrupção do pecado corrompesse, em seu parto singular, a integridade virginal da própria Mãe? Aliás, que valor teria, como indício visível da divindade de Nosso Senhor, a integridade corporal de Maria, se após o parto ela deixasse de ser virgem?

c) Depois do parto. — Enfim, a Igreja nos manda crer que Maria permaneceu virgem depois do parto, ou seja, que nunca teve relações sexuais nem, portanto, outros filhos além de Jesus. Afirmar o contrário seria não só desconhecer as Escrituras, que em lugar algum dão margem a uma interpretação oposta ao dogma católico, mas ainda uma grande injúria a Cristo, que, sendo o Unigênito do Pai, devia também ser o unigênito da Mãe; ao Espírito Santo, que fez do útero da Virgem um sacrário intocável, ao qual só Deus quis ter entrada; a Nossa Senhora, imputando-lhe a ousadia de não se ter contentado com um filho tão bom como Cristo e a temeridade de destruir a virgindade que milagrosamente lhe fora conservada; e, enfim, a S. José, que teria cometido a terrível presunção de tocar naquela em que, por revelação do Anjo, sabia ter-se encarnado o Filho do Altíssimo (cf. S. Tomás de Aquino, STh III 28, 3 c.).

2. Virgindade dos sentidos. — Além desta virgindade material ou física, crêem os cristãos que Nossa Senhora foi também sempre virgem em seus afetos e desejos, com uma virgindade chamada em teologia virginitas sensus. Por ser Imaculada, Maria esteve livre das sequelas do pecado original, entre as quais se conta a desordem da vontade e dos nossos apetites sensitivos. Isso significa que Maria nunca experimentou um desejo, um pensamento sequer, ainda que involuntário, que fosse menos honesto e digno de sua altíssima condição de Mãe de Deus. Nela, tudo era perfeito, tudo redundava em amor a Deus, porque nela não havia aquela inclinação para o mal que, segundo a nossa tradição teológica, recebe o nome de fomes peccati [2].

3. Virgindade da alma. — Por fim, Maria possui também uma virgindade perpétua de espírito, chamada virginitas mentis, que compreende, de um lado, a disposição permanente de abster-se de todo e qualquer prazer venéreo, como forma de consagrar-se mais perfeitamente a Deus (neste ponto, a sua virgindade espiritual coincide com a das outras virgens consagradas que tanto honram a Igreja com o seu exemplo angélico de entrega a Cristo); e, de outro, uma completa pureza de alma, que fazia de seu Coração Imaculado uma fonte única e irrepetível de amor a Deus, sem mescla alguma de imperfeições. Nisto consiste a parte mais importante e mais essencial da virgindade de Nossa Senhora, porque, sem ela, pouco ou nenhum valor teria, só por si, a simples integridade física.

Para complemento desta questão, vejamos apenas dois exemplos tomados do Magistério eclesiástico mais antigo que atestam claramente a fé da Igreja na virgindade perpétua de Nossa Senhora. Assim se expressa o Concílio de Latrão, celebrado em 649, no cânon n. 3 (DH 503): “Se alguém não professa […] que depois do parto permaneceu inviolada a sua [de Maria] virgindade, seja condenado”. E, de forma ainda mais explícita, fala o Papa Paulo IV, ao condenar na bula “Cum quorumdam hominum” (DH 1880), de 1555, a seita dos unitários, que afirmavam que “a beatíssima Virgem Maria não […] permaneceu sempre na integridade virginal, a saber: antes do parto, no parto e perpetuamente depois do parto” (ante partum scilicet, in partu et perpetuo post partum).

Referências

  1. Gabriel M. Roschini, Mariologia. 2.ª ed., Roma: Angelus Belardetti, vol. 3 (= t. 2, 2.ª parte), 1948, p. 239.
  2. Cf. Id., p. 240, nota 1; L. Ott, Manual de Teología Dogmática. Trad. esp. Constantino R. Garrido. 5.ª, Herder: 1966, p. 321.
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