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Christo Nihil Præponere"A nada dar mais valor do que a Cristo"
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Texto do episódio
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Mas o que faz Jesus vendo-se alvo de tantos ultrajes? O que diz? Intercede por aqueles que assim o maltratam: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem” (Lc 23, 34). Jesus orou então também por nós, pecadores. Por isso, voltados para o Eterno Pai, digamos com confiança: 

— Ó Pai, ouvi a voz deste Filho querido que vos pede para perdoar-nos. Um tal perdão é sem dúvida grande misericórdia com relação a nós, que não o merecíamos; mas é justiça com relação a Jesus Cristo, que superabundantemente satisfez por nossos pecados. Vós vos obrigastes, pelos méritos de Jesus, a perdoar e a receber na vossa graça quem se arrepende das ofensas que vos fez. Ó meu Pai, eu me arrependo de todo o meu coração de vos ter ofendido, e em nome desse vosso Filho vos peço perdão: perdoai-me e recebei-me na vossa graça.

Domine, memento mei cum veneris in regnum tuum — Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu reino (Lc 23, 42).

Assim foi que se dirigiu o bom ladrão a Jesus agonizante, que lhe respondeu: “Em verdade eu te digo: hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23, 43). Assim se cumpriu o que Deus já havia dito por Ezequiel: que quando um pecador se arrepende de suas culpas, Deus lhe perdoa e se esquece das ofensas que lhe foram feitas: “Se, porém, o ímpio fizer penitência... não me recordarei mais de todas as suas iniquidades” (Ez 18, 21).

— Ó piedade imensa, ó bondade infinita de meu Deus, quem deixará de vos amar? Sim, meu Jesus, esquecei-vos das injúrias que vos fiz, e recordai-vos da morte tão cruel que por mim sofrestes: e por ela dai-me o vosso reino na outra vida, e na presente fazei reinar em mim o vosso santo amor. Que somente o vosso amor domine o meu coração, e seja ele o meu único senhor, meu único desejo, meu único amor. Ó feliz ladrão, que mereceste acompanhar com paciência a morte de Jesus! E feliz de mim, ó meu Jesus, se tiver a sorte de morrer amando-vos e unindo a minha morte à vossa santa morte.

Stabant autem juxta crucem Jesu mater eius etc. — Estava, porém, ao pé da cruz de Jesus, sua Mãe (Jo 19, 25).

— Considera, minha alma, Maria ao pé da cruz, que transpassada de dores e com os olhos fixos no amado e inocente Filho, contempla as crudelíssimas dores externas e internas no meio das quais ele morre. Ela está toda resignada e em paz, oferecendo ao Eterno Pai a morte do Filho por nossa salvação. Mas muito a afligem a compaixão e o amor. 

Oh Deus! Quem não se compadeceria de uma mãe que se encontrasse junto ao patíbulo do filho que lhe está morrendo diante dos olhos?

Mas aqui devemos considerar quem seja essa Mãe e quem seja esse Filho. Maria amava esse Filho imensamente mais do que todas as mães amam os seus filhos. Ela amava Jesus por ser ao mesmo tempo seu Filho e seu Deus: Filho sumamente amável, incomparavelmente belo e santo, Filho que lhe fora sempre respeitoso e obediente, Filho que tanto a amara e que desde a eternidade a escolhera por mãe. E essa Mãe foi quem teve de ver morrer de dores um tal filho, diante de seus olhos, naquele lenho infame, sem que lhe pudesse dar o menor alívio. Ao contrário, sua presença aumentava o tormento do Filho ao vê-la padecer assim por seu amor. 

Ó Maria, pelas dores que sofrestes na morte de Jesus, tende piedade de mim e recomendai-me a vosso Filho. Ouvi como Ele, na pessoa de São João, entrega-me a vós: “Mulher, eis aí teu filho” (Jo 19, 26).

Et circa horam nonam clamavit Iesus voce magna, dicens: Deus meus, Deus meus, ut quid dereliquisti me? — E perto da hora nona, clamou Jesus em alta voz, dizendo: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? (Mt 27, 46).

Jesus agonizando na cruz, com o corpo estarrecido de dor e o espírito inundado de aflição (pois que aquela tristeza que o assaltou no horto o acompanhou até ao último suspiro de sua vida), procura alguém que o console, mas não encontra ninguém, como já o predissera Davi: “Esperei alguém que me consolasse e não o encontrei” (Sl 68, 21). Olha para sua Mãe e esta não o consola; antes, mais o aflige com sua presença. Olha ao redor e vê que todos se mostram como seus inimigos. 

Vendo-se assim privado de toda consolação, volta-se para seu Eterno Pai a pedir-lhe alívio. Porém, vendo-o coberto com todos os pecados dos homens, pelos quais Ele estava na cruz a satisfazer sua justiça divina, o Eterno Pai também permite que ele morra consumido de dores. E foi então que Jesus, para exprimir a veemência de seu sofrimento, gritou dizendo: “Meu Deus, meu Deus, por que até vós me abandonais?” A morte de Jesus foi, pois, uma morte mais atroz que a de todos os mártires, pois que foi uma morte inteiramente desolada e privada de todo o alívio.

Mas, ó meu Jesus, se vos oferecestes espontaneamente a uma morte tão dura, por que então vos lamentais? Ah, eu vos compreendo, vós vos lamentais para nos fazer compreender a pena excessiva com que morreis, e para nos dar, ao mesmo tempo, ânimo para confiar e nos resignarmos no tempo em que nos virmos desolados e privados da assistência sensível da graça divina.

— Meu doce Redentor, esse vosso abandono me faz esperar que Deus não me abandonará, apesar de tê-lo traído tantas vezes. Ó meu Jesus, como pude viver tanto tempo esquecido de vós? Agradeço-vos por vos não terdes esquecido de mim. Suplico-vos que me façais recordar sempre da morte cruel que sofrestes por meu amor, para que eu não me esqueça mais de vós e do amor que me consagrastes. 

Sabendo, entretanto, o Salvador que seu sacrifício já estava consumado, disse que tinha sede e os soldados puseram-lhe nos lábios uma esponja embebida em vinagre: “Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir ainda a Escritura, disse: Tenho sede... Eles lhe chegaram à boca uma esponja ensopada em vinagre” (Jo 19, 28). A Escritura que devia cumprir-se era a profecia de Davi: “E na minha sede deram-me vinagre para beber” (Sl 68, 22). 

— Mas, Senhor, vós não vos queixais de tantas dores que vos arrebatam a vida, e vos lamentais da sede? Ah, a sede de Jesus era diferente daquela que pensamos. A sede que ele tem é o desejo de ser amado pelas almas pelas quais morre. 

— Logo, ó Jesus meu, vós tendes sede de mim, verme miserável; e eu não terei sede de vós, bem infinito? Ah, sim, eu vos quero, eu vos amo e desejo agradar-vos em tudo. Ajudai-me, Senhor, a expulsar de meu coração todos os desejos terrenos, e fazei que em mim reine o único desejo de agradar-vos e fazer a vossa vontade.

Ó santa vontade de Deus, vós que sois a feliz fonte que saciais as almas enamoradas: saciai-me também, e sede o alvo de todos os meus pensamentos e de todos os meus afetos.

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