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Direção Espiritual: a Jornada

É hora de arregaçar as mangas!

Muitos nos escrevem pedindo conselhos bem concretos. É para suprir essa lacuna que iniciamos esse curso, uma “oficina de santidade” por ser um curso de princípios básicos de direção espiritual, no qual os alunos terão a oportunidade de pôr em prática o que é proposto em cada aula.

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Iniciamos mais um curso, que, na realidade, não é um curso “mais”. É algo inédito no site. Até agora, nossos cursos tinham por objetivo o conhecimento, por isso são todos “teóricos”, por assim dizer. Sim, têm eles uma finalidade também prática porque, se iluminamos a inteligência, é para convidar a vontade à mudança de vida. Afinal de contas, esse site é um apostolado, o que quer dizer que sua finalidade é mudar vidas e aproximar as almas de Deus.

O curso que iniciamos hoje foi apelidado de “oficina de santidade” porque há nele algo bem específico. Já fizemos dois cursos de Engenharia da Santidade, que para muitos foi uma experiência quase de “revelação”. Muitos nos escreveram, dizendo: “Padre, agora sei o que é preciso fazer e o que significa ser santo!” Está iluminada a inteligência. Agora, muitos outros nos têm escrito para pedir conselhos práticos e concretos, próprios de uma direção espiritual.

É para suprir essa lacuna que iniciaremos esse curso, uma “oficina de santidade” por ser um curso de princípios básicos de direção espiritual, no qual os alunos terão a possibilidade de colocar em prática o que é proposto em cada aula. São conselhos práticos, para que o fiel transforme sua vida e entre finalmente no caminho da santidade.

Para isso, precisamos antes recordar alguns princípios que, se não estiverem claros desde o início, ficarão para trás. Primeiro: que é a santidade? 

Comecemos lembrando que somos chamados por Deus a participar de sua vida divina no céu. Em outras palavras, fomos chamados a viver uma vida que não é a nossa, por mais que tivéssemos um ideal “melhorado” de vida humana. 

As falsas religiões, quando falam de “vida eterna” de “céu” ou de “paraíso”, o que terminam pintando é este mundo “melhorado” — uma espécie de terra sem males, um lugar paradisíaco onde todos estão muito bem, obrigado. A diferença é que esse novo “jardim do Éden” não estaria aqui na terra, como o de Adão e Eva, mas “no andar de cima”, como às vezes dizem as falsas doutrinas.

Para nós, católicos, isso não é salvação. O que Deus quer para nós não é que vivamos essa vida melhorada, reformada, recauchutada. O que Ele quer é que vivamos a vida dele, ou seja, a vida eterna. O projeto de Deus é que vivamos a vida do Pai, do Filho e do Espírito Santo. 

Mas isso não começa no céu. Deus quer que nós, criados à sua imagem e semelhança, comecemos já aqui a agir divinamente. E é nisto que consiste a santidade. Trata-se de uma transformação interior graças à qual, já neste mundo, a alma se deixa transformar pela graça e começa a agir divinamente, isto é, com um princípio de vida que não é humano. 

Sim, os atos dos santos são divinos, e não estamos falando de milagres. Caminhar sobre as águas, levitar, curar enfermos, ressuscitar mortos etc. não é, no sentido mais profundo, agir divinamente. Nada disso, aliás, é sinal certo de santidade. São apenas carismas, acontecimentos extraordinários, fora do comum. Quando falamos de um santo, estamos falando, na verdade, de um ser humano que ama como Deus ama

Somos imagem e semelhança dele porque temos inteligência e vontade. Ora, ser santo é começar a enxergar com luzes sobrenaturais a verdade de Deus, quer dizer, com uma forma de enxergar da qual não somos capazes pela luz puramente natural da razão. Uma vez que a luz sobrenatural nos iluminou, ela nos vai transformando pouco a pouco: inicialmente ela só ilumina, depois aquece e, quanto mais abrasa a vontade, mais nos transforma a alma.

Daí a pureza com que viveram, por exemplo, um São Luís Gonzaga, um São Domingos Sávio, uma Santa Maria Goretti ou uma Santa Teresinha. Neles se vê uma candura em que não há a mínima mancha de impureza sexual. Daí a paciência extraordinária dos grandes mártires, em quem não vemos nunca pessoas irritadas e raivosas, invocando maldições contra os algozes, muito pelo contrário. Santo Estêvão, configurado a Cristo, vê os céus abertos e diz: “Senhor Jesus, perdoai aos meus algozes” (cf. At 7, 60). São Lourenço, diante do fogo da grelha, heroicamente vê ali uma ocasião de amar Jesus. Santo Inácio de Antioquia suplica aos cristãos romanos que o deixem morrer por Cristo “porque, se as feras não me quiserem devorar, eu mesmo irei obrigá-las a levar-me à morte por Cristo” [1]. 

São atos heróicos e sublimes de quem quer viver a vida de Cristo, quer amar como Jesus amou! Se Ele morreu na Cruz, também eu quero morrer na cruz por Ele; se Ele se entregou por mim, também eu quero me entregar por Ele. É amor, e amor sobrenatural, um amor de paciência, de perdão, como o de Santa Rita, que perdoou ao assassino do marido e quis, com pleno desapego, levar os filhos a viver o mesmo perdão! Eis os atos extraordinários dos santos, atos que um ser humano não é capaz de fazer com suas próprias forças! Há neles algo mais, um outro princípio de ação. 

Mas o que devemos fazer na prática para que Deus comece a realizar em nós essa transformação? Por onde começar a tirar os empecilhos? Essa é a finalidade do curso: superar as barreiras, para que Deus comece a agir cada vez mais em nós, transformando-nos nos santos que somos chamados a ser.

O Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática Lumen Gentium, fala da vocação universal dos fiéis à santidade. Em outras palavras, não existem “duas categorias” de cristãos: de um lado, uma grande massa de predestinados por Deus à salvação através do purgatório, almas que nunca serão santas neste mundo, mas somente no céu depois do purgatório; de outro, uma categoria pequena, diminuta, privilegiada, dos chamados a ser santos já nesta vida. O Concílio Vaticano II deu um basta nisso, trazendo para o Magistério o que há séculos já era pregado pela Igreja e fora sempre a convicção de santos e Doutores como Santa Teresa d’Ávila, São Francisco de Sales e São João Bosco, todos grandes místicos que entenderam a vocação universal à santidade. 

Nesse curso, queremos tomar o aluno pela mão e conduzi-lo passo a passo, como um tutor que orienta uma criança, dizendo-lhe: “Olhe, há essa tarefa aqui. Faça isso, depois iremos para o segundo passo, depois para o terceiro” etc. Juntos, então, iremos trilhar o caminho que conduz à santidade.

Talvez alguém esteja pensando: “Mas, Pe. Paulo, que pretensão é essa a do senhor! Que coisa medonha… Como o senhor quer ‘ensinar’ santidade? Por acaso o senhor lá é santo para saber o caminho da santidade? É o senhor mesmo quem está precisando se converter e ser santo, antes de querer ajudar outros a trilhar o caminho!” 

Sim, com toda a razão, é verdade; mas Santa Teresa d’Ávila, ao dar um conselho às suas monjas no Caminho de Perfeição, diz assim: “Se tiverdes de arranjar um confessor, um diretor espiritual ou um conselheiro, preferi o douto ao santo” [2]. Por quê? Porque às vezes o diretor ou o confessor pode até ser muito santo, mas também um pouco “ignorante”, incapaz de orientar os dirigidos no caminho que devem trilhar. Por isso é melhor contar com alguém que, embora não seja santo, é ao menos virtuoso, busca a santidade e sabe qual é o caminho. 

Esse é o conselho de Santa Teresa d’Ávila. Mas como não temos a pretensão nem mesmo de ser “doutos”, queremos nos colocar como alunos ao lado dos outros alunos, deixando-nos guiar juntos por um Doutor da Igreja, um diretor espiritual canonizado, santo de sétima morada, proclamado pelos papas como um caminho seguro, uma doutrina firme, forte e fiel ao ensinamento da Igreja. Quem será o nosso diretor espiritual, esse Doutor e santo que nos irá tomar pela mão para nos guiar passo a passo? É São Francisco de Sales

São Francisco de Sales é um milagre da Providência. Ele, santo e douto, foi criado bispo de uma diocese em que a maior parte das pessoas eram protestantes. Ele, que não deixava ocioso o Espírito Santo, começou a dirigir as almas à distância, dando-lhes várias orientações espirituais no caminho da santidade. Começou a dirigir uma alma, à qual escrevia cartas: “Faz isso, faz aquilo”; depois, a uma outra dirigida: “Faz isso aqui e aquilo outro”. Como visse que os conselhos se repetiam por ser o caminho o mesmo para todos, São Francisco, seguindo o conselho de alguns amigos, organizou suas cartas e conselhos num livro conhecido de todos, a Filoteia, também chamada Introdução à Vida Devota.

Alguém já deve estar pensando: “Então é sobre isso o curso? É sobre a Filoteia?” Sim e não. Sim, porque iremos seguir os passos de São Francisco de Sales, que traçou para nós um caminho em seu livro. Ele é quem nos irá conduzir. E não, porque nós vamos fazer isso juntos. Há muita gente que tem em casa uma edição da Filoteia largada na prateleira, e há muito mais gente que acha que o livro é uma espécie de Imitação de Cristo, ou seja, um livro de meditação que se pode abrir e ler a esmo… 

Com a Imitação de Cristo até se pode fazer isso porque não é um livro pensado ordenadamente. A ordem interna da Imitação é um pouco frouxa, de modo que seus capítulos podem ser tratados como fichas, fichas que podemos jogar para cima, escolher a que quisermos e lê-la. Com a Filoteia não é assim. Nela, quem fala é realmente um sábio e santo diretor espiritual que foi conduzindo passo a passo as almas para a santidade. 

São Francisco podia conduzi-las porque era santo, mas também porque era douto. Juntos, queremos viver essa “aventura”, uma aventura prática que vai custar, sim, transformação de vida; mas não é uma aventura “aventurosa” porque o caminho é seguro, já foi trilhado, está bem marcado, é certo e foi vivido por um grande Doutor da Igreja, um homem que entende de almas e da operação da graça de Deus. A Filoteia, portanto, será o manual dessa “oficina”. 

Vamos lê-la juntos. (O mestre é São Francisco de Sales, eu serei o tutor, o bedel, o repetidor, que vai, junto com os alunos, ser também o primeiro a aprender. Como tenho um pouco mais de experiência tanto na direção de almas como no estudo da ascética e mística, serei, digamos assim, o “leitor culto”, aquele que vai mostrar o sentido de cada capítulo, indicar como eles se organizam e concatenam, tudo passo a passo.)

Por isso, não queimemos etapas! Uma coisa depois da outra, e é importante colocá-las todas em prática. Quem tem a Filoteia em casa como um livro mais na biblioteca poderá desempoeirá-la e finalmente enxergar o tesouro escondido que ali estava.

Essa, aliás, foi minha própria experiência. Eu via esse livrinho na biblioteca desde os tempos de seminarista, até que, na direção espiritual, comecei a me perguntar: “De onde as pessoas estão aprendendo certas coisas?” De repente vinha um penitente fazer uma confissão geral, e eu lhe perguntava: “De onde veio a ideia de fazer uma confissão geral?” “Ah”, respondia ele, “eu vi na Filoteia”. A outro dirigido espiritual perguntei uma vez: “Como você começa a oração?” Ele respondeu: “Primeiro eu me coloco na presença de Deus, que eu procuro de tal e qual maneira…”. Tudo estava na Filoteia! Na própria experiência prática com os penitentes e os dirigidos espirituais, comecei a ver que ali havia um tesouro, uma pérola deixada de lado por mim e certamente por muitos. Queremos por isso seguir passo a passo esse santo Doutor, experiente pastor de almas.

Peçamos, portanto, a graça de Deus. Afinal, não se trata de pelagianismo, como iremos insistir muito durante o curso todo. Que é pelagianismo? A ideia de que é possível ser santo por pura ação e esforço humanos. Não, trata-se de colocar-se generosamente à disposição da ação da graça. É isso que São Francisco de Sales ensina e é nisso que ele é mestre.

Quando São João Bosco quis iniciar sua Congregação, ele a intitulou de Salesiana por várias razões. São Francisco de Sales, de onde vem a palavra “salesiano”, foi inspiração para Dom Bosco, primeiro, porque era venerado como padroeiro do clero na região do Piemonte que fazia fronteira com a parte da França em que São Francisco exercera seu ministério; segundo, porque foi um grande pedagogo, de uma doçura, candura, mansidão e humildade capazes de cativar qualquer um. Ele não enfrentava os adversários com raiva, mas os transformava pela doçura, atraindo-os com uma gota de mel, e não com um barril de azeite. 

O que inspirou São João Bosco foi a capacidade pedagógica com que São Francisco de Sales sabia atrair as almas para a santidade. Foi dele que herdou a noção de que a santidade é, sim, para todos, não para um pequeno grupo de eleitos. Foi na escola de São Francisco de Sales, seguindo seu diretor espiritual, São José Cafasso, que Dom Bosco começou sua obra de santificação dos jovens. Esperamos que esse curso — na verdade, uma “oficina de santidade” — seja para todos uma ocasião de transformação, especialmente para os mais jovens. 

Que São João Bosco e São Francisco de Sales nos coloquem a todos no caminho da santidade! Que possamos descobrir a grandeza e a preciosidade desse Doutor da Igreja! Em 2021, iremos iniciar em dezembro um ano salesiano em comemoração dos 400 anos da morte de São Francisco de Sales. Será um ano de preparação. Vamos esquentando os motores e deixando que esse grande mestre nos conduza. Veremos a diferença no dia a dia, mas só descobriremos de verdade o que foi esse curso no céu, quando virmos plenamente a transformação que a graça de Deus operou em nós. Arregacemos as mangas. É oficina: mãos à obra!

Nota

  1. Condenado às feras durante o governo de Trajano, Santo Inácio de Antioquia foi enviado a Roma em 110 (ou 108) e, uma vez aprisionado, à espera de receber a palma do martírio, escreveu um conjunto de sete cartas endereçadas às igrejas da Ásia. Uma delas está dirigida especialmente aos romanos, cuja igreja “preside às demais na caridade”. Nela, Inácio roga aos fiéis de Roma que não intervenham em seu processo, deixando-o ser entregue às feras, já que é morrendo em suas presas que ele espera chegar ao Deus da vida: “Sou o trigo de Cristo”, escreve, “e oxalá venha a ser moído nos dentes das feras para me tornar pão imaculado. Que eu possa imitar a Paixão do meu Senhor. Só agora sinto que começo a ser verdadeiro discípulo”. E acrescenta: “Permiti que eu receba a luz pura. Quando eu aí chegar”, para ser morto e triturado, “então serei homem de verdade. […] Desejo o pão de Deus, que é a carne de Cristo; e por bebida o seu Sangue, que é amor incorruptível”.
  2. A Santa Madre fala em mais de um lugar a esse respeito. No Caminho de Perfeição, aconselha, “a quem for priora”, “que procure sempre [...] a autorização para que ela e todas possam tratar, comunicando o que lhes vai na alma, com pessoas letradas, não se restringindo aos confessores, em especial se estes últimos, embora muito bons, não forem instruídos. O conhecimento é muito importante para tudo esclarecer” (V 2). Em seu Livro da Vida, diz: “Há quem pense que os letrados não servem para pessoas de oração se não seguirem o espírito. Já falei que o mestre espiritual é necessário; se, contudo, este não for instruído, há aí um grande inconveniente. Ajuda muito relacionar-se com pessoas instruídas; se forem virtuosas, mesmo que não sejam espirituais, trazem proveito, e Deus fará com que entendam o que precisam ensinar e até as tornará espirituais para que nos ajudem” (XIII 19).
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