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Christo Nihil Præponere"A nada dar mais valor do que a Cristo"
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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 8,16-18)

Naquele tempo, disse Jesus à multidão: “Ninguém acende uma lâmpada para cobri-la com uma vasilha ou colocá-la debaixo da cama; ao contrário, coloca-a no candeeiro, a fim de que todos os que entram vejam a luz. Com efeito, tudo o que está escondido deverá tornar-se manifesto; e tudo o que está em segredo deverá tornar-se conhecido e claramente manifesto. Portanto, prestai atenção à maneira como vós ouvis! Pois a quem tem alguma coisa, será dado ainda mais; e àquele que não tem, será tirado até mesmo o que ele pensa ter”.

I. Reflexão

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Meus queridos irmãos e irmãs, hoje celebramos a memória de Santo André Kim Taegon, presbítero, Paulo Chong Hasang e seus companheiros mártires. É a festa dos mártires coreanos, e o Evangelho de hoje é a sequência do Evangelho que nós meditávamos sábado passado. Ou seja, no sábado passado, Jesus nos falou do semeador que saiu a semear, e nós vimos que a Palavra de Deus cai em nosso coração, e nós precisamos frutificar. Para isso, há vários passos: nós precisamos realmente acolher a Palavra de Deus com a inteligência, depois abraçá-la com a vontade, querendo mudar de vida, mas depois há que ter paciência, até que a gente consiga reordenar as coisas que estão dentro de nós, e assim começamos a dar maior fruto espiritual. (Se você não assistiu à homilia do sábado passado, eu recomendo a você dar uma “olhadinha” na homilia do dia 18 de setembro.)

Então, seguindo este ensinamento que Jesus colocou lá no sábado passado, Ele agora diz: “Ninguém acende uma lâmpada para cobri-la com uma vasilha ou colocá-la debaixo da cama; ao contrário, coloca-a no candeeiro, a fim de que todos os que entram vejam a luz”. Então, veja só. Deus, com a sua Palavra, vem para iluminar. Gente, nós não podemos ficar escondendo a Palavra de Deus! “Esconder a Palavra de Deus”, aqui, em primeiríssimo lugar, você tem de aplicar isso a você antes de o aplicar aos outros. É que nós ficamos escondendo a Palavra de Deus de nós mesmos!

Deus entra com a sua luz dentro de nós, e nós precisamos colocar tudo isso debaixo do olhar de Deus. Vejam, algumas pessoas às vezes não se dão conta de que, diante de Deus, nós não podemos fazer “teatro”; diante de Deus, não há condições de a gente fazer “faz de conta”. A pessoa vai rezar, meditar a Palavra de Deus, mas o que é que ela faz? Ela tem “reserva técnica”. Há áreas da vida (áreas de sua vida afetiva, de sua vida econômica, de sua vida familiar…), há áreas em que você diz: “Não. Isso não. Jesus, aqui não”.

Mas, gente, a luz de Deus não pode ser coberta pela vasilha! Você tem de deixar essa luz iluminar você por dentro, mesmo que isso seja difícil e doloroso. Jesus prossegue, dizendo: “Com efeito, tudo o que está escondido deverá tornar-se manifesto; e tudo o que está em segredo deverá tornar-se conhecido e claramente manifesto”. Então, veja só: como, ou que pretensão é essa que você tem de querer enganar a Deus, ou de esconder coisas de Deus, de ter essas reservas técnicas e dizer: “Jesus, vamos tratar desse assunto aqui, mas desse aqui não”? Mas nunca que a Palavra de Deus vai iluminar você desse jeito! A semente não vai dar fruto. Você precisa ter uma transparência extraordinária diante de Deus. Por quê? Porque você sabe que você será julgado por Ele, e isso é uma das maiores consolações que nós temos na vida. É alegria: nós não seremos julgados nem por nós mesmos nem por nossos irmãos; nós seremos julgados por um Juiz extraordinariamente justo e bom.

Então, um dia, Jesus virá. Quando Ele vier!… Está escrito em um hino da Igreja chamado “Dies irae”, que diz assim: “Judex ergo cum sedebit, quidquid latet apparebit”, “Quando então o Juiz se sentar para julgar, o que está escondido vai aparecer”. Ou seja: o luzeiro de Cristo, a luz de Cristo vai iluminar todo ser humano no mais íntimo do seu coração, em todas as coisas. Então, vamos desde já viver debaixo dessa luz! Não queira cobrir a luz de Cristo com um alqueire, com uma coisa abafando aquilo que, na verdade, é a luz de Cristo, que quer também aquecer o seu coração. Não o vá cobrir com uma vasilha. A luz de Cristo quer iluminar você.

Então, o que é que você tem de fazer na prática? Na prática, quando você for rezar, quando você for meditar a Palavra de Deus, quando você for fazer o seu exame de consciência, se dê conta: Deus conhece você e vê em você as coisas mais profundamente do que você é capaz de as ver. E confie nisso, como quando você vai ao médico. Se você confia no médico, você o deixa abrir a ferida, mexer no curativo, tocar nos pontos dolorosos. Por quê? Porque o médico é bom, é competente e vai fazer bem a você. Não fique fazendo reservas técnicas, mas se coloque diante de Cristo. A gente tem de entender que as pessoas fogem da verdade. Isso é uma das coisas mais estranhas: a gente enxerga que as pessoas fogem da verdade. A maior parte das pessoas vive em dissonância cognitiva.

O que é dissonância cognitiva? É a pessoa que encontra a verdade; mas, como aquela verdade é dolorosa e vai provocar uma mudança de vida, ela prefere não olhar para aquela verdade, esconde a luz da verdade debaixo da vasilha, debaixo do alqueire, e vai encontrar justificativas. Então, há esse negócio que as pessoas fazem. As pessoas… — sei lá —, o sujeito sabe que ficou diabético e sabe que precisa evitar o açúcar e sabe que isso vai doer, vai ser difícil, mas ele fica procurando artigos científico que justificam que “não é bem assim”, “não é desse jeito”, “não precisa cortar o açúcar de vez”, então a pessoa não aceita verdade. Você está colocando a verdade e cobrindo-a. Então, deixe a verdade de Cristo fazer tudo o que ela precisa fazer dentro de você. Então faça!

A forma de nós sermos julgados por Cristo agora, neste mundo, é a gente ter a disponibilidade para um bom exame de consciência diante de Deus: colocar tudo aquilo que nós somos e temos diante do olhar dele. Jesus então diz: “Portanto, prestai atenção à maneira como vós ouvis!” Preste atenção se a Palavra de Deus está entrando no seu coração e iluminando-o de verdade, ou se você a está cobrindo com um vasilha e deixando-a iluminar somente aquilo que interessa. Confie mais em Deus do que em você.

Deus quer o seu bem. Pare de sabotar a si mesmo! A verdade às vezes dói, mas depois da dor vem a salvação. Ela é salutar. Eis a melhor coisa que você poderia fazer: ouvir a Palavra de Deus, deixar-se iluminar por essa luz e, verdadeiramente, não ter reservas, não ter “esconderijos”, colocando-se debaixo do olhar de Cristo, do seu olhar bom, justo e misericordioso. — Deus abençoe você. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. 

II. Comentário exegético

Os vv. 21–22 exprimem a mesma ideia; dir-se-ia que explicam as palavras: A vós o mistério do reino de Deus foi dado a conhecer (v. 11). — V. 21. Pois bem, não se traz a lucerna (λύχνος, lâmpada a óleo, quase sempre de barro), i.e. ela não se destina, como ao seu fim próprio, a ser posta debaixo do alqueire (em Lc., a ser coberta com um vaso qualquer) ou debaixo do leito (κλίνη, que podia servir tanto de cama quanto de mesa e de assento, como o moderno divã), mas a ser posta sobre o candelabro. A aplicação está implícita, a saber: Igualmente, o “mistério do reino”, i.e. a doutrina evangélica não vos foi dada com um segredo a ser mantido oculto; embora se esconda de alguns no presente (e.g. dos sábios e entendidos, cf. Mt 11,25), é por si mesma uma revelação que deve ser proposta a todos. — Essa mesma imagem, em Mt 5,15, serve para ilustrar outra ideia.

V. 22 Em seguida, dá a razão do dito antes, a qual não vale universalmente a não ser no “reino da luz”: Porque não há algo (= não há nada) escondido que não venha a (ἐὰν μὴ ἵνα = senão para) ser manifesto no tempo oportuno; nem fato oculto algum, mas para (ἀλλ’ ἵνα = ἐὰν μὴ ἵνα = senão para) vir a descoberto. Talvez se entenda melhor o v. 22 como aplicação da parábola começada no v. 21, i.e.: Assim como a lucerna, no fim das contas, há de ser posta em lugar visível, assim também não há na doutrina evangélica nada que não se ordene a ser pregado a todos, e se algo por ora se mantém escondido, em algum momento será plenamente revelado. Encontra-se a mesma formulação com sentido quase idêntico em Mt 10,26. — O v. 23 chama a atenção para a importância deste ensinamento.

Os vv. 24–25 introduzem uma nova ideia, mas que tem estreita relação com a anterior. Começa com outra chamada de atenção às palavras do Mestre: Atendei ao que (em Lc., como) ouvis, ou seja, é de vosso máximo interesse ouvir, i.e. compreender adequadamente; pois com a medida com que medirdes etc., i.e. (ilustra-o com um provérbio) a medida de vossa atenção e diligência será proporcional, para mais e para menos, à vossa compreensão da doutrina do reino; para outros, o sentido seria: Ouvi bem! Pois não escutais para vós somente, mas para aqueles a quem sereis enviados; ora, com a mesma medida com que transmitirdes aos outros o que agora aprendeis sereis depois recompensados por Deus (o sujeito das formas passivas sintéticas μετρηθήσεται [mensurabitur = medir-se-vos-á] e προστεθήσεται [adiicietur = acrescentar-se-vos-á] é Deus, como de costume). — Em outro lugar (cf. Mt 7,2; Lc 6,38), aplica-se o mesmo provérbio, em sentido mais óbvio, ao modo de agir com o próximo (= quem julga o próximo condena-se a si mesmo, pois a medida com que se julga é a mesma com que se há de ser julgado).

Este mesmo provérbio é enfim complementado por outro, quase paradoxal [1]: Porque ao que tem dar-se-lhe-á ainda mais, e ao que não tem, i.e. ao que tem pouco, ainda este pouco que tem lhe será tirado; o que vale para o caso presente: Com efeito, quem prestar atenção merecerá ter inteligência e conhecimento mais amplos das coisas do reino; mas quem, por soberba ou preguiça, negligenciar a própria instrução tornar-se-á cada vez mais incapaz intelectualmente de compreender o restante da doutrina.

Referências

  1. “Se a forma é paradoxal, a verdade do dito, no entanto, é manifesta, sobretudo segundo os costumes do Oriente. É aos ricos, com efeito, que se dão presentes; aos que não têm nada (o uso consagrou este termo paradoxal para indicar os que têm poucas coisas) rouba-se-lhes até o último centavo” (M. J. Lagrange, 114).
  2. “A luz que não se alimente com diligência acaba por extinguir-se” (Valensin-Huby, S. Luc., 153).

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