Por que Deus permite o sofrimento de seus filhos? Estamos diante de um mistério. Os que quiserem estudá-lo com mais profundidade podem ler, no Catecismo da Igreja Católica, a exposição sobre o sacramento da Unção dos Enfermos (n. 1499 ss.), que contém diversas intuições sobre o mistério do sofrimento, da doença, da dor e da morte. Dada essa bibliografia básica, que podemos dizer do sofrimento dos filhos de Deus?
Em primeiro lugar, tenhamos presente a grande compaixão de Nosso Senhor, que não podia ver um doente ou um necessitado sem se debruçar sobre ele e conceder-lhe a cura. Ao mesmo tempo, sabemos que Ele visava não tanto a cura física quanto a salvação eterna do enfermo. Eis por que os relatos de cura, ou seja, aqueles em que Jesus faz cessar um determinado sofrimento na vida de alguém, terminam sempre com a fórmula: “Vai, a tua fé te salvou”. A finalidade não é, pois, devolver a saúde, mas introduzir o fiel no caminho da salvação.
Além disso, Deus tem uma visão diferente da nossa. Nós vivemos imersos em nossos problemas, na faina diária, nas preocupações do dia a dia, por isso tendemos a esquecer qual é a finalidade da vida. Fomos postos neste mundo para preparar o nosso Céu. Se é assim, Deus não tem por que fazer de tudo para nos impedir de sofrer, mas o tem para fazer de tudo para nos salvar, mesmo que isso suponha permitir algumas dores.
Temos aí um pequeno facho de luz para iluminar algo deste mistério. Não sabemos por que Deus, sendo sumamente bom e todo-poderoso, não elimina de uma vez para sempre todo sofrimento, mas permite que soframos nesta vida. E o mistério aprofunda-se ainda mais ao considerarmos que Ele mesmo veio ao mundo sofrer conosco.
Eis a melhor resposta ao sofrimento humano, que Deus não quis eliminar, mas transformar: o Verbo se fez carne, homem como nós, e sofreu carregando nossas dores e morrendo crucificado. A partir da morte e da Ressurreição de Jesus Cristo, o sofrimento passa a ter um significado redentor. Quando unimos nossa cruz à de Jesus, o sofrimento reveste-se de sentido, um que eleva em vez de rebaixar.
Sim, porque o sofrimento humano, em si mesmo, degrada. Quem sofre é oprimido pela dor, pela doença e, finalmente, pela morte. Sofrer é ir-se desfazendo, é tornar-se aos poucos uma sombra de quem se foi. Sofrer sem ter razão para o sofrimento é destruir-se.
Nosso Senhor veio abrir-nos outro caminho. Abraçado com destemor, o sofrimento converte-se em fonte de transformação, como se contivesse em si um germe de ressurreição. Muitos sacerdotes certamente já tiveram no confessionário e em atendimento pessoal a experiência de ver a transformação de alguém que abraça a cruz e dá significado à dor, um significado redentor, de união a Cristo.
Daí que a Igreja Católica nunca tenha abraçado o curandeirismo de algumas seitas. Sim, Deus faz milagres e pode realizar curas, mas o foco dele não é esse. Se para Deus o principal é nos salvar, a cura de uma doença só será verdadeiro bem, quando contribuir para a nossa salvação. Ora, imaginemos a possibilidade — aliás bastante real — de alguém ser curado e, ao invés de converter-se e salvar a própria alma, deixar cair no esquecimento a graça recebida, vivendo desleixado até seus últimos dias. De que terá valido essa cura?…
A resposta ao porquê de Deus permitir o sofrimento de seus filhos permanece, em última análise, um mistério. O Senhor não nos disse por que permite que soframos; deu-nos, porém, um motivo por que sofrer de outra forma: transformando a dor em amor. “Por que sofro?” Não o sabemos. O que, sim, sabemos é como dar ao sofrimento uma nova dimensão, unidos ao sacrifício redentor de Cristo na Cruz.
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