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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 11,11-15)

Naquele tempo, disse Jesus à multidão: “Em verdade eu vos digo, de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele. Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sofre violência, e são os violentos que o conquistam. Com efeito, todos os Profetas e a Lei profetizaram até João. E se quereis aceitar, ele é o Elias que há de vir. Quem tem ouvidos, ouça”.

Comentário exegético

Encarcerado por ordem de Herodes, João Batista envia dois de seus discípulos para interrogar Jesus (v. 1s). — És tu aquele que há de vir, ou devemos esperar outro? (v. 3). ‘Aquele que há de vir’ (gr. ὁ ἐρχόμενος) é denominação do Messias, frequente na Sagrada Escritura (cf. e.g. Gn 49,10; Sl 117,26; Ez 21,27; Dn 7,13; Hab 2,3; Jo 6,14; Ap 1,4). Jesus nada diz sobre o precursor diante dos discípulos dele. Tendo estes partido, dirige-se à multidão e elogia o Batista, encarecendo-lhe a firmeza de caráter (v. 7), a austeridade de vida (v. 8) e a excelência da missão (v. 9ss). O Evangelho de hoje contém as palavras finais deste encômio:

V. 11. Na verdade vos digo que entre os nascidos das mulheres não veio ao mundo (ἐγήγερται) outro maior que João Batista. O texto de Lc traz a seguinte variante: Porque eu vos digo: Entre os nascidos das mulheres, não há maior (a Vg acrescenta profeta, omitido no texto gr.) que João Batista (7,28). Toda a dificuldade do v. repousa na interpretação do qualificativo maior (gr. μείζων), sobre o qual há duas opiniões principais: 1) para alguns, tratar-se-ia da santidade pessoal do Batista. Mas essa leitura é insustentável levando-se em conta o trecho restante: Entretanto, o menor no reino dos céus é maior do que ele, onde ‘maior’ e ‘menor’ devem (provavelmente) tomar-se no mesmo sentido. — 2) Para outros, e são maioria, Jesus alude não à santidade de vida, mas à dignidade do ofício profético e da missão do precursor, como indica o verbo ἐγήγερται (o qual, mais do que ‘vir ao mundo’, significa ‘ser levantado’, ‘suscitado’ [por Deus]), e se depreende do contexto (cf. Mt 11,9s.16).

Com efeito, os LXX vertem por ἐγείρω o hebr. הֵקִים, com o qual se costuma significar a ação de Deus de suscitar ou mandar alguém vir a público, especialmente profetas, servidores etc. (cf. Jz 2,16.18; 3,15; Is 45,13; Pr 10,12).

Entretanto, a excelência de João é estimada apenas em relação ao passado, i.e. aos demais profetas do AT, pois o que é menor do reino de Deus é maior do que ele, quer dizer, o menor de todos na Igreja (‘menor’ em sentido superlativo = mínimo), de dignidade inferior, i.e. o simples fiel, é maior do que João Batista, que foi o maior (porque precursor do Messias) na antiga Lei. Trata-se, por conseguinte, de simples paralelo entre a antiga e a nova economias, que se distinguem como o imperfeito do perfeito: a nova supera tanto a antiga, que o último (o que é menor) no NT supera em dignidade o primeiro (o que é maior) no AT.

V. 12. Desde os dias (ἀπὸ δὲ τῶν ἡμερῶν) de João Baptista até agora, o reino dos céus adquire-se à força (βιάζεται; na Vg: vim patitur = sofre violência), e são os violentos que o arrebatam; em Lc, lê-se: A lei e os profetas duraram até João; desde então é anunciado o reino de Deus, e todos se esforçam por entrar nele pela violência (16,16). — A dificuldade da passagem reside no verbo βιάζεται. Pode tratar-se de voz média (= ‘faz violência’), ou de voz passiva (= ‘faz-se-lhe violência’, como na Vg); a voz passiva, por seu turno, pode significar empenho honesto ou violência hostil. Daí a diversidade de leituras:

a) Em Lc (cf. 16,16) emprega-se claramente a voz média: desde os dias de João Batista, o reino de Deus é anunciado e todo homem se esforça por entrar nele (πᾶς εἰς αὐτὴν βιάζεται), i.e. todos os que acolhem o anúncio da boa-nova fazem força para entrar no reino de Deus (buscam avidamente entrar nele etc.). Logo, a pregação do Evangelho suscitou nos homens um forte estímulo, quase um tumulto, de forma que todos agora lutam para entrar nele. Alguns intérpretes dão sentido análogo ao verbo no texto de Mt: o reino dos céus faz violência, i.e. abre caminho com força, irrompe (no mundo) com ímpeto, e são os violentos (βιασταί), i.e. os que fazem força ou violência (os fortes, pugnazes etc.) que o arrebatam para si, que dele se apossam etc.

De uma leve mudança de sentido, convertendo em princípio o que aqui se apresenta como fato (βιασταί = βιαζόμενοι), decorre aquela habitual interpretação ascética: o reino dos céus só se obtém à força, e o conquistam apenas os que fazem violência contra si mesmos.

b) O reino dos céus (de Deus) é oprimido com força (benévola), i.e. é avidamente desejado; noutras palavras, desde o tempo de João Batista os homens, com grande empenho e esforço e quase por certo ímpeto brusco, procuram entrar no reino; e os violentos, i.e. que fazem tal violência ao reino, dele se apossam como que à força (de modo análago a um roubo, ἁρπάζουσιν), Lc: e todo (tipo de homem) se esforça por entrar nele (cf. Mt 21,32; Lc 7,29). — Esta é a interpretação mais comum entre os autores, antigos e modernos.

c) O reino dos céus sofre violência, oposição (dos que lhe são infensos, contrários etc.), e são estes, i.e. os homens violentos, os que o arrebatam aos outros, impedindo-os de entrar nele (cf. Mt 23,1); Lc: todo (homem violento) faz força contra ele, i.e. opõe-se-lhe como inimigo.

NB — Estas três exposições são legítimas do ponto de vista léxico e gramáticas; as três podem também acomodar-se ao contexto sem dificuldade, daí . Se houvesse que preferir uma delas, seria a primeira.

— V. 13. A conexão deste v. com o precedente é dupla. Conforme a) e b), desde o tempo de João Batista o reino dos céus é introduzido (desejado, apetecido, buscado) como que à força e com ímpeto; com efeito, a lei e os profetas duraram até João, i.e. a economia do AT esteve em vigor até o Batista (1), mas agora, com o advento do precursor, inaugura-se a economia da nova Lei. Conforme c), tem-se a seguinte conexão: o reino dos céus, desde o tempo de João, é impugnado, sinal de que ele (o reino) já chegou; de fato, a lei e os profetas etc., mas agora às profecias sucedeu a realidade.

V. 14. E, se vós quereis compreender, ele mesmo é o Elias que há de vir. Com base em Ml 4,5 (3,22 nos LXX; 3,23 em BHS): Eis que vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o dia grande e horrível do Senhor (2), pensavam os judeus que o profeta Elias havia de voltar ao mundo antes da (primeira) vinda de Cristo. Jesus alude a essa crença, mas acrescenta: E, se vós quereis compreender (δέξασθαι, aceitar [a explicação disso]) para indicar que João não era Elias em pessoa, mas apenas em ofício e efeito, pois o que Elias fará na segunda vinda de Cristo, em poder e glória, isso mesmo o fez João na primeira, em humildade e rebaixamento. — V. 15. O que tem ouvidos para ouvir, ouça. Seguindo um costume dos rabinos da época, Jesus utiliza com frequência essa frase (cf. e.g. Mt 13,9.43 etc.) para despertar a atenção dos ouvintes quando procura ensinar algo de maior importância.

Referências

  1. O precursor do Senhor não pertence, em sentido próprio, nem ao AT nem ao NT, senão que é como que a zona limítrofe entre os dois (cf. Agostinho, serm. 293, 2: ML 38, 1328).
  2. Antes que venha o dia grande e horrível do Senhor (gr. πρὶν ἐλθεῖν ἡμέραν κυρίου τὴν μεγάλην καὶ ἐπιφανῆ, hebr. לִפְנֵ֗י בֹּ֚וא יֹ֣ום יְהוָ֔ה הַגָּדֹ֖ול וְהַנֹּורָֽא׃), clara alusão ao dia do juízo, do qual será precursor o profeta Elias, tendo João Batista sido precursor de Cristo em sua primeira vinda, não para julgar, mas para preparar a justiça do juízo com um tempo de misericórdia para os que ainda jazem na sombra da morte.

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