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Texto do episódio
1567

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
(Mt 5, 1-12)

Naquele tempo, vendo Jesus as multidões, subiu ao monte e sentou-se. Os discípulos aproximaram-se, e Jesus começou a ensiná-los: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós, por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus”.

Neste domingo, nós celebramos a Solenidade de Todos os Santos — cuja data, no calendário litúrgico, é o dia 1.º de novembro, mas no Brasil nós celebramos no domingo seguinte. Nesta solenidade, nós lemos o Evangelho das Bem-Aventuranças, que está no início do capítulo 5 de São Mateus; e somos convidados pela Igreja a refletir sobre a santidade.

Mas afinal, o que são essas Bem-aventuranças mencionadas no Evangelho? Esse conceito, às vezes, gera certa confusão. A verdadeira bem-aventurança, a plenitude da santidade, será integralmente vivida no Céu. No entanto, a Igreja Católica acredita que essa santidade pode começar aqui na terra. Pode parecer uma afirmação óbvia, mas, para os protestantes, não é. Se você diz a um protestante evangélico que determinada pessoa é santa, ele costuma reagir com surpresa, negando — veementemente — essa verdade. 

Mas por quê, afinal, isso acontece? Ora, para os nossos irmãos protestantes, um ser humano nunca poderá ser santo aqui neste mundo; apenas no Céu, e isso só pela misericórdia de Deus. Portanto, eles acreditam que, enquanto estamos aqui, somos sempre pecadores, vivendo em constante luta entre a fé em Deus e o egoísmo. Já nós, católicos, acreditamos que Deus deseja que sejamos santos desde já. Isso significa que Ele quer que nos libertemos de todo egoísmo e vivamos o amor pleno em nossos corações, não apenas no Céu, mas também aqui nesta vida.

Deus deseja isso para nós ainda neste mundo, e nós vemos esse desejo divino realizado na vida de muitos santos e santas ao longo da história, o que mostra ser possível libertarmo-nos do egoísmo. Mas como podemos ser santos nesta vida? Por meio de uma ação divina.

Para explicar melhor o que é a santidade, vamos recorrer aos ensinamentos de uma grande Doutora da Igreja, Santa Teresa d’Ávila. Isso porque a vida e os escritos dessa santa espanhola iluminam o significado da santidade. Então, vamos entender melhor: ao acreditar em Jesus, arrepender-se dos pecados e ser batizado, a pessoa inicia uma vida transformada. Santa Teresa d'Ávila recebeu a graça de ver, por meio de uma visão extraordinária e sobrenatural, o que ocorre com a pessoa ao receber o Batismo, o sacramento da Confissão, e permanecer em estado de graça, isto é, em amizade com Deus.

Como é a alma de alguém que acaba de receber a graça de Deus por meio dos sacramentos? Santa Teresa teve uma visão em que a alma era como um palácio de cristal luminoso, onde, no centro, reside o rei: Deus. Ali, no coração da alma, Deus habita e emana uma luz maravilhosa, que representa a vida sobrenatural da alma, a vida divina, algo que ultrapassa a nossa realidade conhecida. Não é algo mineral, vegetal, animal, nem mesmo angélico, nem qualquer outra criação de Deus. Essa luz é o próprio Deus, que resplandece em nós.

No centro da alma, brilha uma luz divina; fora dela, há apenas trevas. Essas trevas são povoadas de criaturas peçonhentas e repulsivas como cobras, sapos e lagartos. Santa Teresa também contemplou o que ocorre com a alma ao cometer um pecado mortal: a luz se apaga, e as trevas de fora invadem, trazendo consigo os animais peçonhentos. Segundo ela, uma alma em pecado mortal torna-se algo profundamente repulsivo, uma das visões mais sombrias e desagradáveis que alguém pode ter. 

Em seus escritos, Teresa explica que se nós tivéssemos a graça de sentir continuamente o horror que é uma alma em estado de pecado mortal, não conseguiríamos viver neste mundo, cercados por pessoas nesse estado de inimizade com Deus. Seria como estar sempre ao lado de uma carniça, de algo sumamente repulsivo e insuportável.

As visões de Santa Teresa são, de fato, extraordinárias; mas qual é, afinal, a novidade? A novidade é que, embora a alma em pecado mortal esteja nas trevas e cercada de criaturas peçonhentas, Deus, o rei, ainda permanece no centro do castelo; apenas a luz foi apagada. O que isso significa? Significa que Deus está no íntimo de todos nós e sustenta-nos no ser; se existimos, é porque Deus está pensando em nós e nos amando — mesmo em meio à escuridão.

Nós podemos ser as piores pessoas do mundo — como um Hitler — e ainda assim Deus nos ama e manifesta seu amor por nós. Mas, por estar nas trevas, nossa alma rejeita esse amor. Deus nos sustenta e, não só isso, Ele permanece presente; Ele quer nos amar, mas, ao rejeitar esse amor, nós nos tornamos seus inimigos. E isso é algo repulsivo, pois o amor e a vida sobrenatural apagaram-se em nós. O meio pelo qual essa luz pode voltar a brilhar em nossas vidas é o arrependimento verdadeiro que nos leva à Confissão. 

Até agora, estamos explicando apenas como tem início a santidade, mas ainda não dissemos o que ela realmente é. A santidade inicia-se desta forma: quando nos confessamos, essa luz divina acende-se em nossa alma. Mas há um problema: os iniciantes, embora tenham a vida sobrenatural em sua alma após a Confissão, ainda não conseguem enxergar isso. Santa Teresa explica que, ao entrar no castelo luminoso, nas primeiras moradas, é preciso passar por várias etapas até chegar ao trono do rei, que habita no centro da alma.

Ou seja, para se tornar santo, é necessário aproximar-se cada vez mais do Deus maravilhoso que habita em nós. Para se santificar, é preciso se interiorizar; não adianta ficar disperso com as coisas externas. É essencial mergulhar dentro da nossa alma. No entanto, ao fazer isso, no início, o que nós encontramos? Ora, encontramos as nossas paixões, aquilo que normalmente chamamos de sentimentos: medo, raiva, desejo sexual, vaidade e egoísmo. Essas paixões desordenadas estão presentes dentro de nós.

Quando nós mergulhamos em nós mesmos, em vez de percebermos a luz que já resplandece em nosso interior, o que encontramos na primeira morada, na etapa inicial do castelo, é uma série de sentimentos confusos. É por isso que muitos protestantes acreditam que o ser humano é eternamente pecador. Eles têm uma visão limitada, porque o máximo que conhecem é o Batismo. Quando alguém é batizado, a luz acende-se dentro dele, mas ele a enxerga? Não. Na primeira morada, ele só consegue perceber as suas paixões, que o arrastam para o pecado.

A propósito, esse foi o motivo pelo qual escrevi o livro “Um Olhar que Cura”, para ajudar as pessoas a atravessar essa primeira morada. Quando mergulham nesse estágio, elas se deparam com essa confusão interior. Mesmo após confessar e ser perdoadas, muitas ainda se sentem infelizes e egoístas.

Como pode haver uma vida de santidade dentro de nós se não conseguimos enxergá-la? Ora, para vê-la, é preciso se determinar. Essa é uma expressão típica do pensamento teresiano. Nós devemos nos comprometer a avançar, a adentrar mais fundo no castelo. E por quê? Porque, se não o fizermos, nunca conseguiremos superar nossas limitações.

Então, na prática, como nos tornamos santos? Pois bem, a graça de Deus já está ao nosso lado, mas, no início da jornada, provavelmente não perceberemos tal ajuda divina.

E isso acontece porque, no início da caminhada, precisamos de esforço para querer sair da primeira morada rumo à segunda, em busca de uma vida de santidade. E a primeira decisão que devemos tomar é adotar uma vida de oração, que significa buscar a Deus constantemente. É em nosso interior que devemos procurar o Senhor. Mas como, afinal? Podemos começar lendo as Escrituras ou a vida de um santo, ouvindo pregações, fazendo meditações e, a partir disso, buscar em nosso interior, aquelas verdades que um pregador ou um livro estão proclamando. Verdades estas que já estão dentro de nós (revelação interna), mas que precisamos encontrar a partir de uma palavra exterior (revelação externa).

Então, a primeira coisa indispensável é ter uma vida de oração. Não é possível ser santo sem rezar, e rezar muito. Além disso, deve ser uma oração interior, que não leva à dispersão, mas ao recolhimento, para adentrarmos a morada do rei, que nos fala no mais íntimo.

Isso é uma verdade de fé que Santa Teresa descobriu ao ler as “Confissões”, de Santo Agostinho, onde o santo de Hipona diz: “Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei. Eu te procurava fora e estavas dentro”. Deus está dentro de nós.

Agostinho buscava Deus fora de si, mas descobriu que Ele estava em seu interior. Percebeu que Deus é o “interior intimus meo”, que Ele habita o mais íntimo de nossa alma. É o rei que sustenta o nosso eu e nos dá vida. Ele pode estar dando só a vida natural, se formos pagãos ou estivermos vivendo em pecado. Porém, se somos cristãos e estamos sob a graça, Deus nos dá não só a vida natural, mas também a sobrenatural; é a luz acesa em nosso interior.

Busquemos essa luz dentro de nós. O caminho da santidade consiste na busca pela união com Deus; em outras palavras, a santidade é uma jornada em direção a essa união. Dessa forma, começaremos a amar Deus cada vez mais. Inicialmente, nós o amamos como um servo. E como é esse amor do servo? Ele se manifesta na obediência aos Mandamentos. Esse é o segundo passo na busca da santidade.

Se não obedecemos aos Mandamentos, não adianta. Se cometemos um pecado mortal, saímos do castelo, e a luz se apaga; retornamos às trevas. Para estar na primeira morada, é necessário cumprir os Mandamentos; isso é o mínimo. No entanto, desejamos avançar para a segunda morada e as demais, mas, para isso, é preciso ser generoso. Não podemos somente cumprir o mínimo, como ir à Missa todos os domingos — pessoa alguma alcança a santidade só com o salário mínimo. 

Se agirmos dessa forma, jamais sairemos da primeira morada. Essa é a grande desgraça da maioria dos cristãos que são salvos. Ou seja, 99,9999% dos católicos que vão para o Céu não conseguem avançar além da primeira morada, e, portanto, não são santos no verdadeiro sentido da palavra. Eles vivem apenas de obrigações: vão à Missa dominical, pagam o dízimo, são fiéis ao cônjuge etc. Mas não é assim que deve ser uma vida cristã autêntica. 

Nós precisamos amar generosamente, e o amor deve ir além. Imaginemos um homem casado cuja esposa diz que não percebe mais o amor do marido, porque ele se tornou frio e distante. Mas o marido, em resposta, diz que ele está cumprindo com todas as suas obrigações: paga as contas, leva o cachorro para passear, põe o lixo para fora, não cobiça a vizinha — que é mais bonita — tem relações sexuais com a esposa semanalmente, cuida dos filhos etc. Quem age assim pode até estar cumprindo os Mandamentos, mas não podemos chamar isso de amor.

O amor servil consiste em fazer só o que é obrigatório. No entanto, amar de verdade é algo diferente. Precisamos ser generosos e fazer aquilo que não é exigido, que não está no script. É fundamental ser generoso com Deus. Sem isso, nunca seremos santos. Não basta ser católico de Missa dominical, não basta confessar-se uma vez por ano, não basta simplesmente amar a mulher e os filhos. É preciso fazer tudo isso de forma heróica; é preciso querer viver para Deus de modo autêntico e verdadeiro. 

Temos de querer viver como os pais de Santa Teresinha, São Luiz e Santa Zélia Martin. Sim, pois Santa Teresinha dizia: “Deus me deu um pai e uma mãe mais dignos do Céu do que da terra”. Por quê? Porque eles viviam mais voltados para o Céu do que para as coisas do mundo, e educaram os filhos com o propósito de levá-los para o Céu. Se fizermos isso, estaremos progredindo; começaremos a caminhar e a nos esforçar. Com o tempo, chegaremos a um ponto em que faremos cada vez menos esforço, e Deus nos conduzirá adiante. Afinal, é a graça de Deus que nos impulsiona e nos purifica ao longo do caminho.

Aqui está um diferencial da santidade. Os santos enfrentam inúmeros sofrimentos, cruzes e provações, e, à medida que isso acontece, seu amor vai sendo cada vez mais purificado. Esse amor se torna cada vez mais heroico e divino, de tal maneira que eles adentram o castelo e conseguem enxergar aquela luz com maior clareza. Quanto mais eles percebem essa luz, que é o amor divino, mais enamorados e entusiasmados se tornam.

Eles deixam de ser servos e começam a se tornar filhos. Nesse estágio, eles decidem cuidar dos negócios do Pai — como na Parábola do Filho Pródigo —, decidem amá-lo de forma constante; eles tomam consciência de que não são meros empregados, senão filhos e herdeiros do Pai. Assim se desenvolve um amor filial. E, após experimentar esse amor de filho, começam a cultivar um amor ainda mais profundo, que é o amor de esposo. O filho quer servir o pai o tempo inteiro, mas ele não quer unir-se ao pai como ele se une à sua esposa. 

Precisamos amar intensamente e desejar nos unir a Deus da mesma forma que uma esposa deseja se unir ao seu marido. Quando buscamos essa união com todo o nosso coração e vivemos apenas para isso, começamos a perceber que, na verdade, já não somos nós que vivemos, mas é Cristo que vive em nós. Estamos tão unidos a Ele que aquilo que Ele deseja torna-se o que nós desejamos; o que Ele faz torna-se o que fazemos; e o que Ele sente torna-se o que sentimos. Assim, começamos a viver a verdadeira santidade.

Isso é o que Santa Teresa chama de união transformante, uma união tão profunda com o rei, que reside no centro do castelo da nossa alma, que já não temos mais desejos próprios; nosso querer é d’Ele. Não mais possuímos um amor nosso; o amor é d’Ele. Nossos planos não são mais nossos, mas d’Ele. Tudo está ligado a Ele. Nós somos para Ele, e Ele é para nós: “Meu amado é meu, e eu sou do meu amado” (Ct 6, 3). Passamos a viver para Deus, e essa experiência é, sim, possível já aqui na terra. Essa é a doutrina católica sobre a santidade, algo que os protestantes não compreendem.

Os protestantes não compreendem que é possível, ainda nesta vida, passar por uma transformação tão profunda que podemos afirmar, como São Paulo na Carta aos Gálatas: “Vivo, mas não eu, é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20). Essa transformação em Cristo é tão intensa que os santos que alcançam a sétima morada, ou seja, a perfeição aqui nesta vida, já não têm a capacidade de pecar. Mas isso não significa que perderam a liberdade; ao contrário, eles atingiram a verdadeira liberdade, libertando-se do pecado. Achamos que ser livre é ter a liberdade de pecar; mas, na realidade, a verdadeira liberdade é estar livre do pecado. Essa é a verdadeira essência da liberdade.

A pessoa lutou tanto para se libertar do pecado que, agora, já não é mais capaz de cometê-lo. Para ilustrar essa liberdade, imaginemos que houvesse uma lei que proibisse você de odiar ou matar sua mãe. Você, certamente, responderia que tal lei é absolutamente desnecessária, visto que você ama a sua mãe e sacrificaria a própria vida por ela. Isso demonstra que você é livre. O amor o libertou; você não precisa dessa lei.

Com isso, nós somos verdadeiramente livres. O amor é tão profundo que a lei torna-se desnecessária; o pecado já não nos escraviza. Da mesma forma, o santo é alguém que se transformou tanto em Cristo que se tornou incapaz de cometer qualquer pecado, por menor que seja. E isso é possível, mas é uma obra da graça, algo que Deus realiza em nós.

Mas como fazer para chegar lá? A entrada para o castelo é a oração. É necessário cultivar uma oração interior, buscar a Deus cada vez mais intensamente e desejar amá-lo sempre mais. Começamos amando-o como servos, obedecendo aos Mandamentos. Depois, passamos a amar como filhos, fazendo tudo por nosso Pai. E, mais adiante, chegamos ao amor da esposa, que deseja se unir ao esposo e estar sempre junto dele. É aí que ocorre a união e a transformação. Eis a santidade, que os santos e santas de Deus atingiram ainda neste mundo. E isso é possível, é real, ao contrário do que dizem os nossos irmãos protestantes. A santidade está atestada pela vida de milhares de santos canonizados. E hoje queremos fazer uma grande festa e nos alegrar, pois é a Solenidade de Todos os Santos.

Que sejamos iluminados pelo testemunho de tantos companheiros, irmãos e irmãs mais experientes, que já chegaram ao Céu e nos mostraram o caminho. Se perseverarmos nesse caminho, um dia ouviremos o Pai Celeste a nos convidar para o grande banquete nupcial. Então, prossigamos rumo ao Céu, e, enquanto isso, celebremos com alegria os nossos irmãos e irmãs que já estão lá.

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