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Onde está a felicidade do Natal?

O Natal está às portas… Mas onde está a felicidade que todos se desejam? Por que o Natal deveria ser sinônimo de alegria? Afinal, não nasceu Cristo numa gruta suja que servia de estábulo, no qual Maria não tinha onde recliná-lo senão num cocho, sob o olhar perplexo e impotente de São José?

Texto do episódio
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Neste tempo, todas as pessoas dizem umas às outras: Feliz Natal. Mas, quando olhamos para a cena do Natal originário, não parece que exista ali algo de feliz: no presépio o que se vê é uma mulher prestes a dar à luz num ambiente totalmente inóspito (uma caverna que servia de curral), sendo um cocho o único berço que ela podia oferecer ao seu filho. O pobre São José, ali, parecia ter fracassado em seus deveres de pai e provedor, incapaz de oferecer à sua família um teto decente e o mínimo conforto. 

O que há, então, de feliz no Natal? 

A fim de entender, de fato, por que desejamos Feliz Natal e por que o Natal é feliz, é preciso entender de onde vem a felicidade dos santos. Diante de Jesus que vai nascer, nós temos as duas almas mais santas, os dois corações mais santos que já existiram: o da Virgem Santíssima e o de São José. Em termos de santidade, estes dois estão acima de todos os anjos e santos. Então, é para eles que devemos olhar.

Se olhamos para nós mesmos, percebemos que muitas vezes vivemos na superfície das nossas paixões e sentimentos. São José e a Virgem Maria, que eram humanos também, tinham sim naquela noite alguma tristeza, mas tratava-se de uma tristeza superficial, esta de terem sido rejeitados em Belém, e de não poderem dar ao Menino Jesus, que ia nascer, um ambiente digno e aconchegante — nem que fosse na humilde casinha de Nazaré! mas só o que eles conseguiram foi uma gruta, um estábulo, um cocho…

Essa tristeza superficial, no entanto, não nos fala da felicidade interior e profunda dos dois. Sim, havia neles uma felicidade interior, porque a própria Sagrada Escritura nos diz que “o justo vive pela fé” (Hab 2, 4; Rm 1, 17; Gl 3, 11; Hb 10, 36). Nossa Senhora e São José são os dois maiores exemplos de fé que nós temos na história da humanidade, superando fé dos patriarcas, inclusive a de Abraão. Eles sabiam o que estavam vivendo. O que havia ali naquela noite? Não era simplesmente uma criança que ia nascer, mas o mistério extraordinário de Deus que se fez homem.

A humanidade louca, ferida pelo pecado original, desprezou a Deus. Vamos ser bem objetivos: nós não desejamos Deus, nós não desejamos a salvação com aquela profundidade que deveríamos desejar; e, mesmo assim, Deus nos deseja, Deus quer se encontrar conosco. Deus quis tanto se unir à humanidade que fez uma humanidade para si; Deus quis tanto o matrimônio entre Deus e o homem que criou milagrosa e misteriosamente, do nada, uma humanidade para si. No ventre da Virgem Maria, Deus assumiu a nossa humanidade e fez uma humanidade sua, através de um mistério extraordinário que os teólogos chamam de “união hipostática”. Mas não se preocupe com essa palavra, preocupe-se em entender na medida do possível o grande mistério do Deus que se fez homem.

Meus queridos, no Natal nós não estamos celebrando simplesmente o nascimento de Jesus, mas algo muito mais misterioso e profundo, um abismo de mistério e de amor, que é o fato de que Deus quis se unir a nós.

Aqui, cabe destacar que muitas vezes nem nós queremos nos unir a nós mesmos. Quantas e quantas vezes você se sente insuportável a si próprio? Já parou para notar que muitas vezes você não se suporta? que você não se aguenta? que você não quer se encontrar consigo, no seu interior? que você faz o que for preciso para se distrair e esquecer de você mesmo?

Deus, porém, fez o contrário. Deus me quis, Deus desejou estar comigo, Deus quis pagar o preço de se unir a mim. Deus criou uma humanidade para si, uniu-se à nossa humanidade para com ela morrer na Cruz. Ele quis morrer por mim para que eu pudesse viver para Ele.

Meus queridos, esse é o grande mistério do Natal e essa é a grande alegria de Maria e de José, porque eles tinham a fé penetrante, a fé profunda, eles conseguiam ver, mais do que isso, mais do que ver, eles conseguiam ter o conhecimento experimental deste mistério. Deus veio até nós, Deus se uniu a nós. O abismo que separava Deus e a humanidade foi transposto. Não estamos mais sozinhos, pois Ele veio até nós. Com que alegria, então, São José e Nossa Senhora viam aproximar-se aquele momento em que a Criança finalmente ia nascer! Com que fé experimental eles viam aquilo que depois Deus mostrou aos pastores: de que o Deus dos exércitos celestes (Dominus Deus sabaoth) estava ali, fez-se homem para travar o grande combate.

O Evangelho da noite santa de Natal nos fala desses exércitos celestes, os anjos que se apresentam aos pastores. Primeiro um anjo traz a notícia aos pastores — provavelmente o anjo Gabriel, segundo a tradição, pois é ele que traz as notícias da Encarnação ao aparecer a Zacarias e a Nossa Senhora: “Não tenhais medo, eu vos anuncio uma grande alegria”. Não quero corrigir o Anjo, mas eu diria: “Eu vos anuncio a grande felicidade”, pois é mais que alegria, é uma grande felicidade que se realiza na união de Deus com o homem. Jesus é essa felicidade que vem a nós. Depois desse anúncio, une-se a São Gabriel, de repente, a multidão dos exércitos celestes. A nossa tradução litúrgica fala da multidão da coorte celeste. A “coorte” é uma divisão do exército: estamos falando claramente, pois, de um título do Deus que reina sobre a multidão de seus anjos. E então, de repente, nós vemos no céu brotar uma luz. Ela nos indica que estamos diante do cumprimento de uma profecia. Estamos em Belém, a qual, como recordou São Gabriel, é a cidade de Davi.  

Mil anos antes, Davi, um pequeno pastor, um adolescentezinho ruivo de aspecto delicado e frágil, o caçula dos filhos de Jessé, foi escolhido por Samuel. O profeta escolheu aquele menino frágil, um pequeno pastor de Belém, para ungi-lo como rei, a fim de que ele pudesse combater as batalhas de Deus e vencer Golias. No capítulo 17 do Primeiro Livro de Samuel lemos essa história. Quando Davi se apresentou a Saul e contou a sua história, Saul disse: “Imagina se você pode agora enfrentar Golias… Quem você pensa que é? Você é um moleque! O filisteu Golias é um soldado experiente. Como é que você, um molequinho franzino e delicado, vai combater um gigante guerreiro?” Davi então se recorda da sua história de salvação e diz ao rei Saul: “Quando cuidava dos rebanhos do meu pai e vinha um leão ou um urso, eu os combatia e derrotava. Pois bem, assim como Deus esteve comigo e eu derrotei o leão, Deus estará comigo e eu irei derrotar o filisteu”. Davi se apresenta, então, diante de Golias e diz: “Tu vens a mim com espada e lança, mas eu venho em nome do Senhor dos exércitos”.

Observem que o que aconteceu a Davi no Antigo Testamento é somente uma profecia que hoje nós vemos realizada. Na cidade de Davi, no mesmo lugar, pastores recebem dos exércitos celestes uma notícia: o Pastor dos pastores está chegando, mas ele não vem com o aspecto gigantesco de um Golias, nem com a força da armadura de um Saul... O sinal é uma criança envolta em faixas. Assim como, no passado, Davi, o escolhido de Deus, era franzino e pequenino, agora uma criança pequenina é quem derrotará o leão, é esta criança quem matará Golias, é esta criança quem realizará a vitória do Deus dos exércitos. 

Sim, as legiões demoníacas vêm contra nós com as suas artimanhas, com a sua força, com o seu furor. Quanto alarde, quanto barulho, quanta pompa e circunstância fazem as legiões demoníacas! É Natal, mas as páginas dos noticiários só trazem más notícias. Que ano tremendo foi 2020! Quem de nós, no início de 2020, pensaria que viveríamos tanta miséria, tanta loucura, tantas coisas tremendas neste ano? Quem de nós poderia imaginar? Durante esse ano de 2020, nós fomos como aquele povo de Israel que durante quarenta dias perecia diante do filisteu Golias, que se apresentava diante do povo, escarnecia de sua fraqueza e blasfemava contra Deus. Durante quarenta dias o inimigo parecia vitorioso, durante quarenta dias ele tripudiou em cima do povo de Deus e blasfemou o nome do Deus Altíssimo. Deus, no entanto, manifesta um modo diferente de agir, a fim de aumentar a confusão e a vergonha de Satanás e dos seus demônios. Deus escolhe destruir os poderes infernais com a humildade, com o que é pequeno, com o que é desprezível. Esse é o jeito de Deus agir.

Meus queridos, se neste ano de 2020 houve muito estardalhaço, se houve muita fanfarra de demônios na sua vida, saiba que chegou o Davi prometido. O anjo de Deus nos diz na Noite Santa: “Não tenhais medo, eu vos anuncio uma grande alegria que será para todo o povo: hoje na cidade de Davi” se cumpre, se realiza aquilo que antes era só uma sombra, só uma profecia. O frágil Davi, ungido para vencer Golias, era apenas uma sombra, uma prefiguração do Davi definitivo, o Filho de Davi, que vem para vencer, vem triunfante para vencer, e vencer da forma como Deus vence, através da humildade. O Deus dos exércitos celestes, na humildade dos anjos: “Quem como Deus?”. O Deus dos exércitos celestes que vem na humildade, e que criou os dois corações mais humildes da história — mais humilde do que toda a humildade dos anjos juntos — os dois corações humílimos da Virgem Santíssima e de São José. Deus fez esses dois corações mais humildes para receber o Humilde dos humildes, o Filho de Deus feito homem: “Sendo igual a Deus não se apegou à sua divindade, mas se esvaziou e se humilhou” (Fl 2, 6-7), exinanivit, humiliavit semetipsum, “se esvaziou e se humilhou”, porque é pela humildade que Deus manifesta a sua vitória.

Neste Natal especialíssimo de 2020, nós podemos celebrar olhando para a figura extraordinária de São José, pois, como você sabe, o Papa Francisco decretou, do dia 8 de dezembro de 2020 até 8 de dezembro de 2021, o Ano de São José. Então, este é o Natal do Ano de São José. É preciso olhar para o Menino que nasce, olhar para Deus que se faz homem, olhar para Deus que deseja a humanidade e toma uma humanidade para si, olhar para Deus que paga o preço (como o pequeno Davi ao vencer Golias) morrendo na Cruz para nos salvar; enfim, olhar para todo este mistério com o mesmo olhar e com o mesmo coração de São José.

Infelizmente, muitas pessoas não se dão conta da santidade de São José. Quando lêem os Evangelhos, muitos olham para São José como se fosse, com o perdão da palavra, uma espécie de outsider, alguém que não foi convidado por Deus para participar do mistério. Como se Deus, ao se encarnar, tivesse pedido o consentimento da Virgem Maria, mas não o de São José, que foi tomado de surpresa, sem entender nada do que estava acontecendo.

Mas isso não é verdade. São José foi escolhido desde todos os séculos para cumprir a sua missão e Deus lhe deu a graça necessária para cumpri-la. Desde sua mais tenra infância, São José já era muito santo. Não é sem razão que a Sagrada Escritura o chama de “justo”. Esse grande santo, portanto, com uma fé penetrante e luminosa, olhou para o nascimento de Cristo sabendo perfeitamente o que estava acontecendo.

Olhando para a vida dos santos, nós percebemos que os santos se reconhecem. Se São Filipe Néri, ao encontrar Santo Inácio de Loyola, viu o seu fulgor luminoso e reconheceu sua santidade, imagine agora se São José — que, depois de Nossa Senhora, é dos seres humanos o mais santo de todos os santos — não iria reconhecer o mistério da fé do Deus que se fez homem ali na sua frente! Então, quando esse coração humílimo e cheio de fé se aproximou do Menino Jesus, no silêncio daquela noite, ele deve ter ficado exultante, com uma imensa felicidade interior, por saber que Deus veio nos salvar e mostrou-nos inclusive o seu rosto... Sim, porque, antes São José já sabia que o Filho de Deus estava no ventre de Maria, mas agora ele estava vendo o seu rosto. Agora, Jesus se apresenta a São José, e ele pode adorá-lo e tomá-lo nos braços. 

Meus queridos, quando São José tomou Jesus pela primeira vez em seus braços aconteceu uma união sublime e extraordinária. Podemos dizer que aquela foi a primeira Comunhão de São José. Assim como em Cristo Deus se uniu num matrimônio espiritual com a humanidade, na gruta de Belém São José se uniu ao seu Deus para adorá-lo.

Peçamos a graça de neste Natal também nós nos aproximarmos do Menino Jesus com a mesma humildade e com a mesma fé. E se nós tivermos verdadeira fé e humildade, brotará em nós a caridade, e então o Natal será feliz. Portanto, apesar das misérias da sua vida, apesar dos desastres de 2020, apesar de você viver inquieto e preocupado, mergulhe na fé e se humilhe “debaixo da poderosa mão de Deus” (1Pd 5, 6), entregando a Ele as suas preocupações; faça um ato de fé e adore o Menino Deus, adore o Senhor que o visita e quer se unir a você.

Se você tiver esse coração semelhante ao de São José, o Natal será feliz, porque a verdadeira felicidade — aquela que habita no fundo dos nossos corações quando estamos em estado de graça e na amizade com Deus —, ninguém no-la pode tirar, nenhum filisteu, nenhum gigante, nenhum Golias pode nos tirar a felicidade que vem do Altíssimo. “Quem nos separará do amor de Cristo?” (Rm 8, 35), quem será capaz de nos separar? A morte, a dor, as pandemias, as crises da Igreja, os desastres políticos? Ninguém é capaz de nos separar do amor de Cristo, por isso o Natal é feliz! Então, ao contemplar o presépio, olhe para o coração de São José, olhe para o Coração da Virgem Maria e saiba: eles são felizes, porque o olhar da fé penetra a realidade e nos leva para aquele em quem se encontra a felicidade plena, o próprio Deus.

Que Deus abençoe você e sua família neste Natal, e lhe dê a humildade e a fé de São José para que, brotando a caridade no seu coração, o seu Natal seja verdadeiramente feliz.

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