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Papista!

Papista! É a alcunha com a qual nós, católicos, somos frequentemente repreendidos. Mas o que queremos realmente dizer, quando afirmamos que cremos no Papa? Nesta aula, Pe. Paulo Ricardo dá orientações espirituais para quem deseja viver, de forma mais consciente e devota, a obediência e a piedade filial devidas ao Santo Padre.

Texto do episódio
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Infelizmente se tem notado, na internet, certa leviandade dos católicos em relação ao Papa. O Pontífice Romano com frequência é criticado como se fosse um qualquer, o que mostra uma grande ignorância do que seja a instituição do papado para a Igreja.

Em linhas gerais, a doutrina católica sobre o Papa foi condensada na Constituição Dogmática Pastor Aeternus, do Concílio Vaticano I (DH 3050-3075). As definições aí contidas são dogmáticas. Para nós, católicos, portanto, o seu conteúdo trata de certezas inabaláveis. Devemos dar o nosso consentimento total a algo ou por evidência ontológica (quando se diz, por exemplo, que dois mais dois são quatro), ou pelo testemunho de uma pessoa infalível (como é o caso de Cristo, cuja ação se manifesta também no Concílio Ecumênico). Por isso — pela autoridade divina que revela —, a infalibilidade papal é de fé obrigatória para todos os católicos. O teólogo suíço Hans Küng, por exemplo, quando escreveu a obra “Unfehlbar? (Infalível?)”, perdeu a licença para lecionar teologia católica, já que tinha questionado um dogma de fé.

O texto da Pastor Aeternus começa lembrando a fundação divina da Igreja, confiada por Nosso Senhor aos Apóstolos. Em seu primeiro capítulo, sobre “a instituição do primado apostólico em S. Pedro”, o documento confirma que Cristo deu pessoalmente ao Apóstolo Pedro um poder que estava acima daquele dado aos doze. E conclui:

Se, pois, alguém disser que o bem-aventurado Pedro Apóstolo não foi constituído por Jesus Cristo príncipe de todos os Apóstolos e chefe visível de toda a Igreja militante; ou que ele recebeu, direta e imediatamente, do mesmo Senhor nosso Jesus Cristo, apenas um primado de honra, não porém um primado de jurisdição verdadeira e própria: seja anátema (DH 3055).

Portanto, São Pedro não era um primus inter pares, mas possuía uma autoridade realmente superior à dos outros apóstolos. Quando São Paulo, por exemplo, repreendeu publicamente São Pedro (cf. Gl 2, 11-14), ele o fez como um súdito que repreendia o seu superior, não um igual.

No segundo capítulo da Constituição, fala-se da “perpetuidade do primado de S. Pedro nos Romanos Pontífices”. Não só Cristo confiou a São Pedro um encargo particular, como essa função é transmitida a todos os seus sucessores, que são os bispos de Roma:

Se, portanto, alguém disser não ser por instituição do próprio Cristo, ou seja, de direito divino, que o bem-aventurado Pedro tem perpétuos sucessores no primado sobre a Igreja universal; ou que o Romano Pontífice não é o sucessor do bem-aventurado Pedro no mesmo primado: seja anátema (DH 3058).

No terceiro capítulo, que fala da “natureza e o caráter do primado do Pontífice Romano”, o Concílio Vaticano I recorda o “dever de subordinação hierárquica e de verdadeira obediência” que todos “os pastores e os fiéis de qualquer rito e dignidade” têm para com o Sumo Pontífice (DH 3060). Por isso, o Papa não deve ser ouvido apenas quando fala infalivelmente, mas também em seus atos de Magistério ordinário.

Não é compreensível, por exemplo, que se afaste a necessidade de acolher os documentos do Concílio Vaticano II, sob o pretexto de que ele não definiu nenhum dogma infalível. Embora tenha sido pastoral, o Vaticano II é um ato magisterial autêntico, solene — trata-se de um Concílio Ecumênico — e regido por dois papas. Ele não pode, pois, ser criticado de modo leviano, como muitas vezes se vê acontecer em meios ditos católicos, mas somente com respeito e depois de um estudo muito sério.

E por que ficar “cheio de dedos” com relação a isso? Para explicar, pode servir a seguinte analogia. O quarto mandamento, honrar pai e mãe, impõe o dever de amar aqueles que nos geraram. Esse amor faz parte de uma instituição, que é a família. Ao contrário do que muitos erroneamente dizem, as instituições não são uma coisa “fria”. Não há coisa mais terna do que a família e, no entanto, ela é uma instituição. O amor devido aos pais é, portanto, um amor institucional. Se, porém, parece muito óbvio respeitar e tratar bem os próprios familiares, o quarto mandamento também se encaixa no caso de pais que não são e não foram bons pais ou que, por algum pecado ou defeito, não sejam tão amáveis. Afinal, deve-se amar os pais não por aquilo que eles são ou deixaram de ser, mas pelo fato mesmo de serem pais.

Ora, o papado também é uma instituição. E fundada pelo próprio Deus. Por isso, todo católico tem o dever de amar o Santo Padre. É perfeitamente possível que se ame o Papa por alguma qualidade pessoal que ele possua, mas, antes de tudo, é preciso amá-lo pelo que é institucionalmente. Se um dia for eleito um Pontífice pelo qual se sinta certa antipatia, não é possível lavar as mãos e pensar que se esteja isento de amá-lo. Se ele foi eleito, é o chefe visível da Igreja e pai de todos os católicos. E pai não se escolhe, recebe-se.

A Pastor Aeternus conclui o capítulo terceiro lembrando que o Papa tem “o pleno e supremo poder de jurisdição sobre a Igreja universal, não só nas matérias referentes à fé e aos costumes, mas também nas que se referem à disciplina e ao governo da Igreja espalhada por todo o orbe” (DH 3064). Isso diz respeito principalmente ao poder pontifício de nomear e depor os bispos ao redor do mundo. Se todos os Ordinários têm jurisdição particular e ordinária em suas dioceses, apenas o Sumo Pontífice tem “o pleno e supremo poder de jurisdição”. Por isso se fala que não se pode apelar acima do Santo Padre. Um Papa só pode ser julgado por seu sucessor, quando já não o foi por uma declaração infalível de um predecessor ou de um Concílio Ecumênico. Em todo caso, sempre é possível, diante de um Papa que obriga os fiéis a fazerem algo que destruirá a sua fé, uma ação de “legítima defesa”, por assim dizer: não se deve julgá-lo, mas é possível, em legítima defesa, não se fazer o que ele manda.

Importa lembrar, no entanto, que essa atitude só pode ser tomada quando há uma autoridade superior que manda o contrário do que diz o Papa — no caso, a autoridade de Deus. Não se pode tomar como desculpa para desobedecer a simples discordância pessoal de seus atos de Magistério. Eis uma ocasião oportuna para exercitar a virtude da obediência, que funciona justamente quando se entra em desacordo com o próprio superior.

Outro cuidado deve ser tomado no que concerne às críticas públicas ao Santo Padre. Infelizmente, alguns dentro da Igreja têm agido com certa tranquilidade para falar mal do vigário de Cristo na Terra, quando um verdadeiro católico, se tivesse uma razão muito séria para tal, fá-lo-ia sempre com afeto filial, e não com o sarcasmo e o prazer sádico que muitas vezes se vê.

No que tange à doutrina da infalibilidade papal, que é o conteúdo do quarto capítulo da Pastor Aeternus, pode ser útil uma comparação. Imagine-se que somos trabalhadores edificando uma construção e o engenheiro, que é o mestre de obras, tem um instrumento especial com o qual ele faz uma prospecção do terreno, a fim de saber que lugar é rocha ou areia. Na Igreja, os Papas são como esses engenheiros. No terreno em que se edifica a Igreja, não raras vezes a rocha está debaixo de uma camada de areia e só o Sumo Pontífice pode, como “mestre de obras” assistido pelo Espírito Santo, dizer se aquele terreno é terra sólida ou não.

Nas atas do Concílio Vaticano I, Vincenzo Gasser, bispo de Bressanone, explica com muita clareza o que quer dizer a expressão “infalibilidade pessoal” com relação ao Sumo Pontífice. Não se trata de dizer que ele é infalível enquanto pessoa privada, mas enquanto sucessor de São Pedro, a quem Nosso Senhor confiou particularmente as chaves do Reino dos céus (cf. Mt 16, 19).

Além disso, o Santo Padre não é infalível o tempo todo, mas apenas em circunstâncias especiais. Nessas ocasiões, ele não se declara por conta de uma “nova revelação” — afinal, “a economia cristã, como nova e definitiva aliança, jamais passará, e já não se há de esperar nenhuma nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo” (Dei Verbum, 4) —, mas por assistência do Espírito Santo. Esta, a propósito, não dispensa a consulta dos meios humanos. O Papa Pio XII, quando proclamou o dogma da Assunção de Nossa Senhora, por exemplo, consultou o episcopado do mundo inteiro antes de fazê-lo. E — exemplifica São Roberto Belarmino, Doutor da Igreja — o próprio São Pedro, que poderia ter dirimido por conta própria a controvérsia judaizante, preferiu convocar o Concílio de Jerusalém para resolver a questão (cf. At 15, 6-35).

Em tempos de crise pós-conciliar, é importante apontar o terreno sólido sobre o qual se edifica a fé católica. Esse terreno, apontaram-no os Papas, os santos Doutores e, de modo especial, a Constituição Pastor Aeternus, do Concílio Vaticano I, a qual vale a pena estudar e conhecer a fundo, pois é doutrina segura sobre o Papa, ensinada ao longo dos séculos pela Igreja.

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