Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 6, 24-39)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Ninguém pode servir a dois senhores; pois, ou odiará um e amará o outro, ou será fiel a um e desprezará o outro. Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro.
Por isso eu vos digo: não vos preocupeis com a vossa vida, com o que havereis de comer ou beber; nem com o vosso corpo, com o que havereis de vestir. Afinal, a vida não vale mais do que o alimento, e o corpo, mais do que a roupa? Olhai os pássaros dos céus: eles não semeiam, não colhem nem ajuntam em armazéns. No entanto, vosso Pai que está nos céus os alimenta. Vós não valeis mais do que os pássaros? Quem de vós pode prolongar a duração da própria vida, só pelo fato de se preocupar com isso? E por que ficais preocupados com a roupa? Olhai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham nem fiam. Porém, eu vos digo: nem o rei Salomão, em toda a sua glória, jamais se vestiu como um deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é queimada no forno, não fará ele muito mais por vós, gente de pouca fé?
Portanto, não vos preocupeis, dizendo: 'O que vamos comer? O que vamos beber? Como vamos nos vestir? Os pagãos é que procuram essas coisas. Vosso Pai, que está nos céus, sabe que precisais de tudo isso. Pelo contrário, buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo. Portanto, não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois o dia de amanhã terá suas preocupações! Para cada dia bastam seus próprios problemas".
"Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça", diz Jesus no Evangelho de hoje, "e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo". Com tais palavras, a liturgia da Igreja quer como que nos introduzir, já, no espírito da Quaresma, que se inaugura na próxima Quarta-feira de Cinzas. Afinal, para que serve esse período intenso de 40 dias, senão para buscarmos com forças renovadas que "venha a nós o Reino de Deus", como pedimos na Oração Dominical? Que mais podemos pedir ao Senhor, neste tempo, a não ser que Ele reine em nossos corações com "a sua justiça" — isto é, dando-nos a sua própria santidade?
Para entendermos como se dá esse processo do "reinado" de Deus em nossas almas, no entanto, é necessário que saibamos primeiro em que consiste a santidade. Nesta tarefa, ajuda-nos o gênio de Santo Tomás de Aquino. "O efeito da graça operante é a justificação do ímpio", ele diz. "E essa justificação implica não só a infusão da graça e a remissão da culpa, como também o movimento do livre arbítrio, que de um lado, nos leva para Deus, por um ato de fé formada, e de outro, nos afasta do pecado, por um ato de penitência" (S. Th., III, q. 86, a. 6, ad 1). Afastarmo-nos do pecado pela penitência, portanto, e aproximarmo-nos de Deus pela fé: eis um bom plano de metas para esta Quaresma que se aproxima.
Acontece que, porém, ao mesmo tempo em que preparam inúmeras penitências para serem feitas durante esse tempo — práticas louváveis, sem dúvida, como abster-se de comida ou bebida, deixar de assistir à televisão ou desativar o Facebook —, as pessoas normalmente se esquecem de praticar algo para aumentar a sua intimidade com Deus. Elas se desligam do barulho do mundo, sim, mas não sabem, por outro lado, em que "ligar"; freiam os impulsos da carne, sim, mas deixam de "acelerar" rumo à santidade. Para nós, portanto, essa Quaresma precisa ser um tempo de propósitos negativos, sim, mas aliados a um exercício mais intenso da virtude da fé, que nos coloca em contato com Deus.
Mui concretamente, a fé nós a colocamos em prática por meio da oração. É ela que nos põe em contato com as verdades sobrenaturais que, embora já conhecêssemos, se tornam "luminosas", por assim dizer, graças à ação da graça de Deus. Ele quer visitar-nos, assim como a brisa suave que visitou o profeta Elias (cf. 1Rs 19, 12). Para que O acolhamos, no entanto, não basta o silêncio, é preciso a procura; não basta deixar de fazer certas coisas, é necessário também recolhimento e presença de Deus. Seja assim a nossa Quaresma e, no fim, ressurgiremos com Cristo Ressuscitado para uma vida nova e reinaremos com Ele, no Céu, por toda a eternidade. Amém.
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