Ensina o Catecismo da Igreja Católica que “a sexualidade afeta todos os aspectos da pessoa humana, em sua unidade de corpo e alma”. Ela se refere de modo particular “à afetividade, à capacidade de amar e de procriar e, de uma maneira mais geral, à aptidão de criar vínculos de comunhão com os outros”. Ora, a sexualidade é tão importante que “a Tradição da Igreja entendeu o sexto mandamento como englobando o conjunto da sexualidade humana” (§ 2332 e 2336).
Deus criou o homem e a mulher, e a união de ambos. O sagrado Matrimônio, portanto, é uma “maneira de imitar na carne a generosidade e fecundidade do Criador”. E é justamente pela abertura que se dá à procriação que “procedem todas as gerações humanas” (Catecismo, § 2335). Embora a fecundidade seja uma das finalidades do matrimônio e o filho seja considerado um bem, um presente de Deus, nem todos são capazes de gerar fisicamente uma criança.
A medicina tem alcançado enormes avanços no campo da reprodução assistida e, muitos casais, ao se verem fisicamente impedidos de procriar, procuram nela a solução. Um dos exames mais comuns e solicitados logo no início é o espermograma, que tem por objetivo analisar “as condições físicas e químicas do sêmen humano e as propriedades dos espermatozóides, avaliando as condições dele para fertilizar o óvulo feminino. Geralmente ele é feito na tentativa de devolver ao homem a capacidade de procriar e de diagnosticar a natureza de sua incapacidade, quando houver, muitas vezes permitindo tratá-la”.
O problema desse exame reside no modo como ele é feito. Geralmente é realizado em “laboratório e consiste em colher o sêmen num frasco de boca larga, esterilizado, através da masturbação realizada em sala especialmente preparada para este fim”. Trata-se, infelizmente, de uma prática corriqueira, não havendo outras opções que sejam estimuladas pelos laboratórios.
Ora, a masturbação é considerada pelo Magistério da Igreja e pelo “senso moral dos fiéis como um ato intrínseco e gravemente desordenado, [...] qualquer que seja o motivo”, diz o Catecismo (§ 2352). Desse modo, não pode ser praticada, mesmo em casos de exame.
Quando a masturbação é utilizada para a colheita de esperma visando uma fertilização artificial, também não pode ser aceita como lícita. Isso não quer dizer que a Igreja não se compadeça do sofrimento de seus filhos estéreis. Pelo contrário, o mesmo Catecismo, em seu § 2375, diz claramente que “as pesquisas que visam diminuir a esterilidade humana devem ser estimuladas, sob a condição de serem postas a serviço da pessoa humana, de seus direitos inalienáveis, de seu bem verdadeiro e integral, de acordo com o projeto e a vontade de Deus”.
A Congregação para a Doutrina da Fé, por meio da Instrução sobre o respeito à vida humana nascente e a dignidade da procriação, publicada em 22 de fevereiro de 1987 e assinada pelo então Cardeal Joseph Ratzinger, fala explicitamente sobre as técnicas de fertilidade artificial e sobre o que pode ou não ser aplicado:
As técnicas que provocam uma dissociação do parentesco, pela intervenção de uma pessoa estranha ao casal (doação de esperma ou de óvulo, empréstimo de útero), são gravemente desonestas. Estas técnicas (inseminação e fecundação artificiais heterólogas) lesam o direito de a criança nascer de um pai e uma mãe conhecidos dela e ligados entre si pelo casamento. Elas traem o direito exclusivo de se tornar pai e mãe somente um por meio do outro.
Praticadas entre o casal, estas técnicas (inseminação e fecundação artificial homólogas) são talvez menos claras a um juízo imediato, mas continuam moralmente inaceitáveis [...].
Dentre as técnicas condenadas estão a fertilização in vitro e transferência de embriões (FIVET) e a fertilização artificial heteróloga, que são assim descritas na mesma Instrução:
Com a denominação de fecundação ou procriação artificial heteróloga, a Instrução entende aquelas técnicas destinadas a obter artificialmente uma concepção humana, a partir de gametas provenientes de ao menos um doador diverso dos esposos que são unidos em matrimônio. Tais técnicas podem ser de dois tipos:
a) FIVET heterólogo: a técnica destinada a obter uma concepção humana através do encontro in vitro de gametas retirados de ao menos um doador diverso dos dois esposos unidos em matrimônio.
b) Inseminação artificial heteróloga: a técnica destinada a obter uma concepção humana através da transferência para as vias genitais da mulher do esperma previamente recolhido de um doador que não é o marido.
Resta analisar, por fim, o último motivo pelo qual não é possível utilizar a masturbação para doação de esperma: a questão bioética. A instrução Dignitas Personae, de 8 de setembro de 2008, trata exatamente dessas questões. Ela diz, em seu início, que o avanço da medicina trouxe, além dos benefícios, algumas indagações, principalmente a respeito dos “embriões humanos e do uso das células estaminais para fins terapêuticos, bem como noutros âmbitos da medicina experimental”. Esses avanços provocam expectativa na sociedade, principalmente nas pessoas que vivem o drama da infertilidade, mas também suscitam perguntas que precisam de respostas.
Na técnica FIVET, é preciso recordar que desde sempre houve a preocupação com o descarte dos embriões provenientes dela. Inicialmente isso foi atribuído ao fato de a técnica ser ainda rudimentar. Contudo, a Instrução esclarece que a “experiência sucessiva demonstrou, porém, que todas as técnicas de fecundação in vitro procedem, de fato, como se o embrião humano fosse um simples conjunto de células, que são usadas, selecionadas e rejeitadas”.
Um número significativo de mulheres que recorrem à fertilização artificial desejam ardentemente ter uma criança. Contudo, não se pode ignorar que esse desejo tem um preço demasiado alto, pois “a relação entre o número de total de embriões produzidos e os efetivamente nascidos, o número de embriões sacrificados é muito alto”. O pior de tudo é que essas perdas são consideradas pelos especialistas como “o preço a pagar para obter resultados positivos”.
Além disso, não se percebe por parte da comunidade científica um empenho exemplar em encontrar uma saída digna para esse problema, do mesmo modo como há o empenho em solucionar o problema da mãe. Novamente o embrião é visto apenas como um “amontoado de células”. O que não é verdade, pois “a inviolabilidade do direito do ser humano inocente à vida desde o momento da concepção até à morte é um sinal e uma exigência da inviolabilidade mesma da pessoa à qual o Criador concedeu o dom da vida”. Portanto, os muitos embriões não escolhidos são tão dignos quanto aqueles que foram implantados e igualmente dignos de proteção e cuidado. Eles não podem ser simplesmente descartados.
Um outro trecho da referida Instrução que merece destaque, pela sua clareza, é o que trata da seleção genética e da eliminação dos embriões que apresentem algum “defeito”. Vejamos:
Os embriões produzidos in vitro que apresentam defeitos são diretamente eliminados. São cada vez mais frequentes os casos em que casais não estéreis recorrem às técnicas de procriação artificial com o único objetivo de poder realizar uma seleção genética dos seus filhos. É já prática comum, em muitos países, a estimulação do ciclo feminino para obter um elevado número de ovócitos a fecundar. Entre os embriões produzidos, um determinado número é transferido para o seio materno e os restantes são congelados para eventuais futuras intervenções reprodutivas. A finalidade da transferência múltipla é assegurar, por quanto possível, a implantação de pelo menos um embrião. O meio usado para atingir esse fim é a utilização de um número maior de embriões em relação ao filho desejado, assegurando a procriação na previsão de alguns se perderem e, por outro lado, evitando a gravidez múltipla. Assim, a técnica da transferência múltipla comporta, de fato, um tratamento puramente instrumental dos embriões. Impressiona o fato de nem a comum deontologia profissional nem as autoridades sanitárias admitirem, em nenhum outro âmbito da medicina, uma técnica com uma taxa global tão alta de êxitos negativos e fatais. As técnicas de fecundação in vitro são efetivamente aceites porque se pressupõe que o embrião não mereça pleno respeito, pelo fato de entrar em concorrência com um desejo a satisfazer.
Por fim, conforme já foi dito, a Igreja não se fecha ao sofrimento daqueles que não podem gerar filhos, mas explica que como um filho “não é algo devido, mas um dom”, a “esterilidade física não é um mal absoluto”. E o casal que, depois de encerradas todas as possibilidades da medicina, não conceberem, devem se unir à cruz de Cristo e “podem mostrar sua generosidade adotando crianças desamparadas ou prestando relevantes serviços em favor do próximo” (Catecismo, § 2379).
Está bastante claro, pois, que é impossível a masturbação para doação de esperma, pois ela é um ato intrínseca e gravemente desordenado, que não pode ser aceito qualquer que seja o motivo. E também porque ela contribui para a realização de técnicas de reprodução artificial inaceitáveis, que parecem estar “a serviço da vida, e que não raramente são praticadas com essa intenção, mas que, na realidade, abrem a porta para novos atentados contra a vida”.
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