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Quando a ira se torna motivo de queda?

“Todo aquele que se encoleriza com seu irmão será réu em juízo; quem disser ao seu irmão: ‘patife!’ será condenado pelo tribunal; quem chamar o irmão de ‘tolo’ será condenado ao fogo do inferno”.

Texto do episódio
02

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 5,20-26)

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Se a vossa justiça não for maior que a justiça dos mestres da Lei e dos fariseus, vós não entrareis no Reino dos Céus. Vós ouvistes o que foi dito aos antigos: ‘Não matarás! Quem matar será condenado pelo tribunal’. Eu, porém, vos digo: todo aquele que se encoleriza com seu irmão será réu em juízo; quem disser ao seu irmão: ‘patife!’ será condenado pelo tribunal; quem chamar o irmão de ‘tolo’ será condenado ao fogo do inferno. Portanto, quando tu estiveres levando a tua oferta para o altar, e ali te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa a tua oferta ali diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão. Só então vai apresentar a tua oferta. Procura reconciliar-te com teu adversário, enquanto caminha contigo para o tribunal. Senão o adversário te entregará ao juiz, o juiz te entregará ao oficial de justiça, e tu serás jogado na prisão. Em verdade eu te digo: dali não sairás, enquanto não pagares o último centavo”.

No Evangelho de hoje, Jesus nos ensina a conter a ira nos nossos corações: “Ouvistes o que foi dito: ‘Não matarás’. Eu, porém, vos digo: Quem disser a um seu irmão: ‘Tolo, estulto’, esse será passível de juízo”. O que Jesus quer dizer com isso tudo?

Em primeiro lugar, temos de entender que existe em nós como, dom de Deus, uma faculdade de irascibilidade. Nós nos irritamos, e isso é uma coisa que está presente no mundo animal. Ou seja: nós temos desejos; os nossos desejos, porém, podem encontrar algo que os impede, e esse empecilho, então, pode suscitar raiva.

Se você vê que perde a paciência com facilidade, ou que está sempre irritado, pergunte-se qual é o seu desejo. As pessoas dificilmente conseguem enxergar isso, mas é importante ver que, dentro de nós, existe uma espécie de “criança mimada” que diz: “Seja feita a minha vontade, assim na terra como no céu”. 

No entanto, o que desejamos nem sempre é justo e, mesmo que fosse justo, nem sempre é possível alcançar. Então, nós temos de refrear a nossa ira. Por quê? Porque ela está escondendo dentro de nós, na realidade, uma espécie de desordem em que queremos ser como Deus, à medida que exigimos que a nossa vontade se realize.

Mas, além disso, a ira se torna ainda mais grave quando tem como objeto o nosso irmão, ou seja, quando começamos a desejar o mal para o próximo. Essa é a realidade da malevolência, ou seja, quando desejamos o mal do outro. Então, quando consciente e deliberadamente, desejamos o mal para o irmão, estamos cometendo um pecado grave, um pecado mortal; enquanto que, se simplesmente nos irritamos e perdemos a paciência, estamos diante de uma desordem ou, no máximo, um pecado venial, mas não um pecado mortal. Porém, quando desejamos o mal para uma pessoa, estamos cometendo um pecado mortal, e é contra isso que Jesus se opõe.

Em termos práticos, surge-nos a pergunta: Então Jesus está dizendo que, se eu falar um palavrão contra o meu irmão, eu vou para o inferno? São João Crisóstomo afirma que é evidente que não. A intenção de Jesus não é essa, também porque o próprio Jesus usou “xingamentos” para advertir. Jesus disse para os fariseus que eles eram uma “raça de víboras”; ou, para os discípulos de Emaús, Ele disse que eram “tardos de coração”, ou seja, tolos e lentos para crer. São Paulo, por exemplo, chamou os gálatas de “estultos”. Então, quer dizer que São Paulo está na geena? Obviamente, não. Devemos entender que, às vezes, é possível, sim, usar palavras fortes quando são dirigidas ao irmão por caridade, ou seja, para acordá-lo.

Imaginemos um filho sonâmbulo que está caminhando na direção de um abismo. O pai tenta acordá-lo, mas o filho não desperta de jeito nenhum, então ele dá uns tapas na cara do filho. Mas não é por ódio; é por pura caridade, para acordá-lo, para que ele não caia no abismo. Assim também nós podemos usar, às vezes, palavras duras e fortes para acordar as pessoas que estão se perdendo; mas deve ser por caridade, por amor, e não por ódio.

Sofrerá o juízo e será jogado na geena aquele que, cometendo pecado mortal, deseja o mal para o irmão simplesmente pelo mal; mas aquele que deseja, por caridade, que o seu irmão passe por alguma tribulação para que acorde e se converta, este na verdade tem o seu coração configurado a Deus, que é lento para se irar, mas, quando realiza algum ato de ira, o faz por sua infinita misericórdia, porque também a ira é uma forma de Deus nos amar.

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