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O que a Igreja ensina sobre doação de órgãos?

A doação de órgãos, se feita de forma ética e respeitosa, é uma prática nobre, digna de apreço e de ser encorajada. Mas será que todo transplante é, em si mesmo, um sinal de generosidade? Em que circunstâncias a doação de órgãos é moralmente aceitável? O doador precisa estar morto ou pode doar ainda em vida?

Texto do episódio
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Qual é o ensinamento da Igreja a respeito da doação de órgãos? Todos sabemos que a moral católica não se opõe a essa prática. Mas o que é, no fundo, que nos diz a doutrina cristã sobre as diversas circunstâncias capazes de alterar a moralidade da doação de órgãos?

O Catecismo da Igreja Católica ensina, antes de tudo, que a “transplantação de órgãos é conforme à lei moral, se os perigos e riscos físicos e psíquicos, em que o doador incorre, forem proporcionados ao bem que se procura em favor do destinatário” (n. 2296). No mesmo parágrafo, destaca que a doação de órgãos após a morte do doador é um “um ato nobre e meritório”, que pode e deve ser encorajado “como uma manifestação de generosa solidariedade”.

Justamente por ser um ato nobre e meritório, ou seja, decorrente da virtude da caridade, ela precisa ser livre e consciente, pois não há verdadeira doação de si sem plena liberdade, sem completa disposição de si mesmo. Por isso, o Catecismo esclarece ainda que a doação torna-se moralmente inaceitável “se o doador ou os seus representantes não lhe tiverem dado o seu consentimento expresso”.

Também está claro, ademais, que é “moralmente inadmissível provocar diretamente a mutilação que leve à invalidez ou à morte de um ser humano, ainda que isso se faça para retardar a morte de outras pessoas”. Em outras palavras, é imoral assassinar ou abreviar a vida de outrem com o fim de aproveitar-se de seus órgãos em benefício de terceiros, por mais necessitados que estejam de um transplante.

Essas são as linhas gerais do ensinamento da Igreja a esse respeito. Faltam, no entanto, algumas circunstâncias mais específicas que vale a pena levar em consideração.

Em primeiro lugar, é importante lembrar que o transplante de órgãos é um ato de doação, de maneira que o comércio de órgãos ou membros do corpo humano é algo gravemente imoral e indigno. Doar, com efeito, é dar algo de si. Quem doa, não se desfaz de uma “propriedade”, de uma coisa “anexada” ao corpo, mas dispõe de uma parte constitutiva de sua integridade psíquica e orgânica.

Mas até que ponto, então, é lícito doar um órgão ainda em vida, suposto o consentimento do doador? Quanto a isso, é preciso ter em mente que não é moralmente aceitável doar um órgão cuja falta comprometa a integridade funcional do organismo.

Aqui, convém distinguir entre integridade anatômica, de um lado, e funcional, de outro. A primeira se refere à posse de todos os órgãos e partes que convêm ao corpo humano; a segunda, por sua vez, refere-se à capacidade de o organismo manter-se em bom funcionamento, ainda que lhe falte um órgão ou parte dele.

É por isso que o transplante renal, por exemplo, ainda que afete a integridade anatômica do doador vivo, é moralmente lícito, já que o organismo humano é capaz de adaptar-se e funcionar com um único rim. A doação de uma córnea, ao contrário, é inadmissível, já que o doador perderia, assim, a capacidade de enxergar; neste caso, mais do que doação, o que se pratica é mutilação.

O transplante de órgãos por doadores ainda vivos, portanto, implica uma série de restrições éticas que não podem ser desprezadas.

Naturalmente, estas restrições diminuem se o doador já tiver falecido e disposto em testamento o seu desejo de doar os próprios órgãos. Neste caso, é preciso constatar previamente a morte do doador. A doação só pode ser feita se este já houver morrido, pois em circunstância nenhuma é lícito provocar a morte de alguém ou retirar-lhe os órgãos ainda em vida, por mais que a morte natural se julgue iminente.

Uma equipe médica que tomasse alguma dessas condutas estaria transgredindo uma fronteira e arrogando-se o “direito” de decidir quem vive e quem morre. A prática médica, por mais nobre e necessária que seja, tem sempre um limite que não é permitido transpor.

Um último ponto que merece atenção diz respeito ao próprio órgão a ser doado. Mesmo que o doador esteja morto e tenha consentido expressamente, nem todos os seu órgãos podem ser doados. Alguns deles estão vinculados de tal modo à identidade da pessoa que doá-los significaria uma grave ofensa à sua dignidade. Por isso, ainda que os avanços médicos a tornem possível, a doação do cérebro e dos órgãos genitais, por exemplo, seria imoral e ilícita.

“A doação de órgãos feita segundo formas eticamente aceitáveis”, como disse com grande lucidez o Papa S. João Paulo II, “merece particular apreço”, na medida em que permite oferecer “uma possibilidade de saúde e até de vida a doentes por vezes já sem esperança” [1]. Por essas razões, a técnica do transplante de órgãos deve estar a serviço da vida humana, respeitando a integridade e a dignidade tanto do doador como do donatário [2], cujos corpos estão nas mãos bondosas do único que é Senhor da vida e da morte.

Referências

  1. João Paulo II, Encíclica “Evangelium vitæ”, de 25 mar. 1995, n. 86 (AAS 87 [1995] 498).
  2. Cf. Id., Discurso aos participantes do 18.° Congresso Internacional sobre Transplantes, de 29 ago. 2000, n. 1 (AAS 92 [2000] 822).

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