O culto à Virgem Santíssima, que vimos analisando nos últimos encontros, é regido por dois princípios teológicos fundamentais que precisamos agora explicar. Trata-se, como ficará claro ao longo das próximas aulas, das duas colunas mestras que sustentam toda genuína devoção. O primeiro deles é o princípio dito cristocêntrico; é Jesus Cristo, noutras palavras, o fim último da verdadeira devoção mariana. O segundo, cuja explicação detalhada deixaremos para mais tarde, diz respeito à veneração e imitação das virtudes de nossa Mãe Santíssima.
Ouçamos o que São Luís Maria nos diz a propósito do primeiro princípio:
Jesus Cristo, nosso Salvador, verdadeiro e verdadeiro homem, deve ser o fim último de todas as nossas devoções; de outro modo, elas serão falsas e enganosas. Jesus Cristo é o alfa e ômega, o princípio e o fim de todas as coisas [1].
Nosso Senhor, portanto, é o eixo fundamental e a razão última da devoção à Virgem Maria, de sorte que não nos aproximamos da Mãe senão com a intenção de, conduzidos por suas mãos maternas, nos aproximarmos do Filho. Queremos amar mais a Cristo, sentido e finalidade de nossa existência, e por isso recorremos a Maria; tributamos a ela honra e carinho, porque temos certeza de que todos os obséquios que lhe são prestados não têm “outro fim que honrar mais perfeitamente a Jesus Cristo”, e de que só vamos a ela “como ao caminho para atingir o termo, que é Jesus Cristo” [2].
Maria é o meio que o Senhor pôs à nossa disposição para que, com rapidez e facilidade, com mais suavidade e alegria, percorramos o caminho da santidade e cheguemos às pressas, por assim dizer, à plena configuração com ele, do qual somos membros. Maria é a via, aberta aos fiéis pelo livre desígnio de Deus, que não quis vir ao mundo a não ser por intermédio desta Virgem puríssima. Ora, se Deus quis servir-se dela e associá-la tão intimamente à obra da Encarnação e Redenção, seria temerário, e até mesmo insensato de nossa parte, presumir que não temos necessidade dos meios de que o próprio Cristo, se assim se pode dizer, quis necessitar.
É por esse motivo que os teólogos dizem que a devoção a Maria é necessária para salvar-se, não por uma necessidade chamada absoluta, à qual não existe nenhuma exceção (tal é, por exemplo, a necessidade da graça), mas por uma necessidade hipotética, que depende de alguma condição — neste caso, a livre disposição de Deus de não começar e acabar suas obras senão por meio de Maria. Ela, com efeito, foi escolhida desde toda a eternidade para ser o ventre puríssimo em que seria gerado o Homem-Deus e preparada, com uma plenitude de graças e dons, para dar à luz no Calvário, em meios a lágrimas corredentoras, a outros tantos filhos na ordem da graça, membros da Cabeça daquela Igreja de que ela é Mãe e protótipo.
Por ser “imutável em sua conduta e em seus sentimentos”, é de crer que Deus, tendo dito a todos nós na pessoa de São João, de forma eficaz e constitutiva: “Eis aí a tua mãe” (Jo 19, 26), não mudará seu pensamento e desejará sempre que seja Maria, Mãe espiritual dos que crêem, quem gere os membros que faltam ao Corpo de Cristo.