Um aspecto pouco conhecido deste gigante do pensamento que foi Santo Tomás de Aquino é a sua profunda espiritualidade, que palpita, silenciosa e contemplativa, por sob as linhas à primeira vista secas e desapaixonadas de obras como uma Suma Teológica ou um Comentário às Sentenças. Intelectual de primeira linha, espírito disposto como que por natureza às disciplinas filosóficas [1], Tomás de Aquino adquiriu, de uns anos para cá, a fama de ser demasiado "cerebral", "calculista": entremeada por uma lógica quase matemática, a sua Teologia seria, sim, expressão iniludível de um gênio como nenhum outro; ali, porém, sentir-se-ia falta do ardor entusiasmante com que Agostinho e os demais Padres empenhavam todo o coração ao tratarem das coisas divinas. Dos seus escritos monumentais, diz-se vez por outra, pouco ou nada se pode extrair que alimente a alma nos momentos de oração.
Esse preconceito, produto de causas que aqui não convém destrinchar, é, de certo modo, compreensível se levarmos em conta que, à vista de uma alma como a dele — na qual os contrários se harmonizam "numa unidade tão paradoxal que desencoraja toda a análise" [2] —, a nossa pequenez se vê ofuscada por uma...