Com este programa, é lançado o novo curso de “Terapia das Doenças Espirituais” [1]. As “doenças espirituais” não são nada mais que os sete pecados capitais, as tendências para o pecado alojadas no composto humano, corpo e alma.
Antes de explorar o mundo dos pecados capitais, porém, é importante compreender a antropologia de Santo Tomás de Aquino. Ele explica, por exemplo, que a alma humana “está (…) na fronteira das criaturas espirituais e corporais, por isso, nela se reúnem as potências tanto de umas e outras criaturas” [2]. Essas potências, que se dividem em cognoscitivas e apetitivas, estão ligadas, respectivamente, ao conhecer e ao desejar. No que diz respeito ao composto corpo e alma, isto é, às faculdades que o homem tem em comum com os demais animais, as potências cognoscitivas são os sentidos internos e externos; e as apetitivas, o concupiscível, ligado ao sustento do corpo, e o irascível, “cujo objeto é ‘aquilo que é árduo’” [3]. No que diz respeito simplesmente à alma, isto é, às faculdades que o homem tem em comum com os seres angélicos, a potência relacionada ao conhecer, chamada de intelectiva, é a inteligência; a apetitiva, por sua vez, é a vontade.
Os pecados capitais encontram-se na área dos apetites sensíveis, ou seja, no concupiscível e no irascível. Ali estão as paixões, popularmente designadas como “sentimentos”. Os anjos não possuem paixões. Afinal, essa realidade está relacionada ao corpo, ao sensível. Para pôr em ordem essa região, é preciso recorrer às potências intelectivas, que são a inteligência e a vontade. Nessa luta, no entanto, não se pode “brincar de anjo”, como se o homem fosse “uma alma aprisionada em um corpo”, ao invés de uma unidade de corpo e alma. É importante que a alma submeta o composto corpo e alma como um cavaleiro que doma o seu cavalo, ou seja, não de forma agressiva e despótica, mas de modo equilibrado e “político”:
“Como diz o Filósofo no livro I da República: ‘É preciso considerar no animal, um poder despótico e um poder político: a alma domina o corpo por um poder despótico, o intelecto domina o apetite por um poder político e régio’. O poder despótico é aquele pelo qual alguém comanda os escravos, que não têm a capacidade de resistir à ordem do chefe, pois nada têm de próprio. O poder político e régio, por sua vez, é aquele pelo qual se comanda a homens livres que, embora submetidos à autoridade do chefe, têm entretanto algo próprio que lhes permite resistir às suas ordens. - Da mesma forma se diz que a alma domina o corpo com um poder despótico, pois os membros do corpo não podem de nenhuma forma resistir às suas ordens, mas imediatamente se movem ao desejo da alma, a mão, o pé, e todo e qualquer membro que pode receber naturalmente um impulso da vontade. Mas se diz que o intelecto, ou a razão, comanda o irascível e o concupiscível com um poder político, porque o apetite sensível tem algo próprio que lhe permite resistir à ordem da razão.” [4]
O Catecismo da Igreja Católica ensina que, “em si mesmas, as paixões não são nem boas nem más”, e “só recebem qualificação moral na medida em que dependem efetivamente da razão e da vontade” [5]. Na expressão de Santo Agostinho, “as paixões são más se o amor for mau, e boas se ele for bom” [6]. A tristeza, por exemplo, pode terminar em depressão, mas também pode ser um caminho para o arrependimento dos pecados. A ira pode ser usada contra o próximo, mas também pode direcionar-se ao demônio, ao mal e ao pecado. O Papa Bento XVI, na encíclica Deus caritas est, explica como mesmo o amor descendente não pode excluir por completo o amor eros:
“Na realidade, eros e agape — amor ascendente e amor descendente — nunca se deixam separar completamente um do outro. Quanto mais os dois encontrarem a justa unidade, embora em distintas dimensões, na única realidade do amor, tanto mais se realiza a verdadeira natureza do amor em geral. Embora o eros seja inicialmente sobretudo ambicioso, ascendente — fascinação pela grande promessa de felicidade — depois, à medida que se aproxima do outro, far-se-á cada vez menos perguntas sobre si próprio, procurará sempre mais a felicidade do outro, preocupar-se-á cada vez mais dele, doar-se-á e desejará ‘existir para’ o outro. Assim se insere nele o momento da agape; caso contrário, o eros decai e perde mesmo a sua própria natureza. Por outro lado, o homem também não pode viver exclusivamente no amor oblativo, descendente. Não pode limitar-se sempre a dar, deve também receber. Quem quer dar amor, deve ele mesmo recebê-lo em dom.” [7]
Então, não só é possível como é preciso conduzir as paixões de modo a progredir no amor de Deus [8].
Tudo isso foi dito para mostrar que a religião cristã - ao contrário da propaganda que fazem os freudianos e os adeptos de outras linhas da psicologia - não despreza o corpo humano. A doutrina católica defende que a alma domine o corpo, mas isso não é dicotômico, não se tratam de dois mundos totalmente separados. O conhecimento racional, por exemplo, vem daquilo que se aprende pelos sentidos, assim como os atos da vontade nascem da purificação dos “sentimentos”.
Aquilo a que a Igreja resiste, de fato, é à onda comum de liberalismo que enxerga o homem como um simples animal. Fá-lo convencida de que essa ideia não só está errada, como realmente destrói o ser humano.
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